Jovens vivem de salário em salário. Portugueses são dos que mais se preocupam com o custo de vida

Inquérito anual da Deloitte mostra que a principal preocupação dos jovens é o custo de vida - uma tendência ainda mais marcada nos portugueses. Ainda assim, dizem-se optimistas em relação ao futuro.

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Jovens vivem de salário em salário. Portugueses são dos que mais se preocupam com o custo de vida Kinga Krzeminska/Getty Images
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Seis em cada dez jovens vivem de salário em salário e três em cada dez não se sentem “financeiramente seguros”. O custo de vida é a principal preocupação – e, no caso dos jovens portugueses, é ainda mais prevalente. Apesar disso, mostram algum optimismo relativamente às circunstâncias financeiras dos seus países no próximo ano.

As conclusões são do Inquérito Geração Z e Millennial de 2024, um estudo anual da Deloitte (esta é a 13.ª edição), que conta com as respostas de 22.800 pessoas em 44 países por todo o mundo, incluindo Portugal, onde 400 jovens responderam ao questionário online. O grupo inclui 14.468 jovens da geração Z (nascidos entre Janeiro de 1995 e Dezembro de 2005) e 8373 millennials (nascidos entre Janeiro de 1983 e Dezembro de 1994).

Apesar de o custo de vida ser a principal preocupação para a geração Z e millennials de todo o mundo há três anos consecutivos ultrapassando os cuidados de saúde (em plena crise de covid-19), o desemprego e as questões ambientais , os números mostram que os jovens portugueses estão particularmente preocupados: 47% dos jovens da geração Z em Portugal disseram ser esta a sua principal preocupação, contra 34% dos restantes inquiridos. Nos millennials, são 50% contra 40% no resto do mundo.

Para Nuno Carvalho, da Deloitte, os números não são surpreendentes, mas merecem atenção. “Se os jovens não se sentem seguros, não conseguem fazer um planeamento da sua vida”, começa por enquadrar. Se olharmos para o período da pandemia, “o stress era muito provocado pelas questões de saúde e desemprego, pela incerteza”. Agora, associam-se mais à capacidade financeira e à frustração de não conseguirem autonomizar-se.

Depois do custo de vida, as preocupações organizam-se da seguinte forma para a geração Z portuguesa: saúde mental da geração (24%), a instabilidade política e conflitos globais (22%), o desemprego (22%) e a crise climática (19%). Para os da mesma idade no resto do mundo, a segunda preocupação é o desemprego (21%), a crise climática (20%), a saúde mental da geração (19%) e por fim o crime e a segurança pessoal (17%), algo que não consta na lista de principais preocupações dos jovens portugueses.

Os millennials do resto do mundo também apontam o crime como uma das principais preocupações, ocupando o terceiro lugar (19%) e, à semelhança da geração Z, também os millennials portugueses não destacam esta preocupação.

Perto de um terço dos jovens estão “optimistas que a economia do seu país deverá melhorar no próximo ano”, lê-se no estudo. “Este sentimento começou a subir no ano passado e está agora no valor mais alto desde 2020, o ano da pandemia de covid-19.” Com este optimismo, vem também a ideia que as suas finanças pessoais possam melhorar: 48% da geração Z e 40% dos millennials acreditam que podem viver melhor no próximo ano. Em Portugal, são ainda mais optimistas: são 56% e 44%.

Trabalho, saúde mental e o “sentido de propósito”

Se no relatório do ano passado os jovens demonstraram alguma preocupação em relação a potenciais passos atrás dados pelos seus empregadores no pós-pandemia, o relatório deste ano denota que os inquiridos “sentem que os seus empregadores continuam a fazer progressos em áreas como o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, o impacto social, a diversidade, equidade, inclusão e protecção do ambiente”.

No ano passado, os inquiridos reportaram que pelo menos dois terços tiveram de regressar ao trabalho presencial no escritório, quer a tempo inteiro, quer em modelo híbrido. As consequências desta decisão não são, no entanto, claras: “Alguns reportam benefícios como maior interacção, conexão e colaboração, bem como melhor rotina e estrutura no trabalho, enquanto outros estão a sentir stress acumulado e diminuição da produtividade.”

O relatório reporta que os jovens da geração Z e millennials continuam, no entanto, a “valorizar a flexibilidade”, tanto de horários como de local de trabalho. “Depois da pandemia, criou-se a expectativa de uma maior flexibilidade para o trabalho híbrido, muitas pessoas se calhar assumiram que o trabalho passaria a ser mais remoto do que presencial, permitindo assim que as pessoas estivessem mais afastadas dos grandes centros, onde o custo da habitação é mais caro”, refere Nuno Carvalho. Não foi bem assim e “é hoje mais difícil conciliar toda a carga financeira que acaba por existir”.

O trabalho é também um dos factores que contribui para prejuízos na saúde mental: questões como “excesso de carga horária e falta de reconhecimento” contribuem para que 40% da geração Z e 35% dos millennials reportem sentirem-se “stressados a maior parte do tempo”, ainda que os números tenham melhorado ligeiramente em relação ao último ano. Outros factores que contribuem para este sentimento são as “preocupações financeiras e o bem-estar familiar”.

Em Portugal, os números são ainda mais altos: 53% da geração Z e 42% dos millennials estão em stress constante, muito por causa da carga horária, falta de tempo para cumprir todas as tarefas e falta de reconhecimento profissional.

Melhorar a saúde mental no local de trabalho é uma prioridade para os jovens – num momento em que apenas cerca de metade (51%) da geração Z e dos millennials (56%) de todo o mundo classificam a sua saúde mental como “boa” ou “extremamente boa”. Em Portugal são menos ainda: 50% da geração Z e 44% dos millennials.

O “sentido de propósito” é também importante: cerca de nove em cada dez jovens afirma que é importante sentir isto no seu trabalho para ter “satisfação profissional e bem-estar geral”. “Há muito que as gerações mais jovens afirmam valorizar o trabalho orientado para um propósito e, nesta edição, essa percepção persiste.”

“Estamos a falar de gerações cuja educação já foi muito orientada para o questionar ou debater ideias”, afiança Nuno Carvalho. “Hoje em dia os jovens querem participar mais, perceber o contexto em que estão a colaborar e se se revêem nos princípios que a organização defende”, continua.

Os “temas ambientais” são também “determinantes”. “A pandemia veio trazer uma reflexão significativa” e os jovens perceberam que “estão a herdar um planeta que denota uma série de fragilidades e que vão ter de ser eles a minimizar os impactos. E estão a sentir esse peso.”

No relatório de 2020, o meio ambiente era a principal preocupação da geração Z e millennials, que acreditavam que "os estragos provocados pelas alterações climáticas" poderiam ser "irreversíveis". Agora, a crise climática está a cair na lista de preocupações, apesar de ainda ocupar um lugar cimeiro. Seis em cada dez jovens disseram, no relatório deste ano, terem sentido "preocupação ou ansiedade devido às alterações climáticas no último mês", mais dois pontos do que em 2023.

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