Ensinar para avaliar ou ensinar para aprender

Quem é professor já se viu muitas vezes a “falar chinês” para turmas onde nada daquilo que traz na sua agenda, planificação, programação, o que lhe queiram chamar, faz sentido e é oportuno.

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"A educação contribui, mas não é suficiente, para colmatar situações sociais e económicas frágeis" Rui Soares/Arquivo
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A questão das boas escolas, escolas com boas práticas, que ensinam aquilo que importa, aquilo que faz falta e que é avaliado, aquilo que conta para progredir, leva-nos até à sala de aula. Quem é professor já se viu muitas vezes a “falar chinês” para turmas onde nada daquilo que traz na sua agenda, planificação, programação, o que lhe queira chamar, faz sentido e é oportuno.

Certamente que muitos de nós, professores, já tivemos esta experiência. Ou seja, nada daquilo que o professor traz para a(s) aula(s) é o que aqueles alunos precisam. E a pergunta aparece: ensinamos para avaliar, e depois fazer o pino com a avaliação, para ter o tal sucesso, aqui entendido como notas positivas; ou ensinamos para proporcionar aos alunos aprendizagens significativas, que lhes sejam úteis num futuro próximo e simultaneamente duradouro?

Como gerimos as duas faces desta moeda difícil de concretizar, entre aquilo que está nas metas curriculares, nos manuais, ou seja aquilo que está estabelecido, ou aquilo que percebemos que aquela determinada turma/grupo precisa para poder progredir que não é (ainda ou de todo) aquilo que é formalmente prescrito, ou que se não está formalmente indicado, está implícito para que outras aprendizagens possam ser alcançadas?

Os professores sentem este dilema quase constantemente, se não de forma consciente, aparece sob a forma de avaliações episódicas ou de modo persistente, menos boas. E muitas vezes, nestas ocasiões, em que não conseguimos ter de volta aquilo que pretendíamos, baixamos a fasquia em determinados itens como seja o rigor, o cuidado com a utilização da linguagem própria da disciplina e a reflexão a partir da apropriação de conceitos.

A questão relevante em torno desta situação é: qual é a autonomia do professor e da escola, que ensina aquilo que faz falta no percurso do aluno e que não são esses conhecimentos que vão ser aferidos ou avaliados no final do ano ou do ciclo?

Quando os pontos de partida para todas as escolas, para os grupos/turma e para cada aluno não são os mesmos é preciso que o professor tenha a capacidade de se desmultiplicar em acções de aprendizagem que consigam fazer alcançar o incremento necessário em cada percurso de aprendizagem. Quando essas aprendizagens não são as supostas, lá se vai o tal sucesso educativo que é reconhecido pela sociedade em geral.

É necessário que cada aluno consiga cumprir o seu calendário de sucesso, de degrau em degrau, de etapa em etapa. Que o raciocínio se desenvolva e progrida em conhecimento e maturidade. Que consiga relacionar conceitos e transferir conhecimentos. Que perceba que a Revolução Industrial da disciplina de História é a mesma da Geografia.

Devemos seguir em frente a ensinar o que não faz qualquer sentido para um determinado grupo, ou, por outros caminhos chegar mais ou menos ao mesmo destino, às vezes um pouco ao lado, mas que o que os fazemos descobrir e que tem interesse e é maravilhoso e motiva a continuar? A resposta parece óbvia; se não fosse a avaliação. Avaliação do professor, que tem de garantir que abordou e avaliou determinados conteúdos e conhecimentos e dos alunos que os estudaram e foram sujeitos a avaliação.

Ensinamos para a avaliação ou para que os alunos aprendam? Quanto tempo já despendeu a pensar na relação entre o ensino e a aprendizagem? O que acontece nos entretantos destas duas acções? Parece, na realidade, não existir uma relação de causa-efeito. Isto é, os professores ensinam e os alunos aprendem. Considerando os diferentes pontos de partida, do ponto de vista social, económico, chegamos facilmente à conclusão que a educação contribui, mas não é suficiente, para colmatar situações sociais e económicas frágeis.

Para quando o passo seguinte, em que a autonomia contempla a diversidade e permite o acesso à continuidade de percursos educativos de sucesso, por exemplo, para o ensino superior? O sucesso educativo não deve ser, apenas, o sucesso das avaliações positivas segundo as metas formalmente instituídas. O sucesso tem, na realidade, várias medidas: a da escola, dos alunos e das famílias e dos professores. O ponto de intersecção é a medida que importa aos diferentes atores, e a avaliação das aprendizagens é um dos factores, mas não o único ou de maior importância para todos.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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