Chega requer ao Parlamento que acuse Presidente da República de traição à pátria

Partido entregou projecto no Parlamento que requer a abertura de um processo contra Marcelo por traição à pátria. Aguiar-Branco já pediu a constituição de uma comissão parlamentar especial.

Foto
André Ventura anunciou, na semana passada, a intenção de avançar com a iniciativa Nelson Garrido
Ouça este artigo
00:00
04:35

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

O projecto de deliberação entregue pelo Chega, nesta segunda-feira, no Parlamento requer a abertura de um processo contra o Presidente da República pelos crimes de traição à pátria, coacção contra órgãos constitucionais e usurpação. Por seu lado, o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, já pediu a constituição de uma comissão parlamentar especial que deverá produzir um relatório sobre a iniciativa do Chega.

"O Chega requer à Assembleia da República que dê início às diligências conducentes à abertura de processo próprio contra sua excelência o Presidente da República pelo crime de traição à pátria, coação contra órgãos constitucionais e usurpação", lê-se na proposta divulgada pelo partido.

"Fazemo-lo porque sentimos que o Presidente da República, chefe máximo e representante máximo do Estado português, traiu o seu país ao anunciar que Portugal deveria iniciar um processo histórico de reparação e indemnizações às suas antigas províncias ultramarinas", declarou o presidente do Chega, numa conferência de imprensa na sede do Chega no Funchal, onde esteve para o arranque da campanha eleitoral das legislativas antecipadas da Madeira de 26 de Maio. Questionado pelos jornalistas, Ventura reconheceu que PS e PSD "provavelmente não" vão acompanhar a queixa: "Não é uma surpresa na verdade, mas nós queríamos ficar de consciência tranquila, de que, quando a história nos julgar a todos deste momento, nós estávamos do lado certo deste processo."

A apresentação desta queixa contra o Presidente da República, uma acção inédita na história democrática de Portugal, pretende dar voz "aos milhares, se não milhões, que se sentem profundamente injustiçados" com as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, nomeadamente antigos combatentes, disse. Para o líder do Chega, o Presidente da República colocou as finanças públicas portuguesas "sob pressão" ao anunciar possíveis caminhos para indemnizações e compensações, reforçando que esta é "uma questão que pode implicar perdas culturais, económicas, financeiras e sociais para Portugal".

"Ser um cidadão qualquer a dizê-lo poderia passar incólume. Ser um político a dizê-lo poderia ser desculpado em determinadas circunstâncias. Ser o Presidente da República portuguesa, eleito de forma directa e universal por todos os portugueses, a dizê-lo é um acto de profunda traição à pátria, mas uma traição maior ainda aos nossos antigos combatentes", afirmou. O líder do Chega argumentou que "não é da competência do Presidente da República a gestão das relações externas de Portugal", acusando-o de condicionar a actuação do Governo.

O Chega invoca, no seu projecto de deliberação, a Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, sobre crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, além do código penal. De acordo com o Regimento da Assembleia da República, perante uma proposta de "acusação do Presidente da República", que tem de ser subscrita por um quinto dos deputados, é constituída uma comissão parlamentar especial para elaborar um relatório. A seguir, no prazo de 48 horas, realiza-se uma reunião plenária para votar a iniciativa, que precisa de uma maioria de dois terços para ser aprovada. A iniciativa do Chega deverá ser rejeitada, uma vez que PS e PSD já se manifestaram contra.

José Pedro Aguiar-Branco, presidente da Assembleia da República, já submeteu ao plenário um projecto de deliberação que prevê a "constituição de uma comissão parlamentar especial" com uma "composição mínima" de três deputados do PSD e outros três do PS, dois do Chega e um de cada um dos restantes partidos com representação parlamentar, para avaliar o processo que o Chega pretende abrir contra o Presidente da República.

A comissão parlamentar especial já foi tacitamente aprovada na última conferência de líderes, por todos os grupos parlamentares, e será formalizada depois de todos os partidos terem indicado os seus representantes e de a mesma tomar posse. Uma vez formalizada, a comissão terá 48 horas para elaborar um relatório sobre a intenção do Chega de levantar um processo-crime contra o chefe de Estado.

O Chega já tinha anunciado, na última terça-feira, que iria avançar com esta iniciativa, informando então que iria entregá-la entre quarta e quinta-feira da semana passada. Com base nestas datas, e uma vez que o presidente da Assembleia da República queria acelerar o processo para que não fique a "pairar no espaço público a dúvida sobre a proposta do Chega", Aguiar-Branco definiu na conferência de líderes da semana passada um calendário condicionado à apresentação da proposta. No entanto, o Chega não apresentou a iniciativa nos dias previstos, tendo dado entrada à mesma nos serviços do Parlamento somente nesta segunda-feira.

Fonte do gabinete do presidente da Assembleia da República disse à Lusa que a entrega da iniciativa nesta segunda-feira inviabiliza o calendário acertado em conferência de líderes. Seja como for, o projecto de deliberação que esta segunda-feira o presidente do Parlamento apresentou mantém o prazo de dois dias para que a comissão especial produza o relatório.

Notícia actualizada com mais informações