Ministros de Espanha e Argentina dão primeiro passo para reatar relações diplomáticas
Três meses depois de a embaixadora argentina ter sido expulsa de Madrid por causa das declarações do Presidente Milei, os chefes da diplomacia dos dois países tiveram uma “cordial” conversa telefónica
Os ministros dos Negócios Estrangeiros de Espanha e Argentina retomaram os canais diplomáticos, três meses depois da crise diplomática desencadeada pelos insultos de Javier Milei à mulher do primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez. Por iniciativa do Governo de Milei, Diana Mondino e José Manuel Albares tiveram uma conversa em “tom cordial” na semana passada, noticia o El País nesta terça-feira.
Fontes familiarizadas citadas pelo diário espanhol indicaram que os dois ministros abordaram o conflito no Médio Oriente, entre outros assuntos, e irão estar juntos no final de Setembro em Nova Iorque, num pequeno-almoço destinado aos chefes da diplomacia dos países ibero-americanos, à margem da Assembleia Geral da ONU, embora ainda não se saiba se terão uma reunião bilateral.
A conversa da semana passada ocorreu num contexto em que as diplomacias dos dois países têm tomado posições convergentes em diferentes assuntos, desde logo sobre a crise pós-eleitoral na Venezuela, em que ambos assinaram a declaração subscrita por 20 países contra a repressão exigindo a divulgação das actas, noticiada na sexta-feira. E todos os ministros das relações externas dos países ibero-americanos, incluindo a Argentina, aprovaram a realização em Espanha da cimeira de 2026.
A reabertura do canal diplomático pode ser um primeiro passo, mas ainda não representa a normalização das relações entre os dois países, depois de o Governo de Pedro Sánchez ter mandado de volta a Buenos Aires a embaixadora daquele país sul-americano e ter retirado a sua da capital argentina. Esta atitude, considerada das mais graves em diplomacia, aconteceu depois de o Presidente Javier Milei ter chamado “corrupta” à mulher do primeiro-ministro espanhol, em Maio passado, durante um evento da direita radical em Madrid.
“Não sabem que tipo de sociedade e de país o socialismo pode produzir, que tipo de pessoas se metem no poder e que níveis de abuso pode gerar. Mesmo que ele tenha uma mulher corrupta, se suje e demore cinco dias a pensar nisso”, disse Javier Milei, durante o encontro político organizado pelo Vox em vésperas das eleições europeias, aludindo claramente, mesmo sem citar nomes, ao período de reflexão que Pedro Sánchez levou no final de Abril para decidir se continuava no cargo, depois de um juiz ter aberto um processo de queixa contra a sua mulher, Begoña Gómez.
Pedro Sánchez exigiu, na altura, um pedido de desculpas, que nunca chegou. Pelo contrário, o porta-voz da presidência da Argentina, Manuel Adorni, exigiu que fosse o Governo de Espanha a pedir "sinceras desculpas" a Javier Milei. “Trataram-no como um vilão, um negacionista, um ‘consumidor de substâncias’, um autoritário, um antidemocrático e uma pessoa ‘muito má’. Espero que em algum momento reflictam e peçam desculpas sinceramente", disse Adorni na rede social X.
Um mês depois, pouco antes de voltar a Madrid para receber uma condecoração da presidente da Comunidade Autónoma de Madrid, Isabel Ayuso, Milei voltou ao ataque a Sánchez: “O cobarde mandou todos os seus ministros para me insultar”, disse em entrevista ao canal argentino Tele Noticias. E na capital espanhola voltou ao ataque, embora de uma forma mais velada, mas nem por isso menos violenta. Criticando o Estado espanhol pela recolha de impostos, “pagos sob ameaça de pistola”, o chefe de Estado argentino disse que os fundos públicos se costumam perder “nas mãos porosas dos políticos, talvez não nas do político directamente, talvez nas da companheira ou do irmão”. “Quem o queira entender que entenda”, acrescentou.
Segundo o El País, um dos obstáculos à normalização total das relações entre os dois países é o carácter imprevisível do Presidente argentino. Mas as relações históricas, comerciais e de povos obrigam a um desanuviar das relações, apesar das diferenças ideológicas dos respectivos governos.