PS e PSD-CDS rejeitam comissão de inquérito à privatização da ANA
Proposta comunista foi rejeitada no Parlamento. António Filipe, do PCP, fala em “surpreendente convergência de votos entre PSD e PS para impedir a realização de uma CPI”.
A intenção do PCP de constituir uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) sobre a privatização da ANA e venda ao grupo francês Vinci fica pelo caminho com os votos contra da coligação PSD-CDS e do PS.
No arranque da sessão plenária desta terça-feira, o deputado comunista António Filipe justificou a necessidade de um inquérito parlamentar sobre o negócio realizado em 2012 pelo Governo de Pedro Passos Coelho sobre uma “operação escandalosa” e “desastrosa para o país”, relativamente à qual uma recente auditoria do Tribunal de Contas (divulgada em Janeiro) veio trazer “factos novos”.
Segundo o relatório da auditoria, a venda da gestora dos aeroportos portugueses à Vinci não teve todas as condições necessárias de “transparência, estabilidade, equidade e maximização do encaixe financeiro” e “não salvaguardou o interesse público”, incluindo porque não maximizou o encaixe financeiro para o Estado e não trouxe um “reforço da posição competitiva, do crescimento e da eficiência da ANA”.
O Tribunal de Contas acusou igualmente o Governo da altura de, num “contexto adverso”, em que o país estava sob assistência financeira, não ter garantido a avaliação prévia do grupo ANA “que era legalmente exigível” e de não ter protegido “cabalmente os interesses nacionais”.
António Filipe salientou que se impõe o apuramento de responsabilidades políticas e financeiras sobre o negócio, mas só o Livre e o Bloco de Esquerda manifestaram concordância com a necessidade de um inquérito parlamentar.
O comunista considerou que “o desfecho anunciado” da votação “não deixa de ser surpreendente por se assistir a uma convergência de votos entre PSD e PS para impedir a realização de uma CPI”.
A deputada Isabel Pires, do Bloco de Esquerda, acompanhou o PCP nas críticas à privatização da ANA, considerando que “só teve em consideração os interesses dos privados” e que o negócio permitiu à Vinci ficar com “conhecimento técnico [sobre a gestão aeroportuária], que era do Estado português, para expandir o negócio para outros países”.
Pelo Livre, Jorge Pinto disse estranhar “a falta de interesse” de outros grupos parlamentares sobre “um tema tão importante” e destacou também “a capacidade da ANA e da Vinci de protelar e adiar a construção do novo aeroporto [de Lisboa]”, o que “está a atrasar o país”.
Hugo Costa, do PS, defendeu que os socialistas sempre criticaram o negócio de privatização da ANA, bem como os moldes em que foram feitas outras privatizações, como REN, Groundforce e TAP, pelo anterior Governo de coligação PSD-CDS. O PS “acompanhará de muito perto” a actividade da empresa, mas considera que uma CPI sobre a privatização da ANA tem “um objecto muito fechado” e será pouco esclarecedora. “A constituição da CPI é extemporânea”, afirmou o deputado socialista.
Tal como o PS, o PSD também entende que o escrutínio parlamentar à ANA deve ser feito nas audições regulares da Comissão Parlamentar de Economia. O social-democrata Gonçalo Lage acusou o PCP de preferir “investigar os casos em que o Estado ganhou dinheiro, em vez dos casos em que o Estado perdeu dinheiro”, como na privatização da Efacec, “em que desapareceram 300 milhões dos contribuintes”.
Carlos Núncio, do CDS, criticou “a cegueira ideológica do PCP” e a “obsessão de renacionalizar tudo o que mexe”. Também Carlos Guimarães Pinto, da Iniciativa Liberal, concordou que a proposta comunista “está contaminada pelo viés ideológico do PCP, para o qual todas as privatizações são más por definição”, mas disse que o partido não se oporia a um inquérito parlamentar.
O mesmo referiram Filipe Melo e Carlos Barbosa do Chega, embora tenham sustentado que a privatização da ANA era um negócio de que já se falava antes da chegada da troika e até “foi elogiada pela Comissão Europeia”. Para os deputados do Chega, a proposta do PCP foi apenas “uma prova de vida”, sabendo à partida que a CPI “não ia ser aprovada”.
Além disso, questionaram a posição socialista na votação, por considerarem que Pedro Nuno Santos (anterior ministro das Infra-Estruturas) se manifestou frequentemente crítico do negócio de privatização.