Nenhuma espécie está preparada para andar à trela, por isso, os gatos também têm fortes hipóteses de se habituarem a ser passeados pelos tutores na rua.
A ucraniana Esphir Ayzenshtat, que vive em Lisboa desde 2022, acredita que, entre os portugueses, esta é uma prática ainda pouco comum, pelo menos nas zonas de Belém e São Domingos de Rana, onde costuma passear com os seus animais.
A invasão da Rússia à Ucrânia, em Fevereiro do ano passado, obrigou a jovem de 24 anos a deixar a casa e a maioria dos pertences para trás. No carro iam os pais, o companheiro e o cão e o gato que estavam pouco habituados a viagens longas. De Odessa, nas margens do mar Negro, até Lisboa levaram seis dias.
“No segundo ano em Portugal decidi adoptar outro gato. Adoro animais e, se vivesse numa casa maior, teria muitos. Adoptei o meu gato Tofu porque vi o meu primeiro, o Feto, a querer socializar com outros”, começa por explicar ao P3.
Foi buscar o segundo felino a uma associação do Porto e, depois de ter percebido que era um gato curioso, aventureiro e mais do que habituado a estar na rua — o oposto de Feto — experimentou um passeio curto com trela e peitoral no jardim perto de casa.
“Testámos o peitoral e a trela em casa, mas ele habitou-se rapidamente. Quando íamos passear o meu cão Pasta púnhamos o peitoral ao gato até ele ficar confortável. Agora vai passear todos os dias. Durante a semana ao jardim e aos fins-de-semana à praia.”
Nas saídas encontrou duas pessoas que também passeiam os gatos, um francês e uma brasileira com quem ficou a conversar. Quem não leva os felinos pela trela, diz a jovem, costuma olhar, achar engraçado e pedir para tirar fotografias ao gato.
Os cuidados que Esphir tem durante os passeios são os mesmos que a médico-veterinária Joana Prata aconselha aos tutores que querem ou já passeiam os gatos. O primeiro passo é perceber se o animal tem vontade de sair à rua — por outras palavras, se for sociável e descontraído como Tofu talvez esteja disposto a uma saída. Mas se for nervoso ou assustadiço como Feto, é um não.
Em todo o caso, devem sempre habituá-los à trela em casa e com tempo, sendo que quanto mais jovem for o animal mais fácil será. Da mesma forma, assegura, associar o peitoral a um estímulo positivo como uma guloseima ou uma brincadeira também vai ajudar.
“Se o gato estiver desconfortável vai ficar com o corpo encolhido, com as orelhas para trás e pode tentar fugir. Há pessoas que têm o hábito de deixarem os cães amarrados a postes enquanto vão buscar qualquer coisa, mas com os gatos nunca o devem fazer. São animais que se assustam rapidamente, não são sociáveis e não vão procurar outros gatos. Podem fugir, entrar em conflito com outros animais ou emaranhar-se na trela e magoarem-se”, expõe.
Esphir nunca teve incidentes deste tipo com Tofu, desde logo, porque não confia no gato ao ponto de o deixar sozinho. “Como foi abandonado na rua, é muito predatório. Gosta de caçar, trepar árvores, comer relva e os cães são-lhe indiferentes. O Feto, nas vezes em que o levo, fica muito perto de mim, sempre com a cauda escondida entre as pernas e é mais cuidadoso. Se não lhe puser trela ele vem quando o chamo”, afirma.
Antes de passear, vacinar
Além da trela, a médica veterinária recorda que os gatos, tal como os cães, só devem ser passeados depois de serem vacinados, estarem desparasitados e terem microchip, que é obrigatório em Portugal. Se os passeios forem regulares, defende, convém que a desparasitação também o seja.
Outra coisa: numa primeira fase, as saídas devem ser curtas, em locais calmos sem grande ruído ou outros animais e pessoas por perto para evitar que o gato fique desconfortável. A frequência dos passeios fica ao critério dos tutores.
“É importante que os cuidadores tenham uma expectativa diferente quando vão passear um gato porque não vai ser igual a sair com um cão. O gato vai cheirar coisas, mas não tanto como o cão. Com os cães estamos habituados a sermos nós a decidir o caminho. Os gatos dificilmente vão andar ao nosso lado e ao nosso ritmo, vão explorar e decidir quando estão prontos para continuarem a andar”, afirma.
Por outro lado, e para os felinos que gostarem, acrescenta Joana Prata, estar num ambiente diferente com estímulos sonoros e olfactivos vai ser benéfico tanto a nível físico – especialmente para os mais sedentários – como psicológico.
No caso de Esphir, sair com dois gatos e um cão ao mesmo tempo significa passeios mais longos. O cão de raça pug é o mais preguiçoso dos três. Segundo a dona, “não tem interesse em brincadeiras” nem em estar com outros cães.
Os gatos, por outro lado, interessam-se mais, especialmente Tofu que fica parado o tempo que entender. “Ele passeia-me e eu passeio o cão”, conclui.