Greve de fome contra o modelo “suicida” de turismo nas Canárias

Activistas do Canarias se Agota estão em protesto por tempo indeterminado, passado o ultimato de dez dias dado ao governo regional para mudar a insustentável política turística de massas nas ilhas.

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Manifestantes da plataforma Canarias se Agota em protesto contra a política de turismo de massas no arquipélago espanhol Europa Press via Reuters Connect
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Começaram por dar dez dias ao Governo das Canárias para rever aquilo que consideram ser o actual modelo “suicida” de turismo de massas que vigora no arquipélago espanhol. Como não receberam qualquer sinal do executivo regional, liderado por Fernando Clavijo, da Coligação Canária, seis activistas do movimento de cidadãos Canárias se Agota (Canárias Está a Esgotar-se) decidiram na quinta-feira iniciar uma acção mais radical: uma greve de fome por tempo indeterminado. E esta semana haverá mais formas de luta destinadas a pressionar a mudança que consideram necessária para não chegar ao ponto de não retorno.

A gota de água para esta reacção são dois empreendimentos de luxo actualmente em construção no sul de Tenerife, que o grupo considera “ilegais”. Daí que o objectivo imediato do seu protesto seja “paralisar a construção do hotel de La Tejita e do complexo habitacional Cuna del Alma”, dizem os activistas citados pelo diário digital Canarias Ahora, como ponto de partida para uma revisão da política turística do arquipélago.

“Sabemos que vamos pôr as nossas vidas em risco e estamos conscientes disso”, disse na semana passada, numa conferência de imprensa em Santa Cruz de Tenerife, um dos porta-vozes do movimento, Víctor Martín, mas “iremos até ao fim com a greve de fome, com todas as consequências”. E justificou: “Arriscamos a nossa saúde porque a nossa juventude apercebeu-se do futuro nada risonho que temos”.

Os números de turistas nas Canárias superaram o ano passado o total de 2019, ou seja, pré-pandemia, tendo crescido 6,9% face ao ano anterior. Em 2023, o arquipélago espanhol das Canárias recebeu 14,1 milhões de turistas, quase sete vezes mais do que os 2,2 milhões de habitantes do arquipélago de origem vulcânica, de oito ilhas e cinco ilhotas, situado a noroeste do continente africano.

Independentemente da contribuição para a economia local que o turismo possa trazer agora, as centenas de canários que se juntaram ao movimento Canarias se Agota estão preocupados com o impacto dessa pegada turística no futuro da ilha. E essa preocupação obriga a medidas mais radicais.

“A responsabilidade do que poderá acontecer, em última instância, será do próprio governo que nos levou a tomar esta medida desesperada”, disse Martín. “Dizemos ‘basta’ porque os senhores estão a pôr em risco o nosso presente e o nosso futuro, e o das novas gerações.”

A plataforma de cidadãos Canarias se Agota é recente, foi criada em finais de Março para exigir uma moratória turística que suspenda temporariamente a construção de novos empreendimentos turísticos e a aprovação de licenças para o aumento da oferta turística.

“As ilhas estão numa situação crítica e é o povo que sofre as suas piores consequências”, afirmam os activistas, citados pela agência de notícias Infobae. A exploração excessiva dos recursos, a perda de biodiversidade e a exclusão da população local do grosso dos lucros do sector são algumas das razões apontadas.

Desde há muito que os projectos turísticos que tanta celeuma causam em Tenerife atraem protestos dos activistas pelo efeito negativo que vão ter no ecossistema. O complexo habitacional de Cuna del Alma (berço da alma) está situado na praia de Puertito de Adeje, uma enseada que tinha sido mantida à margem da urbanização turística e que é um enclave natural único. Nesta micro-reserva marinha, onde as tartarugas verdes nadam sem constrangimentos, desenvolve-se desde 2005 um projecto de conservação, investigação e educação ambiental.

Considerado pelas organizações ambientalistas como um “ecocídio”, o empreendimento foi mandado parar por ordem do Conselho de Transição Ecológica a 11 de Novembro de 2022 pela “ameaça iminente de dano ambiental”. Na altura, a promotora imobiliária foi sancionada em 110 mil euros por ter avançado com as obras sem o necessário estudo de impacto ambiental. Também a Direcção Geral do Património Cultural ordenou a suspensão da obra pela descoberta de desenhos rupestres.

No entanto, em Fevereiro deste ano, a Agência Canária da Protecção do Meio Natural, pertencente ao executivo regional, decidiu levantar uma das três ordens de paralisação que pesavam sobre o projecto e deixar sem efeito a multa que tinha sido aplicada. Justificou-se a agência com o facto de a câmara de Adeje ter emitido a licença de construção.

Para os colectivos que tentam travar as obras no Puertito de Adeje ou do hotel na praia de La Tejita, situada junto ao cone vulcânico da Montanha Vermelha, um espaço natural até agora protegido, onde nem os automóveis podiam chegar, estes são dois exemplos de um modelo de desenvolvimento “insustentável” que é preciso travar.

Como dizem ao Canarias Ahora activistas do grupo Salvar La Tejita, o que os cidadãos e os ambientalistas querem é que se sentem a falar com eles, com cientistas e especialistas "para travar este modelo insustentável” que ameaça o futuro das Canárias.

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