Arqueólogo de Moçambique quer parceria com Portugal para proteger passado naufragado
Ricardo Teixeira Duarte, especialista da UNESCO, defende um protocolo de cooperação bilateral para salvaguardar e valorizar o património subaquático na ilha de Moçambique.
O arqueólogo Ricardo Teixeira Duarte defendeu esta segunda-feira uma parceria oficializada com Portugal para o património subaquático na ilha de Moçambique, que conta a história dos dois países e está ameaçado pela acção do homem e até pelas alterações climáticas.
Este especialista da UNESCO para o património subaquático falou à agência Lusa em Lisboa, onde participou na conferência A Arqueologia Subaquática em Moçambique, organizada pelo Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática (CNANS).
“É um património que está em grande risco, ligado a actividades ilegais, de pessoas que mergulham e tiram coisas, e ao próprio desenvolvimento industrial e da exploração de recursos marítimos. E é um património muito importante da humanidade”, disse.
O investigador, juntamente com Yolanda Teixeira Duarte, também moçambicana, vieram apresentar aos colegas o que estão a fazer para proteger este património e desafiá-los a uma colaboração, em conjunto com a UNESCO e outros parceiros.
Ricardo Teixeira Duarte defende uma parceria oficializada para que se proteja, em conjunto com Portugal, esse património, uma vez que “está lá uma grande quota-parte de Portugal também”.
“É um património que pertence a Moçambique, porque está lá e Moçambique é um país soberano, mas é património de Portugal também”, observou.
E recordou que é em águas moçambicanas que se encontra um dos poucos galeões que dão testemunho da Carreira da Índia, a rota marítima do século XVI entre Lisboa e a Índia que Portugal assegurou após a descoberta do caminho marítimo por Vasco da Gama.
Mas não só. Nas águas da costa de Moçambique também se encontra o navio negreiro L’Aurore, construído em França, que se afundou com 300 escravos. Todos morreram no naufrágio.
O investigador considera que, além do património material que continua a trazer respostas sobre o passado, trata-se de “uma memória que é preciso divulgar, uma memória de um passado importante que está ali, debaixo de água”.
Sobre o período do tráfico de escravos e da escravatura, acredita que os objectos que vão sendo encontrados também contribuem para um maior conhecimento do que se passou. Um dos artigos que mais o impressionou, contou, são umas algemas com que os escravos eram presos aos navios negreiros, encontradas no navio São José, naufragado em 1794 ao largo da África do Sul, e que estão expostas num museu em Washington, nos Estados Unidos.
“É fundamental abordar esse assunto. Não vamos pôr uma pedra em cima de um passado que existiu, de uma história que existiu. Era assim naquela altura. Não podemos dizer que os portugueses eram uns criminosos, uns assassinos… Não foi só Portugal, era o sistema económico daquela época. A escravatura não foi só exportar os escravos. A própria economia dos países de onde os escravos saíam era baseada na mão-de-obra escrava e na escravatura. E não foram só os europeus.”