França: o som e a fúria ecoaram nas últimas horas da campanha eleitoral
A incerteza e radicalismo do discurso político reflectiu-se em tensão máxima na sociedade francesa. Todos já só pensam no que vai acontecer no dia seguinte às eleições.
Com as últimas sondagens a mostrar a União Nacional mais longe da maioria absoluta na segunda volta das eleições em França — mas também o risco da ingovernabilidade e de grande tensão social — as últimas horas da campanha eleitoral ficaram marcadas por declarações dramáticas dos principais candidatos e muita agitação na sociedade civil.
Num último esforço para fazer vingar a “barragem republicana” contra o partido de Marine Le Pen e Jordan Bardella, o Juntos de Emmanuel Macron e a Nova Frente Popular (França Insubmissa, socialistas, ecologistas e Movimento Democrático) foram-se desdobrando em sinais de que há futuro para além de domingo e que o país não ficará ingovernável nem está condenado a ter um governo radical de “som e fúria” — palavras de François Ruffin, um proeminente deputado eleito pela França Insubmissa que rompeu com o partido e chamou ao seu líder, Jean-Luc Mélenchon, um "obstáculo".
O presidente do MoDem, François Bayrou, recomendou a composição de um “governo de compreensão republicana fora dos extremos” — isto é, sem União Nacional e sem a França Insubmissa — para apaziguar a França. “Se evitarmos a maioria absoluta na UN no próximo domingo, teremos que trabalhar com inteligência. Chegou a hora da democracia parlamentar”, declarou por seu lado o republicano Xavier Bertrand.
Mas o mais importante agora é impedir a União Nacional de chegar à maioria absoluta. O socialista do Praça Pública Raphaël Glucksmann avisou que "a maioria absoluta da União Nacional não está absolutamente descartada” e que nada está resolvido apenas com a estratégia de concentração de candidaturas.
A partir de domingo, “o poder estará ou nas mãos de um governo de extrema-direita, ou o poder estará no Parlamento”, resumiu Gabriel Attal, o primeiro-ministro macronista, depois de avisar que “uma maioria dominada pela extrema-direita e pela UN seria perigosa”, com “muita violência na sociedade” e “um desastre para a economia”.
Em sentido oposto, Jordan Bardella, o presidente da UN, atirou ao Presidente Emmanuel Macron e pediu “uma oportunidade” para governar em maioria. “Não quero que o meu país continue bloqueado enquanto o mundo avança. Não podemos perder mais três anos [o que falta para o mandato de Macron terminar]”, disse no canal France 2 na quinta-feira à noite."Eu sou o único a poder ter uma maioria absoluta, portanto permitam-me fazer avançar o país”, apelou, sem nunca dizer o que fará se não tiver essa maioria.
À pressão máxima na cena política correspondeu um clima de tensão na sociedade civil. A campanha eleitoral para esta segunda volta foi marcada por ataques e violência contra candidatos, ameaças da ultradireita e muitos comunicados da sociedade civil a apelar ao voto contra a União Nacional. Esta sexta-feira, o ministro do Interior contabilizou 51 ataques físicos a candidatos e activistas e mais de 30 prisões “de perfis muito diferentes".
Confessando que “temia excessos no domingo”, Gérald Darmanin anunciou terem sido mobilizados 30 mil polícias e gendarmes, cinco mil na zona de Paris e subúrbios. Um sistema especial de manutenção da ordem, cujo nível dependerá da situação, permanecerá em vigor “pelo menos até 16 de Julho”, disse uma fonte policial à AFP. Para mais, a França vive as últimas semanas antes do arranque dos Jogos Olímpicos de Paris, que começam a 26 deste mês e já foram alvo de ameaças terroristas.