O mestre do campeão Mijaín também foi mestre em Portugal

O treinador de Mijaín López já foi seleccionador nacional e, com um domínio bastante bom do português, conta ao PÚBLICO histórias desse tempo. Emociona-se a falar do país e diz que quer voltar.

Raúl Díaz, emocionado após a vitória de Mijaín López
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Raúl Díaz, emocionado após a vitória de Mijaín López em Paris Arlette Bashizi / REUTERS
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Raúl projectado por Mijaín nos festejos em Paris Kim Kyung-Hoon / REUTERS
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Em Paris, quando se está à espera de conversar com Mijaín López, aguardando pela trupe do grande campeão olímpico da história da luta greco-romana, há um homem que dá nas vistas por, em teoria, não dar nas vistas. Raúl Trujillo Díaz é um homem baixo – e mais baixo fica ao pé da montanha humana que é Mijaín López.

É também uma figura que se deixa ficar propositadamente para segundo plano quando se trata de celebrar a glória do primeiro atleta olímpico de sempre a conquistar cinco ouros na mesma modalidade, em cinco edições diferentes dos Jogos.

Mas Raúl, apesar de oferecer os holofotes a Mijaín, também vale uma conversa. O mestre do lutador cubano também já tentou ser mestre em Portugal. Foram 15 anos a tentar que o país tivesse um verdadeiro sucesso olímpico que nunca surgiu, apesar da ida a Atenas 2004.

Em 2000, Norberto Rodrigues, na altura presidente da Federação Portuguesa de Lutas Amadoras, chegou a dizer ao PÚBLICO que a modalidade viveu um antes e um depois de Raúl Diaz. “Antes, íamos com espírito de turista: participar já era bom. Quando o Raúl chegou, tudo mudou”.

“Em Portugal falta sistema”

Em Paris, em conversa com o PÚBLICO enquanto Mijaín se desdobrava para as televisões, o treinador cubano aponta que não há nenhum atleta como Mijaín López, em Cuba ou qualquer outro lugar, mas que, em Portugal, não é a falta de talento que limita o sucesso da luta.

“Em Portugal só falta sistema. Sistema, sistema, sistema. Sem isso não se pode ter sucesso. É tudo muito individual e é preciso apoio. Sem organizar apoio é difícil”, analisa. E detalha: “Portugal tem condições para ser dos países mais fortes. Apesar de ser pequeno, tem grandes atletas. Mas o investimento é baixo. E não há sistema para formar uma carreira de alto rendimento bem feita e organizada”.

Raúl Trujillo Díaz entrega ainda elogios a José Manuel Constantino, na altura no Instituto do Desporto, a quem atribui competência extrema e impotência também ela em grandes doses, tal era a desorganização da modalidade. “Era uma pessoa muito capaz e tentou muito. Mas às vezes não basta isso”, lamenta.

E já lá iam quatro minutos e 18 segundos de conversa quando Raúl ficou intrigado.

- Mas tu falas português...
- Português? Sim, sou português. Não falo muito bem é espanhol...
- Então... mas eu falo português! Fala em português, homem! Estive lá 15 anos.

Abriu-se um novo mundo nesta conversação. Um mundo no qual o jornalista, na ignorância sobre os tais 15 anos, não esticava o seu parco castelhano ao máximo e percebia muito melhor o português bastante bom deste cubano.

E foi aí que Raúl se emocionou a falar em português – e de Portugal. “Foram 15 anos lá. Quero voltar a Portugal. Converteu-se em parte da minha vida. Tenho grandes, grandes amigos. Estou a preparar-me para se calhar voltar. Tenho sobrinhos em Torre de Moncorvo. Portugal é uma terra maravilhosa. Em Portugal e com os portugueses nunca me senti um estranho. Abriram-me a porta e gozo de respeito e carinho enormes”, aponta.

Voltar a Portugal? Talvez...

Em Portugal, o treinador cubano chegou a acompanhar o português Hugo Passos aos Jogos Olímpicos Atenas 2004, prova na qual o atleta, o primeiro surdo a representar Portugal em Jogos, perdeu os dois combates que disputou e foi eliminado cedo na competição.

Raúl Díaz recorda até um dia em que lhe pediu que cortasse o cabelo. “Havia um atleta, o Passos, que tinha dificuldade para cumprir o peso. E eu disse-lhe para cortar o cabelo. E ele conseguiu o peso”, recorda, entre risos.

Com Mijaín López, os problemas são outros. Mais do que de controlar o peso do campeão olímpico, ou as escolhas capilares, o desafio é superar as lesões. “Ele é um colosso e um atleta excepcional, mas também tem as suas lesões. São muitos anos. 24 anos”, constata, dizendo que a opção do fim da carreira do cubano é a mais óbvia: “Ele podia continuar a lutar, se quisesse, mas seriam quatro anos de sacrifício. A glória é linda, mas o tempo com a família e para se divertir também é muito importante”.

Com o fim da ligação a Mijaín López e a nostalgia toda com Portugal, a questão fica óbvia: pode voltar agora para tentar novamente elevar a luta greco-romana no país? “Se calhar... talvez sim. Vamos ver. Temos de pensar. Amo Portugal, amo as pessoas, amo a música. Sinto que tenho algo português em mim. Um grande beijo a Portugal”.

Está entregue.

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