Meat Winemakers: quando a carne se encontra com os vinhos do Douro no Algarve
No hotel Tivoli Marina Vilamoura, a aposta do Pepper’s Steakhouse é uma “experiência gastronómica única”, num diálogo entre o chef André Basto e o enólogo Luís Sottomayor, da Sogrape.
Há muito que este encontro era esperado, confidenciam Luís Sottomayor, enólogo da Sogrape, e o chef André Basto, chef-executivo do Tivoli Marina Vilamoura, responsável pelo restaurante Pepper's Steakhouse. Esteve já planeado para várias datas, mesmo por altura da pandemia, mas aconteceu no início deste mês, num jantar com vários momentos e onde o desafio foi conseguir o melhor prato para cada um dos vinhos propostos. O evento chama-se Meat Winemakers e, de 13 a 20 de Julho, os clientes podem experimentar algumas das propostas que foram feitas, vinhos incluídos.
A noite ainda não caiu e da mesa do chef, destacada ao fundo do restaurante e onde se senta uma dúzia de convivas em cadeiras altas, a vista é para a Marina de Vilamoura e as dezenas de iates que ali pernoitam. À cabeceira, Luís Sottomayor, que dirige a equipa de enologia de todas as marcas de vinho do Douro e do Porto, é o cicerone desta experiência no que aos vinhos diz respeito e chega a propor a mudança do cálice para um copo alto para beber o Porto Sandeman 30 anos, já no final da refeição. Por seu lado, André Basto mantém um pé na sala e noutro na cozinha, onde supervisiona o que vai sendo apresentado à mesa.
A experiência enogastronómica começa com um surf & turf, ou seja, um prato que combina proteínas de peixe e de carne. André Basto explica como chegou à conjugação de sabores, demonstrando que fez muita pesquisa para não só conseguir a harmonização com os vinhos, mas também fazer um elogio à região do Douro. Assim, por exemplo, neste prato há caviar iraniano, numa referência ao esturjão que existia no Douro, de cujas ovas se podia fazer caviar. Além de um lagostim de rio, foi feito um foie-gras. Sottomayor escolheu um Vinha Grande Branco de 2013, com a acidez certa para o prato apresentado.
Começa a dança de tirar e pôr copos, talheres e a chegada dos novos pratos à mesa, intercalada com as explicações de Sottomayor — que lembra que a marca mais conhecida da Sogrape é a Mateus Rosé, exportada para todo o mundo, mas que a empresa, além das vinhas em Portugal, as tem também em Espanha, Argentina, Chile e Nova Zelândia —, e as do chef que já passou por cozinhas internacionais como a do Hotel Le Bristol, em Paris, detentora de três estrelas Michelin.
Para segundo momento, Basto optou pelo javali, uma carne que reconhece ter um sabor intenso, com trufa, beterrabas, rabanetes e gel de maçã. Já Sottomayor propõe um tinto Quinta da Leda 2017. Esta quinta é a maior do grupo, com 170 hectares e a quatro quilómetros da fronteira com Espanha. "É de onde vem a maioria das uvas para o Barca Velha", explica. O vinho que provamos tem uma "boa capacidade para envelhecer", informa.
"Casou muito bem", diz Luís Sottomayor ao chef, quando este regressa à sala para apresentar o prato seguinte, que se mantém na caça. Trata-se de um pombo depositado num pequeno sauté de cobre, acompanhado de pêra bêbeda e castanhas, um prato que lembra o Outono e para o qual a escolha recai num Castas Escondidas 2019. Sottomayor recorda que em Portugal existem mais de 250 variedades de castas, todas identificadas e cartografadas. Este é um vinho com um "perfil diferente" porque tem castas menos conhecidas, o que lhe dá uma cor mais "clara, suave e elegante". E declara: "O Douro não é só as variedades mais conhecidas."
Segue-se o prato com a apresentação mais sóbria, mas que é a estrela da noite por se tratar de Wagyu, uma carne de vaca vinda do Japão, acompanhada com espargo branco grelhado na chama e um tártaro com mostarda, temperado com azeite e flor de sal. Para este, a proposta é um vinho com um "significado muito especial", diz o enólogo. Trata-se de um Legado 2018, oriundo de uma vinha com apenas oito hectares e mais de cem anos. "É um vinho diferente e é um legado que Fernando Guedes deixou", diz, fazendo referência ao líder histórico da Sogrape e pai do actual CEO da empresa. Um tinto feito 100% de vinhas velhas, explica.
Aproximando-se do fim da refeição, André Basto propõe uma viagem por Portugal através dos seus queijos, que em nada ficam a dever aos franceses, orgulha-se. Apresenta uma tábua com um Terrincho de Trás-os-Montes, um São Jorge 24 meses, um queijo do Pico, um Serra da Estrela e um de Serpa. A proposta de Sottomayor é um Callabriga 2000, "um clássico do Douro Superior", um vinho com "características parecidas com o que se faz no Novo Mundo". Esta edição com 24 anos harmoniza bem com os queijos, reconhece o enólogo, embora preferisse que a tábua tivesse apenas três variedades de queijo, sugere ao chef, passando a contar a história do vinho seguinte, um Série Ímpar Curtimenta, um desafio colocado pelo CEO, Fernando Cunha Guedes, a todas as equipas de enologia da empresa: "Fazer coisas fora da caixa."
Luís Sottomayor reconhece que, no Douro, a equipa está ligada a aromas mais tradicionais mas que, por vezes, faz "experiências malucas" e um dos resultados é este vinho que parece um "cavalo selvagem já domesticado". O chef diz que para a "irreverência" daquele vinho pensou num cremoso de chocolate branco com sabugueiro, uma planta tão comum nas zonas rurais. Com o privilégio de ter o Glee Boutique Café no espaço do hotel, André Basto pode contar com essa equipa para fazer as sobremesas e petit-fours, confidencia.
Num enorme prato pincelado com ouro, numa referência não só ao ouro que se extraiu no rio Douro (daí o seu nome), mas também o que veio do Brasil, o chef apresenta a sobremesa a que deu o simples nome de Chocolate Brazil, onde o chocolate negro chega com uma pavlova e sorbet de framboesa e citronela. Para esta sobremesa, a escolha recaiu num Porto Sandeman Vintage 2000, um vinho sobre o qual Luís Sottomayor não teve qualquer intervenção, diz, já que na altura a empresa ainda não fazia parte do portefólio da Sogrape (que a adquiriu nesse ano), mas que elogia e, por isso, faz parte desta experiência.
Para finalizar, André Basto brincou com o Sandeman 30 anos Tawny e depositou-o nos três bombons que chegam à mesa com o café (ou o chá, caso prefira terminar assim a refeição). Luís Sottomayor lembra que os portugueses não valorizam o Porto e que este "não é bebido como deve ser bebido". E brinca: "Costumo dizer que é um vinho 'torna-viagens', levamos um Porto para casa dos amigos e passado meio ano volta para nossa casa." O apelo é para que se aprecie um Porto.
Para o enólogo e o chef o balanço desta noite, que foi sendo registada por uma equipa fotográfica, não podia ser melhor. No final, o sommelier da casa pede a Luís Sottomayor que assine algumas das garrafas que poderá vender. Afinal, são muitos os clientes que compram os vinhos que ali provam para levar para os seus países. Em média, orgulha-se Eduardo Amaral, vende-se uma a duas garrafas de Barca Velha por ano.
A Fugas esteve no Algarve a convite do Tivoli Marina Vilamoura