Diogo Novais Pereira: do restaurante dos pais a Chefe do Ano, ele sabe bem o que faz na cozinha do Porinhos

O Porinhos, em Arões, Fafe, existe há três décadas. O bom filho Diogo Novais Pereira a casa tornou, assim como à cozinha do restaurante que os pais abriram. E acaba de vencer o concurso Chefe do Ano.

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Aqui é tudo feito com "paixão", diz Diogo Paulo Pimenta
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“’O que é que tu estás a fazer?’ A pergunta era ‘O que é que tu estás a fazer?’” Na cozinha do Porinhos — agora rasgada para a sala, sempre em ebulição — entendem-se e completam-se duas gerações com diferentes interpretações do conceito de gastronomia. A da dona Albertina, com trinta anos desta casa e várias receitas da mãe e da avó, e a do filho Diogo Novais Pereira, que usa jaleca em vez de avental, distinção fresquinha de Chefe do Ano (na 35.ª edição do maior e mais antigo concurso português de cozinha), aprendiz de estrelados Michelin que não degenera — sai aos seus — no gosto por produtos bons e no prazer em ver diferentes gerações de clientes lambuzarem-se com os pratos de forno e a comida de tacho, a vitela, o frango e o bacalhau assados, as tripas e o coelho com batatinhas estufadas, os filetes com salada russa...

O que é que tu estás a fazer! Três anos depois de ter regressado a casa, ao restaurante dos pais, em Arões, freguesia de Fafe, Diogo já não ouve tantas vezes a exclamação da mãe, surpreendida pelos “métodos mais correctos” que o filho trouxe de “dez anos de mochila às costas a aprender”. “Ele é filho único. Isto é para ele”, comenta à Fugas Albertina, diárias quase despachadas. “A base é sempre minha, da avó dele. Ele depois dá-lhe um toque final.”

Diogo veio das grandes cozinhas. E “nas grandes cozinhas trabalha-se dessa forma. Há um método, há tempos e pontos de cozedura. É ajustar isso no dia-a-dia”, explica Diogo Novais Pereira, que naturalmente discorre sobre a sua paixão. O tempo “justo” de cozinhar o bacalhau, o percurso do feijão até ser pousado a repousar no forno de lenha para largar a goma toda e ligar as tripas, os caldos feitos com as aparas e os ossos da vitela e do porco, os “bons refogados” com especiarias tostadas. “Eu é que me adaptei a eles e à forma deles trabalharem. Depois, onde via que podia corrigir, corrigi. Dávamos um passo em frente e consolidávamos. ‘Óptimo, vamos dar outro!’ E foi assim tanto nos pratos como na sala, nos serviços, na carta de vinhos e na perspectiva daquilo que é o atendimento e o serviço. Almoçamos no final, todos juntos. E é aí, à mesa, que partilhamos as coisas. O que eu vou vendo no serviço, que podia ser mudado, digo à mesa. Ao jantar já aplicamos.”

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Diogo Novais Pereira com os pais, Albertina e Joaquim Pereira paulo pimenta

Diogo, 33 anos — até parece a soma do tempo que ele e os pais têm de Porinhos —, nasceu em Guimarães e cresceu no restaurante, cujo espaço tinha sido um stand (“a cozinha era ali um quadradinho”, aponta a mãe). “Tomávamos o pequeno-almoço no restaurante, vínhamos da escola, pousávamos a mochila e vínhamos para o restaurante, fins-de-semana no restaurante, férias no restaurante... Em casa, toda a gente sabe cozinhar, cada um na sua linha. Sempre comi assim. Como estamos a comer hoje. Frango assado no forno, sequinho, mas saboroso e suculento, Tripas, vitela assada, cabritinho, bacalhau no forno ou recheado... Sempre pratos gulosos. Eu era mais comer.”

Diogo “fazia sala” e de manhã dava “uma mão” na cozinha, nas “coisas mais básicas”. “Sentia-me bem, dar a volta aos assados, cozinhar com calma, entusiasmava-me mais do que o trabalho de sala.” Não se falava em formação. “Formávamo-nos uns aos outros.” Até que conheceu a Escola de Hotelaria e Turismo do Porto e percebeu que “não sabia rigorosamente nada”. Não sabia o que era picar uma cebola ou o que era fazer um corte. “Nem sabia que os cortes tinham nome. Era mesmo um analfabeto de cozinha.”

Aplicou-se. Estudou — continua a comprar livros para a sua biblioteca. Actualiza-se. “A cozinha é cíclica. Nós só vamos melhorando as técnicas e procurando ter mais saúde”, conclui o chef, que começou por estagiar com Rui Paula no ano em que abriu o DOP (“aprendi tanto...”), antes de voltar à Escola (onde fez o nível cinco), de trabalhar com Diego Guerrero, no El Club Allard, em Madrid (“abriu-me a cabeça de uma maneira brutal”) e de conviver na cozinha do Oficina com Marco Gomes, chef que lhe pôs “sabor nas coisas”.

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"Eu é que me adaptei a eles e à forma deles trabalharem" Paulo Pimenta

Como chef executivo do My Story Hotel Rossio, em Lisboa, aprendeu “muito, muito de gestão”, mas pesou mais a emoção na hora de voltar ao Norte. “Vim a casa no Dia da Mãe dar uma mão e a minha mãe, a pegar numa assadeira, já não podia mais, doía-lhe os braços, os ombros, as pernas... Nesse dia, cheguei a Lisboa e disse que me ia embora. ‘Eles não podem continuar ali a matar-se sem ajuda.’” Casou-se, ajustou a vida pessoal e adaptou-a à profissional.

“Eles esforçaram-se tanto a vida toda... Desde a minha avó. Da mercearia aos petiscos, dos petiscos aos almoços, dos almoços aos jantares. Ia-se perder um restaurante assim? E eu sabia que o restaurante era bom, que tinha identidade, que as coisas já funcionavam. Só precisava de ser actualizado.”

Entre o deve e o haver, claro que “há coisas inegociáveis” nesta cozinha, que é uma mistura fina, o melhor de dois mundos. Haverá sempre a vitela assada de Fafe e restantes pratos carnudos, o tomate coração de boi, as alfaces, as cebolas das mondas, os cantarelos, os espargos, as ervilhas de quebrar e as favas. “Sou minhoto! Temos aqui grandes produtos”, repete o chef de uma cozinha “exigente” e de um “restaurante familiar para toda a gente”.

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Os canelones de repolho e o arroz de forno de cogumelos Paulo Pimenta

“O meu objectivo é que o restaurante seja uma referência. Aqui, as coisas são feitas com emoção.” Fala-se em demi-glace e em reduções, em caldos vegetais para os arrozes (“esta cozinha é 60/70 por cento vegetal”), confecciona-se um arrozinho de forno de cogumelos e uns canelones de repolho para os vegetarianos (“É refeição para uns, guarnição para outros”) e Diogo Novais Pereira, o chef, vai refinando o seu estilo e método e vincando a identidade gastronómica do Porinhos, que nunca alteraria o ADN à procura de uma estrela. “Que esse reconhecimento chegue... Agora eu mudar para lá chegar...”

O pai, o “senhor Pereira” dirige a sala como um croupier. Vai a Angeiras à quinta-feira, dia de peixe fresco na lista, e tem o seu retrato no vinho verde da casa, um dos produtos que têm vindo a merecer uma atenção redobrada nos últimos anos. As referências na garrafeira vão surgindo organicamente, já há pão de massa-mãe (que no fim da refeição serve para rapar o prato) a juntar à broa de milho de forno de lenha e a manteiga foi substituída por um azeite local “bom e versátil” (“então o meu pai escolhe o bacalhau, corta-o, demolha-o e eu vou estragar tudo com um azeite qualquer?”), que também é ingrediente na mousse de chocolate.

Antes de se juntar à conversa, Albertina aqueceu mais uma vez o ferro do leite-creme “da avó” nas brasas do fogão a lenha. “Não sobrou nada.”

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