Dez mil portugueses morrem ou ficam incapacitados pela poluição no sector da saúde anualmente

Sector da saúde é responsável por cerca de 4,8% das emissões de gases com efeito de estufa e por uma considerável quantidade de resíduos, avisa Conselho Português para a Saúde e Ambiente.

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Cuidados de saúde em Portugal são responsáveis por quase 5% de todos os impactos ambientais do país Nelson Garrido
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Todos os anos, cerca de 10 mil pessoas morrem precocemente ou ficam incapacitadas devido aos impactos ambientais causados pelo sector da saúde em Portugal, alertou João Queiroz e Melo, vice-presidente do Conselho Português para a Saúde e Ambiente (CPSA).

“Os cuidados de saúde em Portugal são responsáveis por quase 5% de todos os impactos ambientais que se produzem no nosso país”, afirmou Queiroz e Melo, pioneiro no transplante cardíaco em Portugal, que falava à Lusa a propósito do Dia Mundial do Ambiente, assinalado nesta quarta-feira.

O sector da saúde é responsável, em Portugal, por cerca de 4,8% das emissões de gases com efeito de estufa e por uma considerável quantidade de resíduos, refere o CPSA, realçando que seria necessário plantar mais de 168 milhões de árvores para retirar este dióxido de carbono da atmosfera. “A cultura do descartável é algo intolerável que tem de mudar”, defendeu Queiroz e Melo, que desde que se reformou da prática clínica há cerca de 14 anos tem-se dedicado à causa ambiental.

Salientou que a redução da pegada ecológica no sector da saúde é “uma preocupação há muito tempo” nos “países mais desenvolvidos e mais transparentes”, mas, disse, "em Portugal, ando a falar disto há dez anos e finalmente, nos últimos um ou dois anos, as pessoas começaram de facto a perceber que há um problema que é preciso resolver, sempre sem prejuízo da qualidade dos cuidados, porque isso é intocável”.

Segundo o cirurgião, é possível reduzir 30% destes impactos, “sempre sem prejuízo da qualidade dos cuidados”, e poupar. “Não é preciso fazer investimentos. É preciso é mudar de hábitos e, no caso concreto português, é preciso mudar alguma legislação que é do século passado", disse Queiroz e Melo.

Exemplificou com a lei dos resíduos hospitalares que é de 1996 e que disse estar "grosseiramente errada” e em contraciclo com as recomendações da Organização Mundial de Saúde.

“Tenho falado nisto nos últimos anos. Dizem ‘sim, senhor’, mas ninguém a muda, ninguém faz nada, é intolerável. De tal forma que escrevi um livro que publiquei há dois anos chamado Cuidados de Saúde e Ambiente. Uma verdade incómoda", disse, comentando: "Se fosse preciso investir milhões, era mais fácil mudar a lei."

"Mas não é preciso investir, é só preciso mudar a lei porque a seguir os hospitais, o serviço, todos nós, pouparemos muito e iremos seguramente salvar muitas vidas”, declarou.

Segundo o CPSA, a lei dos resíduos hospitalares é também um obstáculo para que as fábricas portuguesas produtoras de plástico consigam atingir a meta de 30% de plástico reciclado até 2030, para cumprirem directivas europeias, na medida em que o sector da saúde é responsável por cerca de 5% das compras de plástico a nível nacional.

Para dar uma voz comum às organizações de saúde nas questões das alterações climáticas, da degradação ambiental e o seu impacto na saúde, foi criado em 2022 o Conselho Português para a Saúde e Ambiente, que reúne 80 entidades.

“Com adesões de tantas instituições, estou certo de que vamos conseguir vencer esta cortina de ignorância, de interesses", disse o cirurgião que liderou a equipa que fez o primeiro transplante de coração no país em 1986, no Hospital de Santa Cruz, em Lisboa.

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