Palcos da semana: Na Medida do Impossível a meias com paz, liberdade e o manifesto de Rego
Os próximos dias trazem uma aguardada estreia nacional, Aldina Duarte pela Metade-Metade, ruínas em que A Paz É a Paz, Música & Revolução e arte de Paula Rego.
Finalmente, Na Medida do Impossível
De dezenas de entrevistas a trabalhadores em ajuda humanitária nasceu Na Medida do Impossível, de Tiago Rodrigues. Estreada em Fevereiro de 2022, na Comédie de Genève (Suíça), trouxe um olhar que, “à violência do mundo, opõe a resiliência e o humor daquelas e daqueles que, a cada dia, arriscam a sua vida para ajudar, cuidar e salvar”, lia-se na folha de sala.
Chegaram cá os ecos da aclamação. Na televisão, passou um documentário sobre o processo do autor e encenador (e actual director do Festival de Avignon) na construção do espectáculo. Mas nunca o tínhamos visto ao vivo. Até agora.
Ao fim de uma extensa digressão mundial, estreia-se finalmente por cá, mesmo a tempo dos 50 anos do 25 de Abril, com os actores Adrien Barazzone, Beatriz Brás, Baptiste Coustenoble e Natacha Koutchoumov a darem vida aos “testemunhos de quem vive e trabalha no lado do impossível” e Gabriel Ferrandini a dar música ao vivo à causa.
Aldina a meias com a liberdade
Com a liberdade, a solidariedade, a emergência climática e o amor universal (em vez do romântico) na voz, Aldina Duarte reinventou-se em Metade-Metade, álbum forjado a meias com Capicua.
Juntas, fadista e rapper convocaram esses temas enquanto se desafiavam, desmontavam códigos do fado tradicional, deixavam entrar palavras tão angulares como Araucária (canção com nome de árvore) e aprendiam mutuamente.
O resultado vai agora ao Coliseu dos Recreios, num concerto especial de tão intimista quanto festivamente comunitário: Aldina canta com Ana Isabel Dias na harpa, Bernardo Romão na guitarra portuguesa e Rogério Ferreira na viola. E com cerca de outras 400 pessoas em cima do palco.
Revolução na casa
Na Casa da Música, onde há muito que Abril inspira Música & Revolução, o ciclo agiganta-se perante o cinquentenário dos cravos, com um programa em que tanto cabem microfones abertos como um fadista a cantar Freedom.
A conferência Passa o Micro abre a função dando a palavra aos músicos. Hélder Moutinho há-de fechar a cortina com fado em tons de intervenção. Até lá, dá-se a aguardada estreia mundial d’A Madrugada que Daniel Moreira compôs para poemas de Sophia de Mello Breyner Andresen sobre o 25 de Abril, bem como a primeira audição da versão orquestral de American Settings de Vasco Mendonça.
Emmanuel Nunes, Lopes-Graça e Carlos Paredes serão outros homenageados pelas partituras. Enquanto os agrupamentos da casa – e seus convidados – se mobilizam para os concertos, o serviço educativo junta-se à festa com um Abril entre ex-combatentes e jovens músicos e bailarinos, e proclama Venham Mais 300 (alunos de escolas de música e membros de filarmónicas) para um tributo a Zeca Afonso.
O manifesto de Rego
Na Casa das Histórias Paula Rego, os 50 anos do 25 de Abril assinalam-se com uma ponte para o seu passado de crítica, desafio e resistência à ditadura. Está em causa a recriação da primeira individual da pintora em 1965, na Sociedade Nacional de Belas Artes, em Lisboa – uma mostra que causou um impacto sem precedentes, desorientou a censura e, nas palavras de Catarina Alfaro e Leonor de Oliveira (curadoras da exposição que vai agora ser inaugurada), criou “um espaço de dissensão, confronto e liberdade”.
Paula Rego: Manifesto reúne 18 das obras então exibidas e articula-as com cerca de 60 outras que comentam o 25 de Abril e o período pós-revolucionário, bem como um conjunto de arco temporal mais alargado, em que a artista expressa posições políticas relativas, por exemplo, ao aborto.
A paz em ruínas
“Uma tragédia que coloca o público frente-a-frente, corpo-a-corpo, olhos-nos-olhos, entre o conflito e o poema, tacteando a espessura da paz entre os escombros”. É nestes termos que a companhia UmColetivo descreve A Paz É a Paz, a nova criação que está prestes a levar às ruínas do Teatro Romano.
Com dramaturgia de Ricardo Boléo, corresponde a uma releitura d’A Paz segundo Aristófanes, contaminada pelas impressões poéticas e jornalísticas da repórter de guerra Maria João Carvalho e alargada às visões de outras mulheres em cenários bélicos (Guerra Colonial, Sarajevo, Ucrânia, Palestina…), campos de refugiados e outras tragédias modernas.
A interpretação cabe a Cátia Terrinca, João Maria Carvalho e um conjunto de músicos. Depois da estreia em Lisboa, no âmbito do ciclo Abril Abriu do D. Maria II, a peça sai em digressão para Portalegre (25 a 27 de Abril), Ponte de Sor (30 de Abril) e Figueira da Foz (4 e 5 de Maio).