Militares ucranianos podem permanecer indefinidamente mobilizados

Ao fim de meses de debate intenso e vários avanços e recuos, Parlamento ucraniano aprovou nova lei de mobilização militar. Ficou de fora a fixação de um limite máximo para o tempo de serviço.

Foto
Familiares de militares ucranianos em protesto em Kiev contra a nova lei de mobilização REUTERS/Alina Smutko
Ouça este artigo
00:00
03:44

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

O Parlamento ucraniano aprovou esta quinta-feira uma nova lei sobre a mobilização militar que tem como objectivo reforçar os mecanismos de recrutamento, numa altura em que a escassez de soldados na linha da frente se apresenta como um dos maiores desafios para as Forças Armadas que tentam resistir à invasão russa.

Foram precisos vários meses de avanços e recuos para que os deputados ucranianos chegassem a acordo para a aprovação de uma muito necessária reforma do sistema de mobilização militar. O diploma legislativo foi aprovado com 283 votos a favor e 49 abstenções e terá força de lei assim que for assinado pelo Presidente Volodymyr Zelensky.

O debate sobre a nova lei de mobilização militar foi intenso e expôs, pela primeira vez desde o início da invasão russa em larga escala, várias divisões na sociedade ucraniana em torno da condução da guerra. Uma primeira versão do diploma chegou a ser apresentada ao Parlamento em Janeiro, mas acabou por ser rejeitada após uma enxurrada de críticas.

Desde então, foram apresentadas mais de 4000 alterações ao projecto inicial, mas o seu carácter controverso mantém-se.

Foram estabelecidas melhores condições salariais e mais tempo de licença para os militares, mas não foi fixado um limite temporal para o período em que os soldados podem estar mobilizados na linha da frente. Esta era uma reivindicação de vários sectores da sociedade, sobretudo as famílias dos milhares de homens e mulheres que têm combatido na frente, e são muitas as denúncias de militares que permanecem indefinidamente mobilizados.

De acordo com o jornal Ukrainska Pravda, a remoção de um prazo máximo para a desmobilização foi um pedido expresso do comandante das Forças Armadas, Oleksandr Sirskii. Na primeira versão da reforma do sistema de mobilização militar tinha sido fixado um limite de 36 meses como tempo máximo de serviço militar.

O Ministério da Defesa esclareceu que a lei não contempla um limite para o período de mobilização para “impedir um impacto negativo sobre as capacidades de defesa” e espera-se que até ao final do ano seja aprovada uma legislação separada para esse efeito.

Com a guerra a decorrer a um ritmo intenso, e com a necessidade da Ucrânia de proteger uma linha da frente de quase mil quilómetros, é pouco provável que os tempos máximos de mobilização venham a ser fixados em breve, acreditam os analistas militares.

“É claro que seria melhor incluir limites de serviço, mas, para desmobilizar um número tão elevado de pessoas, teríamos de ser capazes de fornecer um número equivalente e essas pessoas teriam de ser treinadas e equipadas”, diz ao Financial Times o presidente do Centro Ucraniano de Segurança e Cooperação, Serhii Kuzan.

Zelensky tem promulgado alguma legislação paralela nas últimas semanas, como a descida da idade mínima de recrutamento dos 27 para os 25 anos ou a obrigação de que seja realizado um exame médico adicional para quem peça isenção do serviço militar por razões clínicas.

A aprovação da nova lei é “uma mensagem para os nossos parceiros de que estamos preparados para retomar o controlo dos nossos territórios e de que precisamos de armas”, disse o deputado Oleksandr Fedienko, citado pela Reuters.

A Ucrânia corre contra o tempo para conseguir inverter uma situação desfavorável no campo de batalha. Há mais de um ano que as suas forças não logram qualquer avanço no terreno, enquanto a Rússia tem alcançado alguns pequenos progressos.

Uma das diferenças fundamentais entre os dois Exércitos tem sido a maior capacidade da Rússia em conseguir mobilizar militares – a população russa é mais do triplo da ucraniana. No final do ano passado, Zelensky dizia que eram necessários mais 500 mil soldados nas fileiras ucranianas, embora essa estimativa tenha sido entretanto revista em baixo pelas chefias militares.

No Parlamento durante o debate da lei, o general Iuri Sodol, que tem comandado tropas nas regiões do Donbass, disse que as forças russas têm entre sete e dez vezes mais militares do que os ucranianos na frente.

Ao mesmo tempo, Kiev responsabiliza os seus parceiros ocidentais pelas hesitações e atrasos no envio de armamento considerado fundamental para organizar novas ofensivas e alerta que, sem esse apoio, as forças russas poderão alcançar os seus objectivos.

Sugerir correcção
Ler 20 comentários