Director do Hospital Al-Shifa denuncia tortura depois de libertado

Libertação de Mohammed Abu Salamiya provoca polémica e troca de acusações em Israel.

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Mohammed Abu Salamiya, director do Hospital Al-Shifa, foi libertado após sete meses preso por Israel Mohammed Salem / REUTERS
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O director do Hospital Al-Shifa na Cidade de Gaza, Mohammed Abu Salamiya, foi libertado esta segunda-feira por Israel, depois de sete meses de detenção em várias prisões israelitas, junto com um grupo de cerca de 50 prisioneiros palestinianos.

Foi detido em Novembro, depois de uma operação militar israelita no hospital, com Israel a alegar que o Hamas utilizava o hospital como centro de comando e que não era possível que o seu director não tivesse conhecimento disso, algo que sempre negou. Abu Salmiya diz que foi presente a tribunal três vezes mas nunca acusado formalmente – o que fez de si “um prisioneiro político”.

Abu Salmiya afirmou ainda que não teve acesso a advogado e que não houve qualquer visita de instituições internacionais ao seu grupo de prisioneiros antes da libertação. Mais, acusou Israel de tortura e de negar alimento aos prisioneiros palestinianos, que sofreram perdas de peso de até 30 kg, disse.

Os prisioneiros eram sujeitos a maus tratos numa base diária pelo pessoal das prisões, incluindo pessoal médico e de enfermagem, acusou ainda Abu Salmiya, que falou a jornalistas em Khan Younis, Sul da Faixa de Gaza.

Recentemente, foi anunciado que um clínico que chefiava o departamento de ortopedia também do Hospital Al-Shifa, Adnan al-Bursh, e que estava preso na prisão israelita de Ofer, na Cisjordânia, morrera a 19 de Abril.

Antes, em Novembro, um outro médico de Gaza, Iyad Rantisi, que dirigia uma unidade para mulheres numa parte do hospital Kamal Adwan em Beit Lahia foi morto, segundo o diário Haaretz, durante um interrogatório dos serviços de segurança interna de Israel (Shin Bet).

A operação militar israelita contra o hospital Al-Shifa na Cidade de Gaza – o maior hospital do território – e de outras unidades de saúde foi um dos grandes temas de discussão em termos de respeito (ou desrespeito) do direito internacional humanitário por parte das forças israelitas. Israel alegou que havia utilização do hospital como centro de comando do Hamas, mas não forneceu provas suficientes, uma avaliação partilhada por organizações humanitárias como a Human Rights Watch e media como o diário norte-americano The Washington Post. Como os hospitais têm estatuto protegido pelo direito internacional, muitas pessoas refugiaram-se à volta de unidades de saúde.

Ao contrário, media israelitas como o Haaretz, que visitaram o hospital acompanhando militares israelitas, dizem que não havia dúvidas de um túnel sob o hospital que servia o Hamas. Medias israelitas lembram ainda imagens das câmaras do próprio hospital no dia 7 de Outubro (o dia do ataque do Hamas contra Israel) que registaram dois reféns (um nepalês e um tailandês) a serem levados para o hospital, e ainda a acusação do Exército de Israel de que foi no local que a militar Noa Marciano foi morta (o seu corpo foi recuperado pelas forças israelitas perto da unidade de saúde).

E, por isso, a libertação de Mohammed Abu Salamiya deu origem a uma troca de acusações entre responsáveis das prisões e dos serviços de segurança e do Exército, e ainda políticas.

Os serviços prisionais disseram estar a ser “forçados” a revelar a ordem de libertação, divulgando um documento assinado por um militar das Forças de Defesa de Israel (IDF; na sigla em inglês). “Contrariamente a falsas alegações (….), quem tomou a decisão de libertar o director do Hospital Al-Shifa foram as IDF e o Shin Bet — e não os serviços prisionais”.

O Shin Bet disse ter sido obrigado a libertar dezenas de detidos da Faixa de Gaza para encontrar espaço para “terroristas mais significativos”, cita o Times of Israel, lembrando que há um ano que os serviços alertam para a falta de espaço para detidos. Numa entrevista à revista norte-americana New Yorker, a directora executiva da ONG PCTAI (Public Committee Against Torture in Israel) Tal Steiner diz que desde 7 de Outubro há quase 10 mil detidos palestinianos em prisões israelitas e que os números de mortes relatados nos serviços (por organizações não governamentais), 27 entre detidos de Gaza e 10 da Cisjordânia, são sem precedentes”.

O ministro do Interior, Itamar Ben-Gvir, de extrema-direita (e que tutela os serviços prisionais), criticou a libertação.

Mas também o antigo membro do gabinete de guerra Benny Gantz, assim como o centrista Yair Lapid foram muito críticos em relação à acção. Gantz disse que quem decidiu libertar “os que albergaram os assassinos de 7 de Outubro e ajudou a esconder” reféns israelitas “cometeram um erro operacional moral e ético”, enquanto Lapid sublinhou o “caos”: “o ministro da Defesa ‘não sabia’, o ministro da segurança nacional ‘não esteve envolvido’”, declarou Lapid, dizendo que a situação é uma “desintegração moral e funcional”.

O gabinete do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, anunciou que ordenou “um inquérito imediato”.

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