Enquanto percorre as regiões centrais da Itália, uma locomotiva a diesel antiga, rebocando vagões dos anos 1930 e 1950, atravessa as florestas do parque nacional de Majella e as terras altas de Abruzzo, dando aos turistas a bordo um vislumbre de aldeias escondidas.
Ao longo dos seus pouco mais de 100 quilómetros, a chamada linha ferroviária do Transiberiano italiano, também conhecida como Park Railway, desliza por desfiladeiros, serpenteia em 58 túneis e enfrenta enormes viadutos.
Foi o primeiro de cerca de 1000 quilómetros de linha a ser inaugurado no âmbito de um projecto da Fondazione FS, parte da empresa ferroviária nacional Ferrovie dello Stato (FS), controlada pelo Estado.
O projecto Timeless tracks leva os turistas a partes esquecidas de Itália, oferecendo uma alternativa ao turismo de massas acelerado das grandes cidades.
"São carris que atravessaram diferentes épocas, transportaram soldados para a frente, vacas para o pasto... foram erradamente considerados improdutivos durante os anos 60 e 70, mas agora têm novamente valor", disse à Reuters Luigi Cantamessa, director da Fundação FS.
Inspirado nas viagens de comboio na Suíça, o projecto transporta actualmente 45.000 turistas por ano nas suas 13 linhas. A FondazioneFS prevê a abertura de duas novas linhas até 2026, ambas na região sul da Sicília.
" Os que eram considerados os ramos moribundos da rede ferroviária italiana revelaram-se agora os rebentos mais verdes", acrescentou Cantamessa.
Aqui não há pizzas congeladas
"As pessoas estão habituadas a cidades e locais, como Florença, que toda a gente conhece... mas há outras zonas que precisam de ser descobertas. (Este) é o tipo de turismo certo, que não estraga a autenticidade dos lugares", disse Norma Pagiotti, uma jovem de 28 anos de Florença que viajou no comboio com dois amigos.
Com o número de chegadas acima dos níveis pré-pandémicos, destinos turísticos europeus populares, incluindo Veneza, introduziram medidas destinadas a gerir o número de visitantes, num contexto de preocupações crescentes sobre a sobrelotação.
"O comboio faz-me lembrar a minha juventude, sinto uma certa nostalgia das coisas do passado, que eram mais simples, agora tudo é rápido e efémero", diz Caterina Quaranta, de Taranto, no sul de Itália, sentada nos bancos de madeira do comboio.
As viagens atraem italianos e estrangeiros, muitas famílias e crianças, jovens que saem para caminhar e andar de bicicleta e pessoas mais velhas "que têm tempo livre", explicou Laura Colaprete, uma guia local.
"É para aqueles que não querem um turismo de massas, destinos desorganizados. Um viajante consciente, que está à procura de algo especial", disse Cantamessa da Fondazione FS. "Não se trata de viagens que servem pizza congelada ao almoço", acrescentou.
Música popular, comida local
Depois de subir quase 1000 metros de altitude, a primeira paragem do Transiberiano é em Palena, uma cidade medieval no topo de uma colina, conhecida pelas suas vistas deslumbrantes sobre o parque nacional.
A música folclórica tradicional acompanha as pessoas que saem do comboio, e na estação esperam-nas iguarias locais como as espetadas de borrego e os pastéis de massa folhada feitos com um molde de ferro, conhecidos como pizzelle, e produtos de artesãos locais.
"O comboio ajuda várias pequenas cidades aqui à volta. Esta linha era uma linha morta antes", disse Gino Toppi, 60 anos, enquanto ajudava a sua mulher na banca de comida da pequena estação.
A Universidade Bocconi de Milão calculou recentemente que, por cada euro gasto pelos passageiros em bilhetes - que custam entre 30 euros e 70 euros (32,50 - 76 dólares) - são gastos mais 3 euros em alimentação, alojamento, excursões e lembranças.
Isto ajuda a apoiar a economia das aldeias que há muito perderam população devido à diminuição da taxa de natalidade e à partida dos jovens para as grandes cidades.
"Há certamente benefícios, esta é uma forma de mostrar os meus produtos", disse Annalisa Cantelmi, uma ervanária.
"Estes turistas estão lentamente a descobrir estes 'novos' territórios, as suas tradições e as suas gentes", acrescentou.