Para associações de imigrantes, greve da AIMA pode levar a “situação caótica”

Paralisação dos servidores da AIMA está marcada para começar em 22 de agosto e se entender até 31 de dezembro. Eles querem fim das horas extras e do trabalho aos fins de semana. Clima é de apreensão.

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Associações que atuam em defesa de imigrantes, sobretudo, brasileiros, temem que a greve da AIMA faça o que está ruim ficar pior Jair Rattner
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Associações que atuam no auxílio a imigrantes em Portugal alertam que a greve marcada pelos funcionários da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) contra as horas extras e o trabalho nos fins de semana vai comprometer o andamento dos mais de 400 mil processos em atraso. A paralisação está marcada para começar em 22 de agosto e se estender até 31 de dezembro. Os brasileiros serão os principais prejudicados, pois são maioria entre aqueles que esperam pela AIMA.

Como informou o PÚBLICO Brasil, o Governo ainda não chamou os representantes dos sindicatos que representam a categoria para conversar. Esperava-se que, com o pacote de 41 medidas anunciadas pelo primeiro-ministro Luís Montenegro, em junho último, várias delas para agilizar as operações da AIMA, a situação para aqueles que dependem da agência fosse melhorar. Mas, segundo as associações, nada mudou.

Para Ana Paula Costa, vice-presidente da Casa do Brasil de Lisboa, uma das mais antigas instituições de apoio a brasileiros em Portugal, a expectativa é de que, “o que está ruim fique pior”, se a greve não for resolvida a tempo. “Há muitos pedidos de regularização de imigrantes em atraso, e muitas pessoas não conseguem sequer agendar atendimento junto à AIMA. Isso, antes mesmo da paralisação. A situação ficará caótica”, afirma.

A mesma preocupação é compartilhada por Elisângela Rocha, do Coletivo Andorinha e da Associação Diásporas. “A greve só vai piorar uma situação que está muito difícil. As pessoas que estão à espera da AIMA só querem regularizar a situação delas em Portugal, nada mais”, diz. Diante das dificuldades, os imigrantes se sentem inseguros, sobretudo, num momento crescente do movimento anti-imigração.

Pedidos de ajuda

Na avaliação de Alexandra Gomide, presidente da Associação UAI – União, Apoio e Integração da Comunidade Luso-Brasileira, de Braga, independentemente de a greve dos funcionários da AIMA ser apenas contra as horas extra e o expediente nos fins de semana, o trabalho do dia a dia da agência ficará muito prejudicado. “Para quem já tem atendimento agendado, espera-se que tudo transcorra normalmente. Mas será difícil para quem ainda precisa agendar. O receio é de que possam fechar os novos agendamentos e só abrir quando acabar a greve”, ressalta.

Alexandra acredita o Governo fará alguma coisa para evitar a greve. “Creio que não há interesse da administração pública em deixar a situação piorar. Alguma solução terá de vir”, assinala. Ela conta que apenas o anúncio da paralisação vai fazer com que muitos brasileiros acabem não indo à AIMA, mesmo tendo atendimento agendado. “É importante deixar claro que a greve não atinge os agendamentos marcados, mas tem gente achando que não precisa ir por causa da greve.”

Apesar da preocupação e de achar que os imigrantes brasileiros serão prejudicados com a possível greve dos servidores da AIMA, Ana Paula, da Casa do Brasil, não contesta o direito dos trabalhadores da cobrarem seus direitos por meio de uma paralisação: “É complicado, porque, enquanto associação, nós sempre defendemos o direito de greve. Eles estão no seu direito”, frisa.

Defesa da agência

As associações defendem as mudanças que resultaram na criação da AIMA, após a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). “Nós defendemos a existência da AIMA. A ideia é excelente. O SEF tinha uma função policial. A agência tem uma proposta mais humanizada, de imigração, asilo e integração. Mas todos os canais que tínhamos com o SEF entraram em colapso. Não sabemos como vai ser, não temos tido respostas por parte do Governo para nossas dúvidas”, diz Elisângela.

A integrante do Coletivo Andorinhas e Associação Diásporas considera, no entanto, que as propostas governamentais significarão um passo para trás. “A última alteração, dentro dos 41 pontos que o Governo apresentou, nos preocupa. Prevê a criação do papel policial dentro da AIMA”, afirma.

Ana Paula concorda com a mudança, mas critica a forma como foi realizada: “A passagem do SEF para AIMA mudou o nome, mudou o paradigma de política migratória e separou o administrativo do policial, mas não resolveu os problemas. Não houve investimento nas três áreas em que era necessário: a contratação de funcionários, a atualização do sistema de informática e a mudança de processos burocráticos”, ressalta.

Na Justiça

Alexandra, da Associação UAI – União, Apoio e Integração da Comunidade Luso-Brasileira, reforça a inoperância da AIMA. “Os advogados só conseguem agendar o atendimento por meio de ações em tribunal contra a AIMA”, enfatiza. Ela conta que a situação da agência tem ocupado grande parte do setor jurídico da sua instituição. “Nos últimos três meses, o setor jurídico tem feito 60 atendimentos mensais, e 90% deles são de pessoas que nos procuram por causa de questões da AIMA”, diz.

Elisângela indica que a judicialização acaba por favorecer quem tem mais dinheiro. “Quem tem dinheiro, consegue pagar advogado para conseguir atendimento na AIMA. Quem não tem, não consegue”, alerta. As representantes das associações ouvidas pelo PÚBLICO Brasil não veem espaço para solução dos problemas da AIMA tão cedo.

“Estamos na expectativa de que o Governo invista na parte tecnológica. Se não liberar o online e ficar só no atendimento presencial, paralisa tudo”, avalia Alexandra.

Para Ana Paula, a melhora da infraestrutura tecnológica é só um passo. “Para já, é importante que essa estrutura de missão realize o seu trabalho e resolva os processos em atraso. Depois, é preciso investir em recursos humanos, desburocratizar os processos, criar condições para que os consulados possam atender os pedidos de quem pretende vir para Portugal”, lista.

Segundo Elisângela, não há lógica nas dificuldades enfrentadas por quem quer resolver seus problemas com a AIMA. “Para mim, não faz sentido que haja tanta dificuldade para a regularização de quem chega, até porque Portugal precisa de imigrantes”, conclui.

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