Ímpar
A alimentação e a beleza não são temas light
Bem-estar, famílias e relações, moda, celebridades... Um mundo que não é fútil.
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Durante um jantar de trabalho, pergunta a assessora da agência de comunicação que nos convidou: "Toda a gente que conhecem gosta de comer?" Fico a pensar. Sim. Esse gosto reflecte-se no modo como se cozinha, no tempo que se dedica a fazer um prato — às vezes, são cinco minutos, outras vezes, são horas —, na forma como preparamos a mesa e a ela nos sentamos. Preparem-se para uma banalidade: a cozinha junta-nos. Congrega-nos à mesa para debatermos temas do momento; para, no silêncio, sentirmos os aromas e sabores; para recordarmos histórias antigas que são nossas porque nas contaram, mas agora somos nós a repeti-las e não os nossos avós, deixando alguns pormenores perdidos no tempo ou juntando novos, mitificando-as. A cozinha leva-nos para junto da fogueira dos primeiros dias da humanidade, para recordarmos o que nos une, para nos alimentar o corpo e a alma.
E tudo isto não tem de acontecer ao domingo ou em dias santos, em casa da avó. Pode ser todos os dias, a uma refeição, em que a família se junta para saber como estão os mais novos, como correu a escola, como se estão a preparar para os exames. A Inês Duarte de Freitas falou com três especialistas sobre o que comer em época de exames e obter melhores resultados e, espantem-se, não é assim tão diferente do que comer no dia-a-dia — quando no dia-a-dia comemos bem! Além da alimentação, há dicas para estabelecer uma rotina saudável.
Rotina essa que deve começar cedo, mal são introduzidos os alimentos sólidos na dieta do bebé e se quer prolongar até tarde, quando formos velhinhos. A professora Elisabete Pinto faz várias sugestões para melhorar a alimentação das crianças — entre elas, dar o exemplo e comer em família. Já a jornalista Rita Caetano, para a revista Ímpar, escreve sobre o que comermos para termos mais anos de vida, uma vez que, sabemos, "pela boca morre o peixe" e há muita coisa que ingerimos que, aos poucos, nos mata.
O envelhecimento não é uma doença, mas aquilo que comemos pode contribuir para adoecermos. Por exemplo, comermos muito sal não só contribui para a tensão alta como pode ser prejudicial para os nossos intestinos. Alguns cientistas descobriram que as dietas ricas em sódio podem ter um impacto prejudicial no microbioma intestinal, "a comunidade de triliões de bactérias, vírus e outros micróbios que vivem nos nossos intestinos", escreve o jornalista norte-americano Anahad O’Connor, do The Washington Post. E por falar em intestinos, o jejum intermitente é mais eficaz a melhorar a saúde intestinal e o controlo do peso do que a restrição calórica, segundo um estudo realizado em vários centros de investigação norte-americanos.
Também é possível morrer por consumo de alimentos contaminados, alerta a professora Paula Teixeira, que escreve sobre práticas seguras de produção, manipulação e consumo de alimentos, fazendo referência a algumas tendências na alimentação que podem ser prejudiciais à saúde. Já a nutricionista Ana Leonor Perdigão reflecte sobre os alimentos de origem vegetal como substitutos dos de origem animal.
O brasileiro Folha de S. Paulo, com quem o PÚBLICO tem uma parceria, tem um blogue sobre transtornos alimentares, como a anorexia, a bulimia e outros. Chama-se Não tem Cabimento e publiquei um texto de Ana Carolina D. (as autoras optaram pelo anonimato) sobre a sua história pessoal. Como aos quatro anos descobriu que era gorda, e quem lho disse foi uma pessoa que devia amá-la e protegê-la, o pai. Cresceu a sentir-se indesejada a fazer tudo para perder peso. A comida tem também esse impacto no nosso corpo, também nos cataloga — o que é normal?
No final de Maio, no Alabama, EUA, num concurso de "misses", que não é aquele que leva uma jovem ao Miss América, Sarah Milliken, de 23 anos e obesa, conquistou o primeiro lugar e foi arrasada nas redes sociais por não ser um exemplo de saúde e estar a promover hábitos de vida pouco saudáveis. A jovem conta como sofreu (e sofre) de bullying e de cyberbullying — a psicóloga Vera Ramalho escreve sobre a violência em contexto escolar —, justificando porque participou no concurso, para se sentir bonita e aceite.
A "polémica" chegou cá no final desta semana e nas minhas redes sociais vi a partilha de uma fotografia, alegadamente do concurso Miss Polónia, em que se vêem jovens mulheres altas, magras, brancas e louras. É perguntado "notam algo diferente?" e as respostas variam entre "são todas mulheres", numa crítica aos concursos de beleza onde quem conquista a coroa é transgénero; "representam o povo polaco e não minorias", por oposição a vencedoras de outras etnias; "nada de 'beleza real'", numa referência à campanha que a Dove começou há 20 anos, sobre a qual escrevemos e pela qual recebemos uma chamada de atenção do Provedor do Leitor do PÚBLICO.
Na minha resposta ao provedor fiz referência a um leitor que enviou uma mensagem a dizer como estas campanhas são importantes porque tem uma filha adolescente (sabem que há jovens que preferem ver-se com os filtros dos telemóveis do que a imagem que o espelho reflecte — e os pais têm de as contrariar, e a sociedade tem de as contrariar). Ontem, após a publicação do texto do provedor, recebi mensagens de leitores e de colegas da redacção que me diziam que o trabalho que o Ímpar faz é, diz uma dessas mensagens, "muito importante na questão da auto-imagem das mulheres e meninas. Avante!".
A beleza, tal como a alimentação, não são questões light, são sérias porque podem abalar os nossos alicerces, a nossa saúde física e mental, porque podem martirizar-nos todas as manhãs, de cada vez que nos vemos ao espelho e observamos que não correspondemos ao ideal da mulher alta e loura do centro da Europa. Até a Barbie mudou as suas medidas, tons de pele e tipo de cabelo para chegar a todas as crianças porque somos todas diferentes e temos de continuar a batalhar para sermos todas aceites. Como diz a vencedora do concurso do Alabama, numa mensagem a todos os que a criticaram: "Sejam amáveis."
Boa semana!