Diogo Batáguas: o humorista sem medo

Há muitos/as outros/as humoristas que admiro em Portugal, mas nenhum/a, do meu ponto de vista, consegue simultaneamente, informar sobre o que se passa no país e no mundo, e fazer rir, rir muito.

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"Diogo Batáguas poderá ser apenas um coração bom e empático, mas nos tempos que correm, não é coisa pouca" DR
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Existirá uma terminologia para designar o humor que se mistura com serviço público? Sugiro o substantivo próprio que, por enquanto, dê jeito: Diogo Batáguas. O nome do humorista, pesquisado no Google, remete, entre os links dos seus conteúdos, para a página da Câmara Municipal de Almada, que assim descreve: “Nasceu em Lisboa, viveu na Sobreda desde os 10 anos de idade, teve uma infância tranquila. Jogou futebol como atleta federado no Grupo Desportivo dos Pescadores da Costa da Caparica e futsal no Clube Recreativo Piedense. Estudou Comunicação, fez rádio em Almada e considera que viver na Margem Sul é sinónimo de qualidade de vida.” Falta nesta descrição, apenas um parágrafo simples: Atualmente, Diogo Batáguas faz mais serviço público, do que muitos jornalistas da nossa praça.

Pelo que diz, sem medos, mas com verdade, já foi alvo de processos judiciais, tendo servido de mote para um espetáculo de stand up comedy que encheu muitas salas por esse país fora. Em 2020, lançou ‘A fabulosa aventura de André Cocó’, que estando ilustrado tal qual livro infantil, “alerta para o discurso populista e os objetivos do líder e deputado do partido Chega” (narrado pelo o autor e disponível no YouTube. Mais recentemente, presenteou-nos com o Fact Cheg'ing, “um livro de bolso para ser utilizado com amigos ou familiares que garantem que o Chega é um partido que sim senhor. Um rigoroso compêndio a pensar em todos os jornalistas e demais cidadãos que, em casa, no trabalho ou no café, debatem assuntos relacionados com o partido Chega e não conseguem ter na ponta da língua todo o histórico de trafulhices dos energúmenos que o compõem”, descreve numa espécie de sinopse.

Há muitos/as outros/as humoristas que admiro em Portugal, mas nenhum/a, do meu ponto de vista, consegue simultaneamente, informar sobre o que se passa no país e no mundo, e fazer rir, rir muito. No fim de ver um dos seus conteúdos, registo que não foram apenas 50 minutos de gargalhadas, mas de conhecimento. Coisa rara numa lógica inflamada de publicações e dumb scrolling. Quando assistia ao ‘Relatório’ — (um dos seus conteúdos no YouTube) que no fundo era um resumo do que se tinha passado no mês anterior, com um olhar crítico e divertido — concluia que, mesmo sendo jornalista, havia assuntos que eu não tinha prestado atenção ou pelo menos não da forma como o tema era apresentado.

Diogo Batáguas não expõe apenas as calinadas dos políticos ou de figuras públicas que saiam mal na fotografia. O humorista traz à luz do dia factos jornalísticos, que por motivos diversos, nos devem fazer despertar a consciência. Não será fruto apenas do seu trabalho, mas de toda a equipa que com ele trabalha nos seus conteúdos. Mas, é ele que dá a voz e a cara por muita informação, que o pode sentar com facilidade no banco do tribunal, ainda que protegido pela liberdade de expressão.

No último vídeo, publicado no YouTube, o humorista expõe alguns produtores de conteúdos digitais que pertencem a uma nova vaga de jovens portugueses ultraconservadores, e que publicamente assumem, amiúde, declarações como estas:

  • O dever da mulher na sociedade é ser dona de casa.
  • Mandar mulheres para a universidade é um genocídio da nossa população.
  • As mulheres são fracas, quando tentas bater numa mulher, tu sabes que elas começam a chorar à mínima força que implementares.
  • Hoje em dia uma mulher divorcia-se por qualquer motivo e não pode ser. A mulher tem uma obrigação perante o país.
  • As mulheres só se separam porque sabem que podem casar com outro homem.
  • Porque é que não existem mulheres em cargos de poder? Porque não foram feitas para isso.
  • A mulher que está em idade fértil, não pode ter acesso a redes sociais.
  • Homens são pessoas tipo inteligentes e depois há as mulheres que nunca foram postas no seu lugar por um homem.

As declarações acima citadas foram retiradas de podcasts e vídeos realizados por nomes que não interessa aqui dar destaque. E muitas outras declarações, mas de índole racista e xenófoba, que não me atrevo sequer a transcrever, proliferam nas redes sociais, em vídeos, reels, podcasts. Se eu tinha conhecimento da dimensão desta realidade paralela de ódio disseminado por jovens? Não, até ver o ‘Conteúdo do Batáguas’.

Despretensioso e com um humor que é absorvido transversalmente, quer a nível de faixas etárias, quer a nível de geografias, Diogo Batáguas, pelo que percebi ao ler algumas entrevistas disponíveis, descarta a televisão, no sentido de continuar a ser totalmente livre no digital, a fazer o que quer, quando quer. No entanto, embora desconheça se recebeu muitos, poucos ou nenhuns convites para ter um programa num dos canais televisivos portugueses, não posso deixar de lamentar que outras pessoas, um público diferente, porventura mais vasto, não aceda justamente aos seus conteúdos. É disto que estamos a precisar.

Parece-me que Diogo Batáguas poderá ser apenas um coração bom e empático, mas nos tempos que correm, não é coisa pouca.

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