Fernando Pimenta, uma lenda que teve um dia mau

O canoísta português partiu bem na final de K1 1000 dos Jogos Olímpicos de Paris, e liderava a meio da prova, mas acabou por terminar longe das medalhas.

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HUGO DELGADO / LUSA
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Fernando Pimenta já ganhou quase tudo na canoagem. Várias vezes. O “quase” do mais titulado atleta da história do desporto português chamava-se Jogos Olímpicos, para ele sempre uma experiência de sentimentos contraditórios. Como podia ele sentir-se o melhor se nunca tinha sido o melhor num palco olímpico? À quarta tentativa, o homem de Ponte de Lima não foi o melhor, nem ficou lá perto. Pimenta, um dos duplos medalhados olímpicos de Portugal, foi apenas sexto, depois de uma corrida em que parecia determinado a ser primeiro. Se uma medalha de bronze já seria uma consolação, para ele um diploma é igual a nada.

Na última manhã da canoagem no estádio náutico de Varnes-sur-Maire, Pimenta atravessou a formalidade das meias-finais sem esforço para se colocar entre os oito caiaques que iriam lutar pelas medalhas. Pelo que se tinha visto, seria ele contra os húngaros, os que tinham ficado à sua frente em Tóquio. Esta seria uma corrida para cumprir uma promessa e sentir-se vingado por frustrações passadas. A partir da pista três, Pimenta estava pronto para as duas coisas.

Foi logo para a frente, como tantas vezes faz. Logo aos primeiros metros, Pimenta pagaiou com uma cadência determinada e rapidamente ganhou meio barco de vantagem. Primeiro até cerca de 300 metros do fim. Depois, o checo Josef Dostal, que estava à direita do português e nunca muito longe, chegou-se à frente e Pimenta foi perdendo gás.

Nos últimos 200m, Pimenta já seguia em terceiro e, à medida que a meta se aproximava, o português continuava em quebra. Quarto, depois quinto e, finalmente sexto, sem reservas para mais. Dostal, vice-campeão olímpico de 2016, ficou mesmo na frente (2m24,07s) e, atrás dele, os dois húngaros Adam Varga e Balint Kopasz. O “neutro Kravetz ficou em quarto e até o argentino Augustin Vernice passou Pimenta em cima da meta.

O português cortou a meta com 3m29,59s, a mais de cinco segundos do vencedor e, depois, pareceu que lhe estava a custar sair da água. Enquanto os outros se encaminhavam para a margem, Pimenta era um retrato de apatia e resignação, parado dentro do seu caiaque.

Triunfos e tormentos

A história olímpica de Fernando Pimenta tem sido feita de triunfos e tormentos. Quando entrou em acção nos Jogos de Londres, a pagaiar com Emanuel Silva no K2 1000 metros, ficou com a prata (muito perto do ouro), naquela que foi a primeira medalha olímpica da canoagem portuguesa e a única conquistada pela comitiva nacional em 2012. Nesses Jogos, essa prata soube a ouro e foi festejada a bater no peito.

Depois desses Jogos, Pimenta fez a transição para o K1 porque sentia que tinha legitimidade para isso – e teve problemas por isso. Mas os resultados que teve foram a prova de que tinha razão. E, no Rio de Janeiro, quatro anos depois, ele já era o ponta-de-lança de uma forte equipa de canoagem candidata a vários pódios. Só que a lagoa Rodrigo de Freitas, e as suas algas marotas, puxaram o caiaque de Pimenta para trás, para quinto, quando ele se sentia na melhor forma da carreira.

Cinco anos depois, quando chegou a Tóquio, o bronze na final pareceu não o satisfazer por completo, mas mudou completamente de expressão quando teve a medalha na mão e uma chucha na boca, a mostrar ao mundo que, para além de ser duplo medalhado olímpico, também era pai de uma menina. E em Paris, de novo a sentir que estava na melhor fase da carreira, também entrou para que fosse um dia de triunfo. Mas foi de tormenta.

A lenda

Já passou cerca de uma hora após a final. Fernando Pimenta já está liberto da pressão competitiva e da pressão mediática das entrevistas, e caminha a passo acelerado para o fim de festa da canoagem olímpica, marcado para a parte de trás das bancadas. Lá, estão à espera dele a mulher, os dois filhos, mais família e muitas dezenas de portugueses. O desportista profissional desaparece para dar lugar ao homem. Pimenta pega nos filhos ao colo e sorri pela primeira vez neste dia.

Enquanto o faz, uma salva de palmas demorada para o grande campeão português. Não apenas dos seus compatriotas, mas de todos. Alemães, espanhóis, húngaros, toda a tribo da canoagem presta vassalagem ao grande campeão português, uma lenda com 145 medalhas internacionais, entre elas, duas olímpicas, cinco títulos mundiais e sete europeus.

À salva de palmas, seguem-se os pedidos de autógrafos e fotografias. Desde um rapaz com um equipamento da Associação Desportiva Os Limianos, de Ponte de Lima, a um canoísta polaco que lhe pede um autógrafo no próprio equipamento. Pimenta responde a todos com um sorriso. Não teve uma medalha olímpica, mas todos olham para ele como um campeão. É assim que são as lendas.

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