A “essência” de Ventozelo precisa de tempo

Uma prova vertical deu a mostrar o percurso da Quinta de Ventozelo sob a mão da Granvinhos. Em dez anos, o produtor duriense foi capaz de criar vinhos cheios de personalidade e categoria.

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O tinto Essência 2014 está para durar, mas neste momento está numa forma irresistível. DR
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Já havia provas mais do que suficientes para se determinar que os Essência de Ventozelo, os topos de gama tintos da casa, precisam de anos de guarda para se aprimorarem e brilhar. Nada de novo, estando em causa um vinho do Douro, com volume, fruta intensa e uma estrutura densa. Mas, e os brancos feitos à base da casta Viosinho? Bom, também aqui se pode (e deve) sublinhar que a ideia de que os brancos são brancos apenas enquanto jovens é um erro crasso. No caso dos Viosinho, o tempo de guarda ameniza-lhes, está certo, a fruta vivaz e reduz-lhe a sensação de mineralidade que exibem enquanto jovens, mas o tempo concede-lhes em troca uma textura e uma complexidade irresistíveis.

Dez anos depois, o CEO da Ventozelo, Jorge Dias, pode dizer sem receio que lhe “deu muito gozo fazer isto”. “Isto” foi encontrar um lugar para construir uma marca que desfizesse a noção que ainda hoje associa o grupo que preside, a Granvinhos, aos grandes volumes. Com a aquisição da enorme Quinta de Ventozelo, tudo ficou mais fácil. Logo nesse ano, em 2014, o enólogo José Manuel Sousa Soares tratou de identificar os melhores lotes para lançar o Essência. Depois vieram os monocasta, os vinhos de vinhas (vale a pena conhecer a do Colmeal) ou os Loci, um vinho com sensação de doçura recomendado em especial para os devotos da casta Tinta Amarela, com 50% do lote.

O Essência de 2014 (95 pontos) pode dizer-se que está agora na sua fase de confirmação. Conserva vestígios da fruta original, mas é nas texturas que deixa na boca que revela a sua excelência. É um vinho que interpela, cheio de subtilezas e sensações onde nada parece fora do lugar. Pode dizer-se que ainda está para durar, mas neste momento está numa forma irresistível. Um pouco ao contrário do Essência de 2015 (94 pontos), que, apesar de estar excelente, ainda parece ter um longo caminho a percorrer.

Pode-se dizer que o 2014 foi uma estreia auspiciosa. Por ser nesta fase da prova o vinho mais rico de sensações. Há que seguir com atenção as edições de 2016 (95 pontos), que se destaca pelo seu magnífico final, longo e tenso, o 2017 (94 pontos), que se impõe por uma nota mais austera que denuncia um domínio no lote da casta Touriga Francesa e o de 2018 (94 pontos), outra bela edição, com um perfil aromático com sugestões de bosque e flores. A mais recente edição no mercado (5000 garrafas, a 50 euros) é a de 2019 (93 pontos), que desta vez acusa uma exuberância no nariz mais associada às notas florais da Touriga Nacional. Em comparação, foi penalizado por estar numa fase indeterminada de evolução. Mas tem estrutura e perfil para crescer com o tempo, como as de mais edições do Essência.

Mais surpreendente foi a prova dos dez anos de colheitas do branco Viosinho, que é a maior marca de sucesso da Ventozelo – há rupturas de stock deste vinho todos os anos, o que levou a gestão da casa a investir em novas plantações com esta casta. A edição de 2014 (94 pontos), provada em formato magnum, está numa fase formidável. Notas apetroladas que nos levam ao limiar dos Riesling, erva seca, grande volume de boca e um final vibrante e fresco conferem-lhe um nível de complexidade magnífico.

Havemos de encontrar estes atributos na edição de 2017 (94 pontos). Nas notas apetroladas ainda numa fase incipiente, mas ainda mais no volume, na frescura cítrica e no seu belíssimo final de boca. Está cheio de garra, mas causa um grande dilema a quem o tiver na garrafeira: como abdicar do prazer de o beber desde já?

Se as edições do Viosinho de 2015 e 2016 (92 e 91 pontos, respectivamente) estão apenas boas, em 2018 encontramos o melhor vinho branco desta prova vertical. Começa a exibir as primeiras notas de oxidação, mas está ainda cheio de fruta e juventude. Na boca é denso e cheio de camadas, sempre ligadas por uma bela harmonia. Acaba longo, profundo e delicioso. É um branco de classe pura.

De viagem até à edição mais recente, a de 2023 (90 pontos), fica-se com a sensação de que há alguma coisa do fulgor inicial do Viosinho que se foi diluindo. No caso de 2023, a sua expressão aromática é mais curta e a vibração que provoca na boca, menor. Talvez porque na sua produção já entraram uvas das novas vinhas de Viosinho. Talvez porque na prova em questão se cumpra a velha profecia segundo a qual “a pior coisa que pode acontecer a um grande vinho é ser provado ao lado de um ainda maior”.

Como retrato final, fica uma certeza. A Quinta de Ventozelo partiu do zero e em dez anos foi capaz de criar vinhos cheios de personalidade e categoria.

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