Convergir e actuar para mais e melhor biodiversidade

Equilíbrio, integração e inovação. Foram palavras-chave da 6.ª edição da conferência “Gestão da Vegetação e Biodiversidade”, promovida pela E-REDES, que decorreu no Instituto Superior de Agronomia.

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Mesa-redonda (Ricardo Cabral, Rosário Oliveira, Nuno Sequeira e Selma Pena)

Em debate estiveram as melhores práticas, com vista à gestão da vegetação e à preservação da biodiversidade, na perspectiva de contribuir para um maior valor económico, ambiental e social, tornando o território mais resiliente aos incêndios rurais. A E-REDES, o Operador de Redes de Distribuição, é uma das entidades que maior intervenção tem desenvolvido nos diferentes ecossistemas que compõem o território, por via da dimensão da rede eléctrica que chega aos locais mais remotos. Actualmente, gere uma infra-estrutura com 179 mil quilómetros de extensão, com cerca de um terço de rede aérea de alta e média tensão em espaços florestais e agrícolas.

O presidente do Conselho de Administração da E-REDES, José Ferrari Careto, salienta que é fundamental encontrar caminhos para soluções sustentáveis e realça o papel desempenhado pela empresa. “Temos uma rede muito extensa que atravessa o território e que cumpre uma função muito importante no que diz respeito à coesão territorial, levamos electricidade aos espaços mais recônditos do país, através de linhas de baixa, média e alta tensão. Isso é algo de que nos orgulhamos muito e faz parte do nosso propósito enquanto empresa relevante no tecido empresarial português”, sublinha.

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Rosário Oliveira, Investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa Aleks Arkin?

Ter um território humanizado, em que seja valorizado o papel do pastor, do agricultor e do tutor florestal, em especial no interior de Portugal, é determinante para o futuro. A ideia é defendida pelo Secretário de Estado da Floresta, Rui Miguel Ladeira Pereira, também presente na conferência que se realiza pelo sexto ano consecutivo: “Em primeiro lugar estão as pessoas, a segurança, os desafios e o equilíbrio, nomeadamente das alterações climáticas, mas queremos também gerar riqueza e garantir que temos um país mais resiliente contra os incêndios com qualidade de vida para os cidadãos.”

Dos compromissos à acção

Todo o território abrange um conjunto distinto de realidades e a E-REDES procura soluções viáveis, como o estudo desenvolvido pelo ForestWise sobre ocupações compatíveis, para assegurar uma gestão de combustível, onde se garante a remoção de biomassa florestal para reduzir o perigo de incêndio, que seja eficiente para proteger as redes eléctricas, mas também que potencie a revalorização do capital natural nas faixas de forma adaptativa às ameaças climáticas actuais e emergentes.

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Ricardo Cabral, Co-Founder & Managing Partner, Spotlite Aleks Arkin?

Um tema central na intervenção de Rosário Oliveira, investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, que apresentou o estudo “Biodiversidade 2030. Nova Agenda para a Conservação da Biodiversidade em contexto de alterações climáticas em Portugal”.

A professora universitária lembra que “23% do território nacional é protegido”, mas o número deveria atingir legalmente os 30% da superfície terrestre e marinha. Uma meta que implica um conjunto de responsabilidades como gerir com eficácia a biodiversidade, com uma estratégia de financiamento adequada, quer para conservar quer para restaurar populações e ecossistemas degradados. Para responder a este desafio é necessário trabalhar com uma lógica de conectividade ecológica.

“É fundamental considerar diversos cenários climáticos, que incluem por exemplo as áreas protegidas, as alterações climáticas e a deslocação das espécies, para que a gestão e ordenamento do território, bem como o planeamento da conservação da natureza, possam ser realizados com base em contextos evolutivos”, de modo a antecipar o futuro. Rosário Oliveira lembra ainda a relevância quanto à intervenção nas denominadas faixas de combustível que devem ser implementadas em harmonia com estas mudanças.

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Nuno Sequeira, Vogal do Conselho Directivo do ICNF

A investigadora defende igualmente que a Estratégia Europeia de Biodiversidade 2030, deve promover a colaboração entre várias instituições e o intercâmbio de conhecimentos, numa perspectiva ampla de co-gestão.

Das “velhinhas” fotografias aéreas às imagens de satélite

Para uma gestão da vegetação e preservação da biodiversidade eficaz é fundamental uma “intervenção diferenciada” potenciada pela tecnologia. Ricardo Cabral, Co-Founder & Managing Partner da Spotlite, dedicada às imagens de satélite, assistidas por algoritmos de Inteligência Artificial, explica que os “dados actualizados com alta frequência permitem mapear as condições no terreno e podem ser transmitidos de forma muito imediata à equipa de operações”. Com as imagens de satélite consegue-se identificar de forma específica os habitats críticos e as áreas que é necessário proteger para salvaguardar espécies ameaçadas.

Nuno Sequeira, Vogal do Conselho Directivo do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), sublinha a importância de verificar as áreas e os momentos de intervenção. “Os conhecimentos e a capacidade de detecção remota, usada há muitos anos com as velhinhas fotografias aéreas até às actuais imagens de satélite de alta resolução, são ferramentas fundamentais que ajudam à maior eficácia e a poupar os recursos.”

Diferentes soluções e perspectiva integrada

As imagens de satélite também ajudam à detecção precoce e identificação dos movimentos dos incêndios, mas o problema é complexo. Em Portugal, uma das principais ameaças ao mundo rural e biodiversidade são os incêndios rurais pela frequência e severidade com que ocorrem. Nuno Sequeira alerta que é importante articular o conhecimento técnico e científico para uma melhor tomada de decisão, tendo por base uma eficaz fiscalização e legislação adequada.

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João Brito Martins, Administrador E-REDES

“Vamos ter um regulamento mais flexível e que confere mais flexibilidade às comissões sub-regionais de gestão integrada de fogos rurais, que vão dizer se na sua região e em determinados locais faz sentido a faixa daquela dimensão ou não, se realmente é preciso toda a zona ser tratada e por aí adiante”, refere.

Para o responsável “não há uma solução única, não há uma receita para resolver um problema complexo como é o caso dos incêndios rurais em Portugal e em outros países com o mesmo tipo de vegetação”.

Selma Pena, Investigadora do Instituto Superior de Agronomia e coordenadora do projecto SCAPEFIRE, propõe como estratégia para minorar os incêndios uma perspectiva “integrada e com diferentes soluções”. A especialista defende um território estruturado com usos que sejam mais resilientes aos incêndios para potenciar um mosaico na paisagem capaz de diminuir a progressão do fogo.

“A construção destas visões para o futuro é assente nesta lógica de que é importante identificar estruturas no território e perceber quais são os multiusos compatíveis e potenciar as mais-valias”, afirma. Uma ideia que se aplica também às faixas de gestão de combustíveis associadas às redes eléctricas, em que é importante reflectir sobre os melhores usos possíveis e alternativas sustentáveis.

“Convergir e actuar” com modelos de intervenção diferenciados

“Convergir e actuar”, é desta forma que a E-REDES pretende que o futuro se construa. No balanço da conferência, João Brito Martins, Conselho de Administração da E-REDES, sublinha três palavras-chave: equilíbrio, integração e inovação.

“Equilíbrio porquê? Porque temos de encontrar uma solução que permita equilibrar todas as variáveis e garantir qualidade de serviço, com os produtores alinhados para minimizar o impacto na biodiversidade, como sinónimo de bem-estar. Só vamos conseguir este equilíbrio com integração se todos nos juntarmos, como aconteceu aqui hoje e conseguirmos trazer o melhor que a academia tem, o mais recente que temos da investigação, com o melhor da inovação e da tecnologia que temos disponível e tem um potencial enorme”.

O tema da biodiversidade é crítico na estratégia da E-REDES, prosseguiu João Brito Martins. “Por isso temos um plano de acção que não tem como objectivo apenas mitigar o impacto, mas sobretudo procurar que seja positivo.” "E dá um exemplo: o facto de se fazer uma monitorização regular para garantir distâncias seguras entre a vegetação e as linhas, representa um forte contributo para a diminuição dos incêndios florestais."

No final de uma tarde de reflexão e debate, ficou expressa a importância da implementação proactiva de estratégias e modelos de intervenção diferenciados, ao invés de continuar a desperdiçar recursos e contribuir para a perda de biodiversidade, o que se traduz em valor acrescentado, evitando danos e custos significativos nas próximas décadas.

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