Com 20 anos, João Afonso tornou-se campeão mundial de futebol virtual
Joga no Luna Galaxy, do jogador Diogo Jota, e ainda tem tempo para fazer a licenciatura em Economia. Diz que “a melhor parte de ser campeão do mundo pela primeira vez é poder sê-lo duas vezes”.
João Afonso Vasconcelos (ou JAfonso, como é conhecido no mundo do Esports) começou a jogar futebol na PlayStation aos 4 anos por influência do primo. Durante a adolescência, jogava apenas por diversão e aos fins-de-semana ou depois das aulas, se os pais autorizassem, ainda que “nunca durante mais de duas horas”, recorda em entrevista ao P3. “Os meus pais sempre foram muito estritos com isso. Só aos 13 anos é que tive a minha primeira PlayStation. Até lá, usava a do meu primo”, acrescenta.
Com tantas regras, não é de admirar que jogar futebol com a bola nos pés lhe ocupasse muito mais tempo do que no mundo virtual. E isso só mudou quando descobriu que podia fazer carreira como jogador de Esports — dedicando-se ao jogo de simulação de futebol que, desde 2023, é conhecido como EA Sports FC (antes disso, chamavam-se FIFA). Aos 16 anos, o jovem natural da Madeira começou no clube de futebol virtual do Boavista. Aos 17, assinou o primeiro contrato profissional com o Luna Galaxy, do jogador do Liverpool Diogo Jota, e estreou-se na selecção nacional portuguesa de Esports.
Mas não é só isso que faz. João concilia tudo isto com o curso de Economia, que está a tirar no Iscte, em Lisboa. Em Setembro começa o 3.º e último ano da licenciatura.
“Tem sido difícil conciliar as duas coisas, mas até acho que tenho feito bom trabalho. No 2.º ano viajei muito para estar presente nas competições de Esports dos EUA, Reino Unido e Suécia e não consegui estar presente na maioria das aulas e até em alguns exames. Mesmo assim, deixei só duas cadeiras por terminar.”
Nas competições de futebol virtual arrecadou vários títulos — uma taça de Portugal, troféus de campeão e vice-campeão nacional e de campeão internacional na liga de Esports norte-americana. Mas foi há umas semanas que venceu o título que, provavelmente, qualquer jogador de futebol virtual ambiciona ter: o de campeão mundial da modalidade.
“Não estava à espera de ganhar, mas trabalhei muito para isso. Sempre disse que queria ser o melhor jogador do mundo e para conseguir isso teria de ser campeão do mundo. Era um sonho e, acima de tudo, um objectivo que tinha. Digo sempre que a melhor parte de ser campeão do mundo pela primeira vez é poder sê-lo duas vezes, por isso, quero ganhar outra vez”, revela o jogador de 20 anos.
A competição decorreu na Arábia Saudita, com centenas de jogadores de futebol virtual do mundo. João chegou à final da Esports World Cup, onde derrotou o brasileiro Young por 6-2. Além da taça, recebeu 270 mil euros.
PlayStation seis horas por dia, ginásio e dieta de futebolista
Se achas que jogar futebol virtual é só estar com um comando da PlayStation na mão, desengana-te. Quando se aproximam as datas das competições, João joga entre cinco e seis horas por dia, sempre acompanhado pelo treinador Armando Vale, que aponta o que é preciso melhorar.
“Nas alturas em que não tenho competições, treino entre uma e três horas por dia, mas não tenho horário fixo para isso. Vou ajustando consoante a minha disponibilidade...”, afirma.
Além disto, é importante analisar jogos de futebol e conhecer as características de cada jogador (por exemplo, saber quem tem o melhor pé esquerdo ou o melhor passe longo). Seguir uma dieta tão saudável como um jogador de futebol também é recomendável, assim como idas regulares ao ginásio — se bem que, entre viagens e estudos, João admite que este ano ainda não pôs lá os pés.
Nas competições, as horas de jogo são intermináveis e quando são presenciais as arenas enchem-se de público. Segundo João, os jogadores tanto podem jogar uma hora como oito horas e, muitas vezes, sem grande tempo para fazerem uma pausa. Começam por ser cerca de 500 profissionais. Ao longo dos dias de competição, vão sendo eliminados. Para a final sobram apenas dois.
“Em Outubro do ano passado qualifiquei-me para um torneio em Londres em que começava a jogar às 11h e acabava às 18 ou 19h da noite, se não fosse eliminado. Era literalmente jogar de manhã à noite. Neste caso tive pausas, mas já me aconteceu não ter.”
E como se sustenta? Os jogadores desta modalidade recebem prémios quando se qualificam e se vencerem — e estes podem chegar aos milhões de euros. Além disso, quem faz parte de uma equipa também recebe um salário.
Contudo, em Portugal, ainda há uma falha no mundo dos desportos electrónicos: não são regulamentados. O PS avançou com a proposta em Julho com o objectivo de a aplicar dentro de um ano e João concorda com ela, uma vez que, diz, seria positiva não só para os jogadores como para a sustentabilidade e reconhecimento das modalidades do Esports.
Próximos passos? João só sabe que o próximo torneio será internacional e em Novembro. Mas desabafa: “Gosto muito daquilo que faço, mas confesso que de vez em quando sinto saudades de quando era miúdo e só jogava por diversão...”