Venezuela: relatório da ONU critica falta de “transparência e integridade” das eleições

Painel de peritos eleitorais das Nações Unidas afirma que não foram seguidas as regras na publicação dos resultados e que a falta de divulgação das actas não tem precedentes.

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O Conselho Nacional Eleitoral declarou a reeleição de Maduro como Presidente da Venezuela sem qualquer prova Leonardo Fernandez Viloria / REUTERS
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O painel de peritos eleitorais das Nações Unidas divulgou um relatório preliminar da sua visita à Venezuela em que afirma que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) do país não cumpriu as “regras básicas” quando anunciou a vitória de Nicolás Maduro nas eleições de 28 de Julho e que a falta da divulgação das actas com os resultados detalhados “não tem precedentes nas eleições democráticas contemporâneas”.

“O Conselho Nacional Eleitoral ainda não publicou, e ainda não divulgou nenhuma acta [ou resultado detalhado por urna] que sustentem os seus anúncios orais, conforme previsto na lei eleitoral”, afirma-se no relatório, que conclui por isso que “o processo de gestão dos resultados do CNE ficou aquém das medidas básicas de transparência e integridade que são essenciais para a realização de eleições credíveis”.

O grupo de quatro especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU) presidida por António Guterres esteve no país poucas semanas antes das eleições, numa missão de observação que tinha como objectivo principal sugerir correcções futuras do processo eleitoral. No entanto, a forma como decorreu este processo não lhes permitiu ficarem indiferentes e acabaram por publicar um relatório que estava previsto ser confidencial.

“O processo de gestão de resultados por parte da CNE não cumpriu as medidas básicas de transparência e integridade que são essenciais para a realização de eleições credíveis. Também não seguiu as disposições legais e regulamentares nacionais e todos os prazos estabelecidos não foram respeitados”, escrevem os peritos.

Segundo a sua experiência, acrescentam, o anúncio dos resultados de eleições sem a publicação detalhada de resultados “não tem precedentes nas eleições democráticas contemporâneas” e teve “um impacto negativo na confiança no resultado anunciado pela CNE entre grande parte do eleitorado venezuelano”.

Em resposta a este relatório, o presidente da Assembleia Nacional, Jorge Rodríguez, chamou “lixo” ao painel da ONU e propôs uma reforma nas leis eleitorais do país que impeçam a presença de observadores internacionais em próximos actos eleitorais. “Porque eles têm de vir? Com que direito? Que tipo de capacidade eles têm?”, questionou. “Eu proponho que nós façamos uma reforma das leis eleitorais da Venezuela para que nunca mais um estrangeiro venha a tomar posição sobre nada que tenha que ver com as eleições da Venezuela”, afirmou.

As actas de uns e o silêncio de outros

No relatório, os peritos salientam que o CNE não publicou as actas, que consideram “provas fundamentais em papel”, que possuem “vários elementos de segurança como códigos QR e códigos de verificação com assinaturas únicas”, bem como assinaturas físicas de funcionários e agentes”, o que as torna “muito difíceis de falsificar”.

A ausência dessa publicação levou mesmo o Tribunal Supremo do país a fazer um ultimato ao CNE, exigindo em três dias a apresentação das “folhas de apuramento das mesas de voto a nível nacional; a folha de apuramento final do processo; bem como a folha de adjudicação e a folha de proclamação do processo indicado”. O CNE entregou os documentos no final do prazo, mas continuou sem os publicar, estando neste momento em apreciação pelo tribunal, também ele ligado ao regime de Maduro, tal como a autoridade eleitoral.

A juíza que preside à câmara eleitoral do tribunal convocou todos os candidatos para apresentação de provas, mas o principal adversário de Maduro, Edmundo González, não compareceu em tribunal, receando ser detido, uma vez que se encontra sob investigação criminal.

As actas eleitorais tornaram-se o cerne do conflito pós-eleitoral na Venezuela. Com uma extensa rede de testemunhas nas mais de 30 mil mesas de voto pelo país, a oposição conseguiu recolher 83% das actas electrónicas geradas durante a votação, que é ao mesmo tempo electrónica e em papel, e publicou-as numa base de dados acessível universalmente na Internet.

Os especialistas eleitorais da ONU acederam a essas actas e escrevem no relatório ter analisado “uma pequena amostra” e concluído que “todos os documentos verificados exibem todos os recursos de segurança dos protocolos de resultados originais”.

Sobre o suposto ataque informático de que o Governo se queixou e que terá impedido a transmissão electrónica de resultados o painel salienta que o sistema digital funcionou bem inicialmente, “mas parou abruptamente nas horas seguintes ao encerramento das assembleias de voto, sem que tenha sida fornecida qualquer informação ou explicação aos candidatos ou aos membros das mesas”.

Depois da divulgação, pelo CNE, da suposta reeleição de Nicolás Maduro, a Venezuela assistiu a uma onda de protestos populares em que morreram 25 pessoas e que foi seguida de um contra-ataque das autoridades que se traduziu em mais de 2400 detenções sem mandados de captura, nem direito a defesa privada.

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