Miranda Sarmento: em Setembro haverá acerto do IRS pago a mais entre Janeiro e Agosto
O Governo vai apresentar, no Parlamento, no final deste ano ou início do próximo, uma “proposta de alteração da lei de enquadramento orçamental, para ajustar às novas regras orçamentais europeias”.
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Convicto de que a proposta do PS de alívio do IRS que foi aprovada pelo Parlamento, pese embora ter sido promulgada em Belém, é inconstitucional, Joaquim Miranda Sarmento não esclarece se o executivo solicitará a fiscalização sucessiva do diploma, dizendo apenas que "o Governo tomará uma decisão a seu tempo". Em entrevista ao programa Hora da Verdade, do PÚBLICO e Rádio Renascença, o ministro de Estado e das Finanças admite que, em função do decorrer das negociações, o executivo ainda poderá recuperar a sua proposta de baixa do IRS.
Em relação ao IRS, quando é que o Governo vai publicar o despacho com as novas tabelas de retenção na fonte?
Esperamos fazê-lo o mais rapidamente possível, em princípio na segunda quinzena de Agosto.
Como é que vai funcionar o mecanismo de devolução?
O mecanismo de devolução, à partida, funcionará da seguinte forma, estou a dizer à partida porque ainda estamos a calibrá-lo: haverá uma taxa de retenção na fonte em Setembro mais baixa do que aquela que depois vai vigorar a partir de Outubro.
Serão duas tabelas?
Sim… Essa taxa de Setembro fará, dentro daquilo que é possível para um universo de mais de três milhões de agregados familiares, aquilo que seria o acerto entre Janeiro e Agosto, e depois, a partir de Outubro, vigorarão as novas tabelas de retenção na fonte, de acordo com aquilo que foi aprovado no Parlamento.
Desapareceram as dúvidas sobre a constitucionalidade da descida de IRS aprovada no Parlamento, a possibilidade de violar a norma-travão?
Do meu lado, não, mas a quem competia, o Parlamento, entendeu, os serviços do Parlamento entenderam, que as propostas dos partidos não violavam a norma-travão, nem violavam o direito de iniciativa. O Presidente da República entendeu não pedir a fiscalização preventiva. Não sou jurista, mas na minha opinião viola a lei-travão.
Não vai haver fiscalização sucessiva?
O Governo tomará uma decisão a seu tempo.
Vai insistir na descida do IRS que o Governo defendia, ou seja, que chegasse também aos escalões mais altos?
Vamos avaliar em função daquilo que for a margem orçamental. Nós, em Setembro, Outubro, já teremos estimativas mais robustas. E também dependerá, obviamente, daquilo que for o decorrer das negociações.
Mas essa mexida no IRS, para se aproximar daquilo que o Governo pretendia à partida, não esgotará a pouca margem que há para negociar no Orçamento do próximo ano?
Vamos avaliar.
Mas pode esgotar?
Não sei se esgota ou não, obviamente, quanto mais medidas, menor é a margem. Mas isso é uma... As negociações são dinâmicas e, portanto, mais uma vez, não vale a pena partir com limites muito fixados que não sejam o não desvirtuar o Programa do Governo.
O Governo está a negociar com a Comissão Europeia (CE) aquilo que é o factor-chave das novas regras orçamentais, uma espécie de tecto à despesa. Qual foi o limite de crescimento da despesa primária líquida recomendado pela Comissão? As medidas já aprovadas, pelo Parlamento e pelo Governo, põem em causa esse tecto?
Em primeiro lugar, é importante compreendermos que há novas regras orçamentais europeias, e o paradigma alterou-se relativamente. Estamos em processo de negociação com os serviços da Comissão. Com a informação que temos e com as medidas que o Governo tomou e ainda tomará no âmbito do seu programa, estamos relativamente confortáveis de que cumpriremos essa trajectória de sustentabilidade da dívida e de que cumpriremos os limites da conta de controlo para os desvios que possam existir a esses tectos de despesa nos quatro anos do exercício 2025-2028.
Mais uma vez, se não houver um desvirtuamento daquilo que é o plano orçamental do Governo, que depois é traduzido nos orçamentos do Estado, estamos confortáveis de que teremos uma trajectória de sustentabilidade da dívida e uma análise por parte da CE que nos permitirá acomodar as medidas do Governo. Olhamos para os quatro anos, 2025-2028, com conforto de que cumpriremos as regras orçamentais.
A partir de quanto é que pode estar em causa a violação do tecto de despesa?
Antes disso, se desvirtuarmos o programa orçamental do Governo, podemos mesmo não cumprir a trajectória de sustentabilidade da dívida. Estamos a trabalhar com um cenário em que há um excedente orçamental de 0,2-0,3%. Se o Parlamento aprovar medidas que nos coloquem num défice, isso torna muito mais difícil o cumprimento das regras orçamentais.
É obrigatório por lei divulgar, no âmbito das GOP [Grandes Opções do Plano], o valor dos quadros plurianuais de despesa. O PS tem pressionado, o próprio presidente da Assembleia da República (AR) já pediu esse elemento. Como é que o Governo vai justificar o não cumprimento desta exigência?
Temos novas regras orçamentais que determinam um novo paradigma. Uma das coisas que o país vai ter de fazer, o Parlamento, porque é a sua competência, no final deste ano ou no início do próximo, é uma revisão da lei de enquadramento orçamental (LEO). No final do ano, início do próximo, apresentaremos uma proposta à AR de alteração da LEO, para ajustar àquilo que são as novas regras orçamentais europeias.
Depois teremos uma segunda discussão: analisar, por exemplo, se faz sentido aumentar o prazo de discussão do Orçamento no Parlamento. Portugal tem um dos prazos mais curtos na OCDE, enfim, há um conjunto de temas para lá daquilo que é a revisão mínima que decorre da mudança das regras europeias.
A negociação com a Comissão ainda está muito em aberto?
A negociação ainda está em aberto e, portanto, qualquer quadro que tivéssemos apresentado não nos dava a robustez necessária para aquilo que deve ir para o Parlamento.
É possível que o Governo só tenha conhecimento desse tecto da despesa já próximo da apresentação da proposta orçamental. Isso não vai dificultar as negociações, logo no arranque de Setembro, com os partidos, uma vez que não se vai conhecer até onde é que se pode ir?
Essa é naturalmente outra dificuldade, mas volto a um ponto que já referi. Estamos a trabalhar com um saldo orçamental de 0,2-0,3%. Uma das regras é ter um saldo orçamental equilibrado. Os limites estão fixados por aí, independentemente daquilo que possam ser, um pouco mais ou um pouco menos, os tectos de despesa.
Como que é que ficam as medidas já aprovadas se o Orçamento para 2025 for chumbado? Por exemplo, a recuperação do tempo de serviço dos professores pode ser aplicada em caso de duodécimos?
Teremos de avaliar, dentro daquilo que são os plafonds de cada ministério e a regra dos duodécimos. Não estou em condições para dizer se sim ou se não. O que estou em condições de dizer é que, se o país tiver de viver com duodécimos, isso agrava a instabilidade, dificulta o investimento das empresas e dificulta muito a execução do PRR.