Governo propõe redução gradual de IRC para chegar aos 15% em 2027
Conselho de Ministros aprovou um conjunto de medidas para promover o “crescimento e capitalização das empresas”, que inclui a proposta ao Parlamento de reduções graduais de IRC.
O Governo de Luís Montenegro aprovou na reunião do Conselho de Ministros desta quinta-feira o programa “Acelerar a Economia”, que contempla 60 medidas destinadas a apoiar o crescimento das empresas, com o objectivo de competirem com concorrentes estrangeiros nos mercados internacionais.
O pacote inclui uma proposta ao Parlamento para reduzir a taxa de IRC de forma gradual ao longo dos próximos três anos, dos actuais 21% para 15% até 2027 (primeiro, para 19% em 2025; depois, para 17% em 2026; e, por último, para 15% em 2027).
O programa inclui ainda a possibilidade de as empresas com um volume de facturação até aos dois milhões de euros por ano poderem aderir ao regime de IVA de caixa, quando, por agora, só as empresas com uma facturação até 500 mil euros podem beneficiar destas regras, que permite não entregar o IVA ao Estado quando facturam mas apenas quando recebem dos clientes, com um limite de 12 meses.
O Governo também aprovou uma redução dos prazos de pagamento do Estado aos fornecedores até 30 dias; e a possibilidade de os aforradores que queiram apoiar PME através de todas as operações de capitalização de empresas deduzirem no IRS, a partir de 2025, uma fatia dos dividendos e mais-valias realizadas, quando, por enquanto, só é possível deduzir quantias relacionadas com operações de recapitalização de empresas com insuficiência de capitais próprios.
A expectativa do Governo é a de que o pacote gere condições para as empresas crescerem e pagarem “melhores salários”, afirmou o primeiro-ministro, Luís Montenegro, na conferência de imprensa que se seguiu à reunião do Conselho de Ministros.
Algumas das medidas são sectoriais e destinam-se às áreas em que o Governo acredita que o país pode ser mais competitivo, disse o líder do executivo, exemplificando com o sector do turismo, onde serão reforçados os apoios à formação e qualificação do capital humano. Outros sectores de actividade em que o país tem oportunidades de crescimento são o agro-alimentar e as indústrias da defesa, disse Montenegro. O programa também inclui medidas para estimular e proteger a inovação portuguesa. É “um primeiro passo”, uma “primeira onda de medidas” para executar nos próximos meses, para ajudar a economia a ter maiores níveis de produtividade e competitividade, acrescentou o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento.
IRC e perda de receita
Em relação à redução do IRC, o que o Governo faz é apresentar uma proposta de lei ao Parlamento, porque, tratando-se de uma alteração na tributação, só os deputados podem decidir se a descida da taxa avança.
Actualmente, as micro, pequenas e médias empresas e as empresas de pequena-média capitalização já beneficiam de uma taxa reduzida de IRC (de 17%) sobre a primeira fatia dos lucros (relativamente aos primeiros 50 mil euros de matéria colectável) e, para esta franja, o Governo também quer baixar a carga fiscal, reduzindo a taxa de forma gradual, ao longo de três anos, dos actuais 17% para 12,5%.
Para justificar a descida da taxa geral do IRC até aos 15%, Miranda Sarmento citou uma análise do Fundo Monetário Internacional (FMI) que identifica vantagens na descida da carga fiscal sobre as empresas e ainda as conclusões de um estudo recente da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), coordenado pelo economista Pedro Brinca, que calcula existir um efeito irradiador na economia se a taxa de IRC baixar para todas as empresas, conduzindo a um maior crescimento económico, a uma melhoria no consumo interno e a uma subida mais significativa dos salários dos trabalhadores.
O ministro das Finanças não citou, porém, a parte do estudo em que os economistas sublinham que uma reforma destas exigirá sempre compensações da perda de receita, pelo facto de a descida não se pagar a si própria.
Confrontado pelos jornalistas sobre o impacto orçamental, Miranda Sarmento lembrou que o PSD já tinha previsto que a medida implica uma perda directa de receita fiscal na ordem dos 500 milhões de euros por ano, mas sublinhou que aí não estão contabilizados “efeitos indirectos” que geram um efeito positivo na receita. E disse que a “discussão orçamental vai muito para lá do IRC”.
Directiva das multinacionais
Além da redução gradual do IRC, o Governo também confirmou a transposição para a legislação nacional da directiva europeia que implementa a aplicação do IRC mínimo de 15% sobre os lucros das grandes empresas multinacionais (com receitas iguais ou superiores a 750 milhões de euros), resultado do acordo fiscal internacional subscrito por mais de 130 jurisdições no âmbito do chamado “Quadro Inclusivo” da OCDE e G20.
Portugal já devia ter transposto a directiva até 31 de Dezembro de 2023, mas o anterior Governo demorou alguns meses a preparar a transposição e, como até à queda do Governo de António Costa não o chegou a fazer, acabou por deixar passar o prazo de transposição, o que já levou a Comissão Europeia a abrir um processo de infracção contra ao Estado português por incumprimento do direito europeu.
Durante a conferência de imprensa, Miranda Sarmento sublinhou o facto de Portugal estar a transpor a directiva com atraso, mas enganou-se na data-limite, assumindo que o Estado deveria tê-lo feito até ao final de 2022 e dizendo que há “um ano e meio de atraso”, quando a referência de 2022 foi a da aprovação da directiva europeia (a 14 de Dezembro de 2022).
Regulamentar IRS de 20% para cientistas
Durante a conferência, o ministro das Finanças também foi obrigado a explicar declarações que prestou ao jornal britânico Financial Times, a quem anunciou que o Governo pretende aplicar uma taxa de 20% sobre os rendimentos ganhos pelos trabalhadores qualificados que decidam mudar-se para Portugal.
O anúncio da medida fazia crer que o Governo iria propor ao Parlamento uma iniciativa legislativa para reintroduzir a taxa única de IRS de 20% do Regime dos Residentes Não Habituais, mas, afinal, o que o Governo quer fazer é apenas regulamentar uma medida que já existe — lançada por impulso do anterior Governo de António Costa — e que já prevê a possibilidade de os trabalhadores qualificados na área da investigação científica beneficiarem desta medida. O que o executivo pretende é apenas regulamentar por portaria o “Incentivo fiscal à investigação científica e inovação” (já existente no Estatuto dos Benefícios Fiscais) para cobrir um conjunto mais alargado de profissões qualificadas que permitem o acesso ao incentivo fiscal no IRS. A taxa de 20%, confirmou Miranda Sarmento, irá aplicar-se apenas aos rendimentos do trabalho (categorias A e B).