Enquanto não há mais Wednesday, há O Homicídio Perfeito: Um Guia Para Boas Raparigas

Uma adolescente detective e a sua actriz, Emma Myers, estão a trepar nas audiências. Quem pôs esta série nas mais vistas da Netflix?

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Emma Myers como Pip Fitz-Amobi em O Homicídio Perfeito: Um Guia Para Boas Raparigas DR
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Há várias perguntas sobre o que anda a geração Z a ver nos seus ecrãs, e normalmente a resposta é uma mixórdia de sílabas como TikTok e Roblox ou o bom e velho YouTube. Parece haver muitas certezas sobre o que a geração Z não anda a ver: televisão linear, canais generalistas, coisas muito longas. O que nos leva à pergunta “Então quem é que pôs O Homicídio Perfeito: Um Guia Para Boas Raparigas nos mais vistos da Netflix”? A resposta pode muito bem ser a mesma que foi dada para Wednesday: a geração Z, mas também a Y, a X e até os baby boomers. Porque muita gente gosta de histórias de adolescentes com um twist.

O Homicídio Perfeito: Um Guia Para Boas Raparigas estreou-se no início de Agosto e saltou rapidamente para a lista das séries mais populares. Já foi destronada pelo final de Umbrella Academy, mas continua lá, a ser descoberta pelos espectadores, e a dar vida ao romance para jovens adultos homónimo, escrito por Holly Jackson. O título explica parte do tema, que é um homicídio, e o protagonismo de uma “boa rapariga”, que basicamente decide investigá-lo.

Antes de chegarmos aos meandros do enredo (sem estragar nada) ou de falar da genealogia destas histórias, há que continuar a fazer a ponte com Wednesday. Ambas as séries são Netflix, ambas partem de obras de ficção pré-existentes e têm a chamada “base de fãs” acoplada. É claro que o factor Família Addams contribuiu bastante para a amplitude do espectro de espectadores de Wednesday, bem como o horror light e o magnetismo de Jenna Ortega. Aqui a coisa fia mais fino, mas faça-se a última ligação.

A protagonista da série, a simpática, ligeiramente pespineta e bem construída Pippa Fitz-Amobi, é interpretada por Emma Myers. Que os espectadores podem reconhecer como a companheira de quarto de Wednesday e que no ano de intervalo entre a produção e a estreia da segunda temporada da série de fantasia entreteve o público com um produto para o streaming igualmente dado a renovação para mais temporadas (há vários livros de Holly Jackson na prateleira).

Avançando então para a história, adaptada por Poppy Coogan e realizada por Dolly Wells: trata-se de uma clássica aventura passada numa cidadezinha bucólica em Inglaterra onde uma rapariga bonita morreu há uns anos, tendo o seu namorado sido considerado culpado pelo crime. O que pode explicar a adesão da geração Z e quejandas é a acessibilidade das personagens centrais. Já o que pode explicar que críticos veteranos como Robert Lloyd, do Los Angeles Times, tenham gostado tanto da série é que há nela e no cenário onde decorre qualquer coisa de Miss Marple. De Jessica Fletcher. De Veronica Mars. De Nancy Drew. De Os Cinco, da saga Uma Aventura ou dos livros Patrícia que uma ou duas gerações de miúdos portugueses tanto leram.

O Homicídio Perfeito: Um Guia Para Boas Raparigas estende-se por seis episódios de cerca de 40 minutos que, pode argumentar-se, podiam ser mais. Porque se a economia é salutar nestes tempos de espaço ilimitado e tempo limitado, ficam aqui muitas pontas soltas. Não tanto no mistério, mas na forma como ele é tecido e sobretudo na maneira como certas personagens e suas histórias ficam penduradas ou mesmo só habitam as franjas deste mistério. Mas que ele é viciante, é, e Emma Myers, Zain Iqbal e Asha Banks fazem muito por isso.

A banda sonora é recente, a beleza da protagonista é incontornável e surge comentada em qualquer texto que se leia sobre a série (os olhos são descritos como pratos, a boca comparada à de uma estrela de cinema). O crítico Alan Sepinwall (como muitas vezes é o caso) diz a coisa certeira na Rolling Stone: “Não reinventa a roda, nem é a melhor versão possível do género, mas o resultado é melhor do que se pensaria.”

Raparigas protagonistas, imperfeitas apesar de pseudo-boazinhas, raparigas atrás das câmaras, raparigas ao computador a adaptar um livro ou a escrevê-lo. Não reinventa a roda, mas de cada vez que acontece com alguma felicidade parte-a mais um bocadinho.

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