A inesquecível ilha do Fogo
“Do cume da montanha, a vista de 360 graus é estupenda e faz esquecer as dificuldades da subida”, escreveu o leitor Helder Taveira, que subiu à cratera do vulcão da ilha cabo-verdiana.
Depois de conhecermos várias ilhas do arquipélago de Cabo Verde, chegou a hora de irmos à ilha do Fogo.
A viagem foi tranquila, contudo, o mar estava um pouco agitado e algumas pessoas acabaram por ficar indispostas. Depois de quatro horas de barco, com saída da ilha de Santiago, aportámos bem junto a São Filipe, a cidade principal do Fogo. Já tínhamos à nossa espera o Elias Lopes, que seria o nosso motorista e guia na subida da montanha.
A ilha, que deve o seu nome às constantes erupções que ao longo dos tempos a assolaram, foi uma agradável surpresa. Fomos directamente para a Chã das Caldeiras, situada em pleno parque natural, onde iríamos ficar alojados, numa viagem que durou quase duas horas, e pelo caminho fomos apreciando a beleza em redor. À medida que nos aproximávamos da Chã das Caldeiras, ficámos fascinados pela imponência da montanha, adivinhando já a dificuldade que seria subi-la.
Ficámos hospedados na Casa Marisa, pequeno hotel com vários alojamentos individuais, construídos à semelhança da casa típica da ilha do Fogo, de nome funko, casas de construção circular feitas de basalto e cobertas de folhas.
No sopé da montanha do Fogo fica a tão aguardada Chã das Caldeiras. Aqui produz-se bom vinho. O Manecon é o vinho mais popular na comunidade local e o vinho Chã, bem mais recente, é muito agradável para acompanhar um bom peixe. A última erupção do vulcão, em 2014, causou grandes problemas, com a lava a cobrir grandes extensões de vinha, mas com trabalho duro e resistente da gente da ilha fez-se as videiras renascer das cinzas.
A montanha e o vulcão são, sem dúvida, o motor de desenvolvimento da ilha. Se o vulcão causa grande sofrimento e prejuízo às pessoas, é também uma grande fonte de riqueza, ao atrair turistas, amantes da natureza que cada vez mais e em maior número chegam a esta ilha.
A subida à montanha da ilha do Fogo, para ver a cratera do vulcão, foi uma experiência única e inesquecível. Saímos cedinho, pelas 6h30, com o sol a nascer e a dar uma cor alaranjada às rochas que ladeiam a Chã das Caldeiras, a fazer-me lembrar o nascer do sol na Garganta do Todra, em Marrocos.
Logo no início da subida, e quando passávamos junto de uma casa humilde, uma grande panela cheia de água já fervia. O porco estava prestes a entregar a carne ao criador. Numa economia de subsistência, a criação do porco para consumo é uma forma de equilibrar o magro orçamento familiar.
Na subida passamos pelos vinhedos onde se produz o vinho Chã. No sopé da montanha, para nosso espanto, vimos que aqui se cultivam feijões e produzem papaias, figos, maçãs e até limões.
Depois de 3h30 sempre a subir, mas com algumas paragens para admirar toda aquela envolvência, alcançar o ponto mais alto do arquipélago (2829 metros) foi gratificante.
Do cume da montanha, a vista de 360 graus é estupenda e faz esquecer as dificuldades da subida. Com a ajuda do excelente guia, Elias Lopes, a subida tornou-se mais fácil. É verdade que tem alguma dificuldade, mas é, sem dúvida, acessível à grande maioria dos amantes das caminhadas. Na subida, conhecemos um casal francês, ambos já com mais de setenta anos e que não tiveram grandes dificuldades em chegar ao topo. A descida foi bem mais rápida do que a subida. O deslizar pela cinza vulcânica foi agradável e muito divertido.
Uma visita pela Chã das Caldeiras, com tempo para conhecer muitas pessoas simpáticas e humildes que nos abordam de forma acolhedora. Foi tempo de deixar uma bola para as crianças brincarem.
No dia de regresso a Santiago, novamente com o Elias, demos a volta à ilha. Passámos pela zona dos Mosteiros, um vale fértil de boa fruta e onde se produz o melhor café da ilha, com um sabor inigualável.
Faltava apenas conhecer São Filipe, a capital do Fogo, a cidade mais importante da ilha e a terceira de Cabo Verde em termos populacionais, que constitui o aglomerado populacional mais antigo de Cabo Verde depois da Ribeira Grande, actual Cidade Velha, na ilha de Santiago.
O conjunto histórico-patrimonial de São Filipe consta já na Lista Indicativa de Cabo Verde, entregue na UNESCO desde 2004/2005, constatando-se, contudo, uma certa descaracterização do seu centro histórico, com algumas construções. Apesar disso, apresenta-se limpa, com jardins bem desenhados e floridos, sendo um local de encontro, onde tudo acontece e flui para o resto da ilha. Na praça principal, virada para o mar, ainda são visíveis monumentos alusivos aos descobridores portugueses e outros que tiveram importância no desenvolvimento da ilha. Cidade com vida e gente genuína! Muito próximo fica o porto de onde partem os barcos para as outras ilhas.
A viagem de regresso a Santiago foi bem mais agitada: ondas grandes batiam no barco, abanando-o, foi um pouco assustador. Foram cerca de quatro horas de luta das ondas contra o barco e muitas pessoas em sofrimento com toda aquela agitação. Só sossegámos quando atracámos no Porto da Cidade da Praia.
Em frente a São Filipe fica a ilha Brava. Será a nossa próxima visita, se tivermos coragem para enfrentar o mar, que neste local é ainda mais difícil do que a viagem para a ilha do Fogo.
Helder Taveira e Luísa (texto e fotos)