Partido Trabalhista a caminho de uma vitória esmagadora nas eleições britânicas
Primeiras projecções atribuem 410 deputados ao Labour e 131 ao Partido Conservador, no poder há 14 anos. Starmer será primeiro-ministro e tories podem ter pior resultado de sempre.
As sondagens à boca das urnas divulgadas esta quinta-feira à noite dão uma vitória esmagadora do Partido Trabalhista nas eleições legislativas britânicas. De acordo com as primeiras projecções, o partido de centro-esquerda, liderado por Keir Starmer, deve eleger 410 deputados. Nas últimas eleições, os números das sondagens foram muito aproximados dos resultados finais. Os votos vão ser contados pela noite fora e os resultados de cada um dos 650 círculos eleitorais vão ser declarados durante a madrugada de sexta-feira.
O Labour está, assim, muito próximo de regressar ao poder no Reino Unido pela primeira vez desde 2010 e Starmer de se tornar o primeiro chefe de um governo trabalhista desde Gordon Brown (2007-2010).
Confirmando-se a eleição deste número de deputados, o Partido Trabalhista poderá atingir uma maioria de 170 membros na Câmara dos Comuns do Parlamento de Westminster. Em 1997, o antigo primeiro-ministro trabalhista Tony Blair conseguiu uma maioria de 179 deputados e elegeu 418 deputados.
“A todos os que fizeram campanha pelo Labour nestas eleições, a todos os que votaram em nós e depositaram a sua confiança no Partido Trabalhista transformado – obrigado”, escreveu Starmer no X (antigo Twitter), pouco depois de conhecidas as primeiras projecções.
Em sentido inverso, o Partido Conservador, que governa o país há 14 anos e que é liderado desde 2022 pelo primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, só deve conseguir eleger 131 deputados. Trata-se de uma queda a pique, tendo em conta que, nas últimas eleições, realizadas no final de 2019, quando eram liderados por Boris Johnson, os tories conseguiram eleger 365 deputados. É, na verdade, o pior resultado de sempre dos conservadores em eleições legislativas.
Segundo as sondagens à boca das urnas, os Liberais Democratas devem ficar na terceira posição, com 61 deputados, seguidos do Reform UK (13), do Partido Nacional Escocês (dez), do Plaid Cymru (quatro) e do Partido Verde (dois).
Os LibDems, de Ed Davey, conseguem uma boa recuperação, depois de só terem elegido 11 deputados em 2019, e os independentistas escoceses, liderados por John Swinney, vêem confirmados os piores receios: elegem menos 38 membros para o Parlamento nacional e terão (ainda) mais dificuldades em cumprir a promessa de realizar um novo referendo à independência da Escócia.
Para além do desgaste de 14 anos de governo, da crise económica dos últimos anos e da campanha eleitoral desastrosa, o Partido Conservador parece ter perdido muitos votos para o partido populista e de direita radical de Nigel Farage, que entra pela primeira vez para o Parlamento, e logo com 13 deputados. Prova disso foram os resultados declarados nos primeiros dois círculos eleitorais da noite: tanto em Houghton e Sunderland South, como em Blyth e Ashington, vencidos pelo Partido Trabalhista, o Reform UK ficou em segundo lugar, ultrapassando os candidatos conservadores.
Farage, o político eurocéptico, nacionalista e anti-imigração que desempenhou um papel importante no processo do que culminou no referendo do “Brexit”, e que entrou na corrida já durante a campanha, deve ser eleito deputado à oitava tentativa, segundo as sondagens à boca das urnas.
Demissão à vista?
Este resultado deixa Rishi Sunak numa posição muito fragilizada e é expectável que o primeiro-ministro renuncie ao cargo de líder dos tories nas próximas horas. Mesmo antes da votação, o primeiro-ministro conservador já era criticado por várias facções do seu partido, nomeadamente por pessoas próximas dos ex-primeiros-ministros Boris Johnson e Liz Truss. A Times Radio diz que Sunak pode anunciar a demissão já na sexta-feira de manhã.
“Acho que era praticamente impossível os conservadores ganharem esta eleição depois de terem estado no poder durante tanto tempo. A culpa não foi toda de Rishi Sunak. Claro que poderiam ter alcançado outro resultado se não tivessem tido este historial recente de lutas internas e de serem vistos como corruptos e desonestos por uma parte do eleitorado”, diz ao PÚBLICO Elinor Goodman, jornalista e analista política.
“Mas se o Partido Trabalhista não se tivesse deslocado para o centro político, também não teria ganho. A verdade é que as pessoas queriam uma alternativa, particularmente tendo em conta que a economia tem estado tão mal”, acrescenta, à margem de um evento sobre a noite eleitoral na universidade London School of Economics, em Londres.
À medida que os círculos forem declarando os seus resultados durante a madrugada de sexta-feira existe a expectativa de se perceber quem são os deputados conservadores eleitos – os nomes dos possíveis candidatos à sucessão do primeiro-ministro devem vir dessa lista e há muitos actuais ministros, como o ministro das Finanças, Jeremy Hunt, ou o ministro da Defesa, Grant Shapps, em risco de perderem o seu lugar no Parlamento.
O Partido Trabalhista parece ter reconquistado uma boa parte dos círculos das antigas regiões operárias do Norte e Centro de Inglaterra que tinha perdido para os tories nas eleições de 2019. O partido chega ao poder numa altura em que Reino Unido continua a tentar recuperar de uma crise financeira influenciada pela saída da União Europeia, em 2020, pela pandemia de covid-19 e pela guerra na Ucrânia.
Eleito em 2020 para o lugar de Jeremy Corbyn, que em 2019 tinha guiado o Labour ao seu pior resultado em legislativas desde 1935, Keir Starmer levou a cabo uma reorientação ideológica o partido para o centro.
Segundo Goodman, a “exigência” será “enorme” para o Labour e para Starmer, não por causa da crise económica, mas principalmente porque os trabalhistas fizeram uma campanha “baseada na ideia de que iam transformar o país” – mesmo tendo oferecido “poucos “pormenores” sobre as suas propostas políticas “para não assustarem a classe média”, nota a jornalista.
Com os resultados previstos para estas eleições, dando uma maioria ao centro-esquerda, o Reino Unido contraria a tendência dos últimos meses eleitorais na Europa, de viragem política à direita e, como no caso de França, à extrema-direita. A entrada do Reform no Parlamento mostra, no entanto, que o país não está imune ao fenómeno.