Uma noite nos lugares de 1600 euros

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Quando António Guterres, secretário-geral da ONU, apareceu nos ecrãs a passar uma mensagem pré-gravada de paz ainda estava tudo seco e bem-disposto. Quando Lady Gaga fez o seu número de Moulin Rouge, dançávamos com ela sem escorregar nos degraus. Mas quando o grupo de can can agitou as pernas à beira do Sena, já o céu caía abundantemente em cima das nossas cabeças.

Foi assim ao longo de seis quilómetros da travessia do Sena, na cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris 2024: dilúvio. Não houve investimento em toldos, nem em capas de plástico para os menos prevenidos - lembrem-se de que estes são os Jogos mais verdes de sempre e não há plástico. Pensou-se em tanta coisa nestes Jogos e, em especial, nesta cerimónia de abertura diferente das outras, ninguém se lembrou de ver o tempo.

A chuva apanhou todas as cabeças, incluindo as cabeças que pagaram 1600 euros por uma posição frontal em frente ao rio, com vista privilegiada para os 90 e tal barcos que transportaram as 206 comitivas. Foi aqui que viemos parar depois de muitas voltas e becos de segurança sem saída. Várias tentativas depois e outras tantas combinações de transporte, lá houve uma porta que se abriu com a cor turquesa do nosso bilhete.

Era para a zona dos bilhetes a 1600, os segundos mais caros disponibilizados para assistir de cadeirinha à cerimónia. Era vista e cadeira, nada mais. Pouco antes de arrancar (ainda sem chuva), alguém se lembra de dizer a toda a gente que a zona dos 1600 era mais para a esquerda - toda a bancada se levantou em sincronia e foi para a esquerda. Voltaram todos para trás ao mesmo tempo.

Uma a uma, as comitivas foram passando e as pessoas aguentaram como puderam a chuva, diga-se com grande descontracção e nenhum queixume. Muitos vieram prevenidos, outros não. Entre os desprevenidos dos 1600, muitos não se importaram, outros tentaram alternativas, como pedirem sacos de plástico ao homem do lixo - que ainda deu alguns à malta dos 1600. Afinal, havia plástico.

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