Guterres denuncia “terror” militar israelita na Faixa de Gaza
Líder da ONU lamentou falta de resposta da comunidade internacional ao apelo humanitário para Gaza, garantindo apenas 36% dos fundos requeridos, e recusou comentar discurso de Netanyahu nos EUA.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou esta quinta-feira que a forma como Israel conduz a guerra em Gaza, associada às dificuldades de garantir ajuda humanitária, criaram “uma situação de terror verdadeiramente dramática”.
A agressão militar está a provocar “o maior impacto de mortes e destruição de que me recordo”, disse Guterres, que aludiu ainda à “natureza caótica” desta campanha que se reflecte nas ordens emitidas pelo Exército israelita para que os palestinianos abandonem as suas casas e se desloquem para o Centro do enclave, de seguida do Centro para o Sul, e de novo do Sul para o Norte.
“Em qualquer momento dizem às pessoas que se desloquem para outro lugar, e as pessoas deslocam-se em busca de uma segurança que já não existe em lado nenhum”, lamentou, em referência aos 1,9 milhões de deslocados internos na Faixa de Gaza, muitos obrigados a fugir das suas casas ou abrigos mais do que uma vez.
A esta situação associam-se os entraves à entrega de ajuda humanitária impostos por Israel, que cria “permanentes obstáculos à negociação e impõe dificuldade atrás de dificuldade” para a entrada e distribuição de apoio, alegando motivos de segurança ou de suposto uso indevido dessas ajudas.
Guterres acusou ainda o Exército israelita de, só nos últimos cinco dias, disparar em três ocasiões distintas contra veículos de transporte de ajuda humanitária.
Uma situação que motivou “total insegurança e anarquia”, agravada pelo facto de a “comunidade internacional ter respondido parcialmente” ao apelo humanitário para Gaza e ter garantido apenas 36% do financiamento requerido, acrescentou.
O secretário-geral da ONU concluiu ao sublinhar “o modo como [Israel] conduz as suas operações militares e as circunstâncias dramáticas de distribuição de ajuda humanitária e que motivaram uma situação de terror humano”.
Devido às críticas feitas publicamente a Israel, Guterres está a ser boicotado pelo Governo de Benjamin Netanyahu há vários meses, com o primeiro-ministro israelita a não atender nenhuma das suas chamadas nem solicitar um encontro durante a sua visita aos Estados Unidos, reconheceu Guterres.
Ao ser questionado sobre as palavras de Netanyahu no Congresso norte-americano, esta quarta-feira, sobre o futuro da Faixa de Gaza – desmilitarizada, desrradicalizada e com controlo israelita sobre a sua segurança – Guterres apenas referiu que “nada do que foi dito merece o meu comentário”, insistindo na solução de dois Estados como a única possível.
Forças israelitas mataram dezenas de palestinianos nas últimas 24 horas
Nas últimas 24 horas, enquanto Benjamin Netanyahu cumpria a sua visita aos Estados Unidos, as Forças de Defesa de Israel (IDF) prosseguiram os bombardeamentos contra as cidades de Gaza e de Beit Lahia, no Norte do enclave, onde pelo menos nove pessoas foram mortas.
No campo de refugiados de Bureij, no Centro da Faixa de Gaza, as operações militares israelitas feriram sete palestinianos, a maioria crianças, segundo fontes médicas no local.
Segundo relatos de testemunhas, os soldados dinamitaram habitações no bairro de Tel al-Sultan, em Rafah (o mesmo onde há dois meses pelo menos 45 pessoas foram mortas), e em Bani Suhaila, a leste de Khan Younis, onde foram registadas três vítimas mortais.
Outras quatro pessoas morreram vítimas de um ataque aéreo israelita na zona Sul de Khan Younis. De acordo com fontes citadas pela agência de notícias palestiniana Wafa na tarde desta quinta-feira, pelo menos 30 pessoas terão sido mortas pelo Exército de Israel nas últimas 24 horas.
Milhares de famílias palestinianas, encurraladas no enclave, continuam a fugir dos incessantes bombardeamentos, após novas ordens de retirada das IDF.
“Vivemos ao lado dos mortos. Somos como os mortos. A diferença é que respiramos, eles não”, disse Rytal Motlaq, palestiniano que improvisou um abrigo com lonas junto a um cemitério em Khan Younis, citado pela agência de notícias AFP.