SOS, Europa

Resultados históricos da direita radical na Europa colocam em causa direitos LGBTQIA+. Hoje temos de ser mais corajosos, fazer mais barulho, levantarmo-nos contra o ódio para não retrocedermos.

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Megafone P3: SOS, Europa Nuno Ferreira Santos
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No passado fim-de-semana, a 9 de Junho, assistimos à viragem à direita nas eleições europeias. Os eurodeputados de extrema-direita e direita radical conseguiram um apoio significativo dos eleitores europeus. Em quase todos os países se assistiu à vitória de partidos ultraconservadores e de extrema-direita, não faltando exemplos: França, Bélgica, Alemanha, Áustria, Itália e Países Baixos.

Em Portugal, vimos o partido Chega eleger pela primeira vez dois mandatos com António Tânger Corrêa e Tiago Moreira de Sá, mantendo-se nestas eleições como terceira força política. Já o partido ADN, que se levanta contra o "lobby LGBT" e a "ideologia de género" (como lhes chama), ainda que não elegendo, fica em oitavo lugar, em frente ao PAN, com 1,4% dos votos.

No ano onde a violência e discriminação contra as pessoas LGBTQIA+ na Europa atinge o seu nível mais elevado numa década, percebemos com estas eleições, com a saída do armário do ódio das forças antidemocráticas e populistas, o risco cresceu para os direitos e situações de vida das mulheres, das pessoas LGBTQIA+ e das pessoas migrantes. Falamos das consequências das leis e dos discursos de ódio, que utilizando pessoas LGBTQIA+ e os seus direitos para desviar a atenção de problemas reais, através da polarização do discurso público, abrem caminho para a regressão dos direitos de pessoas trans, para as pessoas intersexo, para as pessoas não binárias, para as famílias arco-íris.

Voltamos hoje, novamente, a ter pessoas LGBTQIA+ com medo de sair à rua, a largar a mão do/a parceiro/a ou evitar demonstrações públicas de afecto em cidades europeias aparentemente livres e tolerantes, mas onde as denúncias de ataques homofóbicos são cada vez mais frequentes.

Voltamos hoje, 50 anos desde a queda daquele regime que nos censurava, nos perseguia, nos criminalizava, nos encerrou em hospitais psiquiátricos, à tentativa de silenciamento, anulação e enchovalho da diferença e diversidade pelos ultraconservadores, defensores da tradição e da "moral dos bons costumes". Vemos a exclusão racista, machista, homo-bi-transfóbica, que mata todos os dias, a reforçar a sua presença na casa da democracia europeia. Vemos que o trabalho em torno da igualdade não só não está feito, como, à medida que vamos avançando, passo a passo, há quem queira recuar o trabalho até aqui feito.

Vemos André Ventura, líder da terceira força política do país, a prometer cortar todos os subsídios às associações que promovam "ideologias de género e a igualdade de género". Associações que trabalham no combate e apoio à violência doméstica, ao assédio sexual, à implementação das medidas no que toca à não-discriminação com base na igualdade de género.

Vemos entre argumentos como o “ataque à família tradicional”, “a sovietização do ensino” e o discurso sobre “ideologia de género”, narrativas que ecoam por toda a Europa, a uma fracção da sociedade elitizada a soerguer-se perante o seu confortável privilégio para perseguir a pluralidade de identidades e relações existentes atenuando as formas de segregação, pobreza, desigualdade, exclusão existentes.

Foram precisos anos, décadas, séculos para dar voz a quem vivia no silêncio e, uma vez mais, vemos a perseguição e tentativa de silenciamento das múltiplas expressões de afecto, de amor, de ser e pensar na Europa como aqui em Portugal. Hoje temos obrigatoriamente de ser mais corajosos, fazer mais barulho, levantarmo-nos contra o ódio para garantir que não retrocedemos.

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