Em Lagos, o Algarve concentrado no menu estrelado do Al Sud Palmares

É a terceira estrela Michelin consecutiva do restaurante, em Odiáxere, com assinatura do chef Louis Anjos e do sous chef Jeferson Dias. No final, há uma fotografia para recordar toda a experiência.

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No Al Sud Palmares há uma viagem para fazer pelo sul do país DR
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O edifício alberga o Al Sud e o Clubhouse, ambos sob a batura de Louis Anjos DR
Cicchetti
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Gamba (no prato longo) e língua de ouriço numa tartelete (em cima) DR
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Carabineiro, toucinho e noodles de batata DR
,Cozinha mediterrânea
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Pregado com bivalves da ria do Alvor, aipo e coentros DR
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Porco com milhos de Monchique e caldo do cozido DR
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DR
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À medida que a auto-estrada que nos traz de Lisboa se vai aproximando do Algarve, há enormes anúncios que vão antecipando a chegada. A maioria é dos supermercados ou dos centros comerciais da região, informando em que terra estão as suas unidades, para que os veraneantes não se percam. Outros anunciam o imobiliário com que se pode sonhar, a tal casa da praia, ou o mobiliário com que se pode decorá-la. E depois, mal se passa a portagem, há um placard com a praia em toda a sua infinitude e uma frase mágica: Home is where the ocean is. É o anúncio do Palmares Ocean Living & Golf, onde fica o restaurante Al Sud, que há três anos consecutivos conquista a estrela Michelin.

Odiáxere fica a poucos minutos de Lagos e a chegada ao empreendimento parece que se faz pelas traseiras, com muitas obras ainda inacabadas. Afinal, trata-se de um resort residencial com lotes para moradias e apartamentos (daí o azáfama da construção), praia (tem de caminhar um bom quarto de hora), campo de golfe (com 27 buracos e premiado, diz o comunicado à imprensa), hotel boutique de cinco estrelas (pequenino e quase familiar, com uma piscina em frente ao mar e uma vista de se perder, para o tal oceano anunciado à chegada ao Algarve).

A acrescentar a tudo isto, existem três restaurantes — o do próprio hotel, o Clubhouse e o Al Sud Palmares —, todos sob a tutela do chef Louis Anjos, que saiu do algarvio Bon Bon, no Carvoeiro, onde deixou uma estrela que se mantém com José Lopes. E, com a transição, Louis Anjos focou-se ainda mais nos produtos da região, num menu que tem também a assinatura do sous chef Jeferson Dias, que há um ano conquistou o prémio Chefe Cozinheiro do Ano, aquele que é considerado o maior concurso de cozinha em Portugal.

A primeira estrela Michelin chegou seis meses depois da abertura do Al Sud Palmares, em 2021, que se repetiu nos dois anos seguintes, mostrando a coerência do que ali se faz. As placas com a distinção lá estão, à entrada do espaço que o restaurante de fine dining partilha com o Clubhouse, onde se fazem refeições mais descontraídas com um toque da dieta mediterrânica, num edifício todo ele envidraçado — concebido pelo ateliê catalão RCR Arquitectes, prémio Pritzker em 2017 —, deixando ver a paisagem entre o verde dos campos de golfe e o azul do estuário do Alvor e do Atlântico, pintalgada pelos edifícios de Lagos e Portimão, e interrompida pela passagem do comboio ao fundo.

Diz o Guia Michelin: "O chef Louis Anjos defende uma cozinha actual com toques criativos, isenta de excentricidades, que tem como referência os produtos do Algarve e da sua costa, dando sempre especial protagonismo aos peixes e mariscos que compra diariamente na lota de Sagres, e sem esquecer o melhor gado local."

O menu apresentado pode ser de seis ou de oito momentos, informa Maeva Lopes, que durante a noite se desdobra entre o português, o inglês e o francês. O restaurante tem 24 lugares, é preciso reservar com antecedência, e as mesas são preenchidas sobretudo com estrangeiros. O desafio é experimentar os sabores algarvios com uma harmonização de vinhos, também locais. Mas há mais: a chegada do bartender Pedro Rabadão convida a uma experiência de composições que chegam do bar. Os cocktails são a "cozinha líquida", define o profissional que nos convida a cheirar três perfumes, ali feitos, os quais permitem "activar o cérebro" e ajudar a escolher o que se quer beber. Ou seja, "não há uma carta, há uma experiência sensorial", resume.

Depois, é a vez de Nuno Pires, maitre d' (responsável pela sala), mostrar com simpatia a sua larga experiência, revelando-se um contador de histórias e aproximando-nos de todos os produtores e enólogos da região. Contudo, começa por trazer um champanhe Delamotte Brut que vai acompanhar os primeiros pratos, onde experimentámos gamba e língua de ouriço numa tartelete, em que os sabores são muito familiares. Segue-se um escabeche de mexilhão com enguia fumada, uma sopa de santola, talharim de choco e lima kefir. Perante a reacção da mesa, Nuno Pires brinca e diz: "Podia ser melhor, mas é o que temos!"

Deseguida, chega um momento do pão, com pão de trigo massa mãe e um brioche que é feito ali, a manteiga vai buscar os sabores da salada de cenoura algarvia, há ainda biqueirão e pele de moreia frita, seca ao sol, que deve ser comida em cima da manteiga, sugere Maeva. Obedecemos e é a nossa perdição, deixando-nos com pouco espaço no estômago para continuar o menu de degustação. Por isso, o conselho é para que prove, mas não coma o pão todo para conseguir chegar ao final do jantar. Sim, vai ser difícil porque é um momento irresistível.

O primeiro prato é de peixe, com os sabores da ria — há uma cápsula feita com ostras, pérolas de água de pepino e caviar, assim como plantas halófitas que consomem água salgada. Para acompanhar um Crato branco, de 2017, sem rótulo e que foi o servido quando, em Fevereiro, estiveram presentes convidados da Michelin, conta Nuno Pires. "O Aníbal [Coutinho, o enólogo] disse-me: 'Tenho um vinho que dá vontade de chorar'", recorda o profissional que, entretanto, vai ensinando uma aluna, que está a estagiar, a pôr a mesa. Nuno Pires diz que é um vinho que ficará até ao final da temporada.

Segue-se um tártaro de carabineiro com molho com galanga (também conhecido por gengibre tailandês) e citronela. Não é fácil fazer pairing com carabineiro, continua o maitre d'. "Tentamos fazer acentuar o iodo do mar e as vinhas da costa já quase desapareceram, mas não ficamos atrás de Colares", orgulha-se.

O prato que se segue é lula recheada com a cabeça da lula frita e molho de ervilhana (i.e., alcagoita ou amendoim, no caso de Aljezur, campo de excelência para a sua produção). E, para cortar a gordura do fruto seco, era preciso um vinho com "acidez suficiente", descreve Nuno Pires, que optou por um vinho de castas indígenas. À mesa chega um pregado com texturas de aipo, massa com lingueirão da ria e amêijoas, e cremoso à Bulhão Pato. E chega também um vinho algarvio reputado, um Quinta do Miradouro (cuja história da propriedade até já passou, noutros tempos, pelo 'algarvio' Cliff Richard). "Somos um dos últimos sítios onde se pode apreciar [este vinho], que não fica nada atrás de um Bucelas", declara Nuno Pires.

O menu continua, sempre bem acompanhado com vinhos especiais, e o sous chef Jeferson Dias passa pelas mesas, antes de se despedir, para contar como esta carta é uma homenagem ao Algarve e às memórias antigas, assim como para saber as reacções dos clientes. No final, Maeve aproxima-se com um carrinho, onde traz uma mala antiga e uma caixa de lata das bolachas Paupério, lá dentro estão petit fours para fechar o menu de degustação, e uma câmara Instax, com a qual tira uma fotografia. Um instante de uma noite que é para recordar.


A Fugas experimentou o menu a convite do Al Sud Palmares.

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