Caro leitor
Há mudanças nas provas de aferição. Foram anunciadas há pouco pelo ministro da Educação, Fernando Alexandre, e pelo secretário de Estado Alexandre Homem Cristo. Passam a ser feitas no 4.º e 6.º anos do ensino básico. Vão chamar-se “provas de monitorização da aprendizagem” e vão incidir sobre as “literacias” (Português e Matemática, sempre, mais uma disciplina rotativa) e não sobre o currículo.
Também muda a escala de avaliação e a forma como esta é apresentada: cada aluno que faça provas de aferição terá uma classificação de zero a 100, que fica registada no seu processo individual.
Apesar das mudanças, estas provas continuam a não contar para a classificação final dos alunos. Ou seja, não estamos a falar de um regresso dos exames nacionais dos 4.º e 6º anos, como no tempo do ministro Nuno Crato.
Os enunciados não serão tornados públicos, para que, no ano seguinte, o mesmo tipo de exercício/item possa ser aplicado. Objectivo: garantir uma melhor comparabilidade de resultados de ano para ano, como nos explica a jornalista Cristiana Faria Moreira, que assistiu à conferência de imprensa no Ministério da Educação, em Lisboa, e nos dá os detalhes que foram avançados pela equipa governamental, não só sobre as provas, como sobre os planos que existem para os exames do 9.º ano e do secundário. Vamos continuar a acompanhar este tema ao longo do dia no PÚBLICO.
O ministério quer que os resultados dos alunos do 1.º e 2.º ciclos sejam mais escrutinados publicamente. Entende que provas deste tipo são essenciais para que isso aconteça. Alexandre Homem Cristo já tinha deixado essa nota, num artigo de opinião publicado há dias. E reforçou-a nesta quinta-feira: "Todas as escolas vão poder olhar para o lado: por que razão a escola do município do lado tem uma população muito parecida com a minha, do ponto de vista socioeconómico, do perfil dos alunos, e está a conseguir melhorar e eu não estou?".
E acrescentou: "O resultado do aluno acompanhará a ficha individual, as escolas terão os seus relatórios internos e a nível nacional teremos a informação anonimizada, naturalmente, para trabalhar os dados e para fazer os diagnósticos nacionais."
Os contornos do novo modelo acabam de ser anunciados, certamente vão ser debatidos pela comunidade educativa nos próximos dias, mas uma das interrogações, para já, é se as medidas anunciadas serão suficientes para credibilizar esta avaliação.
A questão da credibilidade é um tema há vários anos. Não contando para a nota, como garantir que os alunos e as suas famílias as reconhecem como algo importante no seu percurso? É que só faz sentido haver este tipo de avaliação se ela ajudar as escolas e os decisores políticos a detectar fragilidades e a tomar medidas concretas em função dos problemas observados. Caso contrário, são mera perda de tempo.
Os resultados do ano passado foram tão maus que a dúvida voltou a instalar-se. Na maioria dos itens testados em Ciências Naturais e Físico-Química do 8.º ano, por exemplo, a percentagem de alunos que não conseguiram responder, ainda que com dificuldades, ou que não responderam de todo, ia dos 50% aos 96%. Há professores a relatar que os alunos não levam a sério a avaliação. E não se empenham na hora de responder.
Marçal Grilo, ex-ministro da Educação (1995-1999), é uma das vozes que têm alertado para esta questão. Numa entrevista em 2023, ao PÚBLICO, dizia: “As provas de aferição perderam quase completamente a sua razão de ser porque os professores, as escolas, os miúdos e as famílias acham que aquilo não serve para nada.”
Por isso, sugeria que passassem a contar alguma coisa para a nota final. “Não sei se cinco, se 15 ou 20, não sei, uma coisa simbólica para mostrar aos miúdos que, naquele dia, aquela prova que vão fazer é importante.”
Contar para a nota não foi o caminho escolhido. Aposta-se na divulgação pública dos resultados. Continuaremos a acompanhar este tema nesta newsletter na próxima quinta-feira.
Até lá, boas leituras