Mel de Montesinho: cientistas analisaram qualidade e a boa fama é merecida
Cientistas analisaram 13 amostras de mel produzido no Parque Natural de Montesinho, em Trás-os-Montes, e concluíram que todas cumpriam critérios de qualidade e segurança.
O mel do Parque Natural de Montesinho já tinha boa fama – agora, os cientistas confirmaram que a fama tinha mesmo razão de ser. Um estudo publicado na revista científica Food Quality And Safety, desenvolvido por investigadores portugueses, sugere que todas as amostras de mel produzido no interior desta área protegida, localizada no Nordeste Transmontano, cumprem critérios de qualidade e segurança.
“Por vezes temos a ideia de que tudo o que natural é bom, mas às vezes o que é natural não é assim tão bom. Temos de verificar cientificamente e este primeiro trabalho foi, no fundo, um contributo para provar que, efectivamente, temos dados e podemos confiar na qualidade do mel do Parque Natural de Montesinho”, explica ao PÚBLICO a co-autora Cristina Delerue-Matos, que coordena o grupo de reacção e análises químicas do Laboratório Associado para a Química Verde (LAQV-Requimte).
A cientista nota que, ainda que haja factores de possível contaminação, como os pesticidas oriundos de alguma agricultura local e o uso de antibióticos “para proteger a saúde das abelhas”, os resultados encontrados revelam uma qualidade homogénea nas 13 amostras estudadas, todas elas oriundas de apiários independentes.
Os autores afirmam que este é o primeiro estudo disponível na literatura científica capaz de caracterizar o mel de diferentes apiários dentro do Parque Natural de Montesinho. Nove das 13 amostras foram obtidas directamente de produtores locais em 2021. Outras duas foram compradas em supermercados locais, sendo que advinham de embalagens cujo rótulo indicava produção local. As restantes foram produzidas em zonas limítrofes do parque e adquiridas ao apicultor.
“Verificamos que, independentemente da localização dentro do Parque de Montesinho, o mel realmente tem qualidade. Isto está relacionado com a biodiversidade que temos naquele parque natural, que tem um ambiente protegido e controlado. Trata-se de uma área geográfica cujo mel é bastante conhecido e valorizado. Com este artigo, nós reiteramos esta ideia”, explica ao PÚBLICO Sónia Soares, primeira autora do estudo e investigadora do LAQV-Requimte.
O objectivo principal do estudo era perceber se a localização do apiário influenciava a qualidade do mel. Sónia Soares refere, numa videochamada, que a associação de apicultores local auxiliou os investigadores na escolha dos sítios de amostragem.
“São eles que conhecem bem o parque. Quisemos englobar diferentes locais para que nos pudessem facultar a maior variedade a nível ambiental”, explica a cientista. Para Sónia Soares, esta ajuda foi importante pois a associação ajudou a identificar apiários que estiveram “perto de fogos nos últimos anos” ou que são contíguos a estradas e zonas agrícolas.
“O objectivo não era ir à procura das coisas más, mas garantir que estava tudo controlado e que nós podemos ter confiança no produto alimentar mesmo sabendo que há fogos durante o ano, que há tráfego automóvel, pesticidas e antibióticos”, explica Cristina Delerue-Matos, que também é professora no Instituto Superior de Engenharia do Porto.
Estudo integra projecto mais vasto
Este artigo científico insere-se num projecto mais vasto, ainda em curso, que analisa o mel como um indicador da qualidade do ambiente – neste caso, do Parque Natural de Montesinho. “Este artigo [da Food Quality And Safety] é uma parte de um trabalho que fomos fazendo ao longo dos últimos anos, e que ainda estamos a fazer. É como se fosse um fotograma de um vídeo”, diz Sónia Soares.
Neste trabalho mais alargado, e no qual participam investigadores da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, estão a ser estudadas amostras do ar, do solo, da água e da vegetação. “Estamos a tratar dados neste momento, ainda não temos resultados finais. Queremos verificar, por exemplo, se o tráfego influencia [a qualidade do mel] ou se os pesticidas na zona agrícola acabam por aparecer no mel, mas para já todos estes dados ainda estão a ser tratados. Este é o primeiro resultado do projecto”, esclarece Cristina Delerue-Matos.
O estudo refere que, nos últimos anos, a produção apícola tem estado em declínio devido à falta de vegetação e ao colapso das colmeias de abelhas, “o que leva a um aumento das práticas fraudulentas na produção de mel e na importação de mel de qualidade inferior.”
O Parque Natural de Montesinho situa-se nos municípios de Bragança e Vinhais, sendo um dos 12 parques naturais existentes hoje em Portugal. O mel ali produzido tem o selo de Denominação de Origem Protegida (DOP) desde 1994.