A Internet é boa? Para todos, excepto para as mulheres jovens

O estudo, publicado na Nature, analisou a relação entre a internet e o bem-estar e concluiu que as jovens entre os 15 e os 24 anos têm experiências mais negativas na Internet.

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As jovens entre os 15 e os 24 anos são as que têm mais experiências negativas na Internet. Matilde Fieschi
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Navegar pela Internet traz o mesmo conforto de um passeio ao ar livre, concluíram Matti Vuorre, da Universidade de Tilburg, e Andrew Przybylski, da Universidade de Oxford, num estudo publicado na revista Nature. As pessoas que têm acesso à internet mostraram estar mais satisfeitas com as suas vidas e com o bem-estar físico, comunitário e social do que as que não têm Internet. Mais 8% satisfeitas, na verdade, mostram os autores, depois de analisarem dados de mais de dois milhões de pessoas de 168 países.

No entanto, o cenário é completamente diferente para as jovens entre os 15 e os 24 anos. Este grupo revelou ter mais experiências negativas e estar menos satisfeito com o local onde vive – ao contrário das pessoas que não usam Internet. “Isto pode dever-se ao facto de as pessoas que não se sentem bem-vindas na sua comunidade passarem mais tempo na Internet”, explica Przybylski. É por isso que “são necessários mais estudos para determinar se as ligações entre a utilização da Internet e o bem-estar são causais ou meramente associativas”, diz à Nature.

O estudo não explorou as causas deste resultado, mas os investigadores sublinham que esta conclusão vai ao encontro dos resultados de outros relatórios sobre o “aumento do cyberbullying e associações mais negativas entre a utilização das redes sociais e os sintomas depressivos”. Ao El País, Andrea Vizcaíno, psicóloga e CEO da Policlínica Maio, defende que as redes sociais são a raiz do problema, uma vez que “incentivam a comparação social, especialmente entre as jovens mulheres. Ver imagens de outras pessoas cuidadosamente seleccionadas e editadas podes levar a sentimentos de inadequação e baixa auto-estima. A exposição constante a padrões de beleza irrealistas par as mulheres contribui para diminuir o bem-estar emocional e para uma percepção negativa do ambiente”.

Este é o primeiro estudo a analisar a relação entre a internet e o bem-estar em grande escala. “Existem estudos sobre isso, mas a maioria foi em pequena escala em países ocidentais desenvolvidos, geralmente de língua inglesa. É um visual relativamente novo”, aponta Matti Vuorre. Os dados foram obtidos a partir da Gallup GWP World Poll.

Segundo um relatório da OMS, 15% das jovens foram vítimas de cyberbullying “pelo menos uma ou duas vezes nos últimos meses”, um ligeiro aumento desde 2018. Em Portugal, 7% das jovens com 15 anos dizem ter sofrido esta prática. “[Os efeitos do cyberbullying] podem contribuir directamente para uma percepção negativa do bem-estar da comunidade, pois as experiências de bullying podem fazer com que as vítimas se sintam isoladas e desconectadas da comunidade”, disse Vizcaíno ao El País.

Num relatório que avalia a saúde mental e o bem-estar, a OMS revela que 18% das raparigas com 13 anos e 20% das raparigas com 15 sentem-se sozinhas. Os valores são muito diferentes nos rapazes: nas mesmas faixas etárias, apenas 6% e 11%, respectivamente, sentem-se sozinhos.

No entanto, este estudo veio para mostrar que a Internet não é inteiramente “má”. Para avaliar o bem-estar, os investigadores guiaram-se por oito indicadores: satisfação com a vida; as experiências diárias negativas e positivas; bem-estar social; bem-estar físico; satisfação com o local de residência; e objectivos de vida. Quase 85% das respostas são positivas em todos os critérios.

O estudo assinado por Vuorre e Przybylski é publicado numa altura em que a Internet e as redes sociais começam a ser regulamentadas e o seu uso começa a ser debatido, especialmente nos jovens. O Governo brasileiro tentou dar início ao processo, mas não conseguiu. Já a União Europeia começou a dar os primeiros passos nesta atmosfera com a nova Lei dos Serviços Digitais, como noticiou o PÚBLICO. O Tik Tok é a rede que tem sofrido mais cortes, especialmente nos Estados Unidos. E Espanha aumentou a idade para abrir conta nas redes sociais, numa altura em que os jovens começam a entrar mais cedo no mundo digital.

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