Erdogan perde eleições municipais e promete respeitar resultados
O autarca de Istambul foi reeleito, tal como os presidentes das câmaras de Ancara e Esmirna, todos do CHP. A oposição conseguiu obter mais votos a nível nacional que o AKP. Erdogan assume derrota.
A oposição turca alcançou um resultado histórico nas eleições municipais deste domingo, reforçando as vitórias que já tinha obtido em 2019. As contagens parciais indicam que os candidatos pró-governamentais foram derrotados em Istambul, Ancara e Esmirna, que se mantêm nas mãos dos opositores do Presidente Recep Tayyip Erdogan.
"Caros habitantes de Istambul, abriram as portas hoje para um novo futuro", exultou Ekrem Imamoglu, reeleito autarca de Istambul este domingo pelo Partido Republicano do Povo (CHP, moderado e secular). "A partir de amanhã [segunda-feira], a Turquia será uma nova Turquia. Abriram a porta à ascensão da democracia, igualdade e liberdade. Acenderam a esperança nas urnas", afirmou o responsável, citado pelo The Guardian.
Erdogan assumiu a derrota na noite deste domingo, garantindo que irá respeitar a decisão dos eleitores turcos. "Infelizmente não obtivemos os resultados que queríamos", lamentou o Presidente turco.
As eleições municipais deste domingo constituíam um grande desafio à capacidade do CHP para se manter como uma alternativa sólida ao Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) de Erdogan. Esse desafio para a oposição ao regime era ainda mais considerável depois da desmoralizadora derrota nas eleições presidenciais do ano passado, em que Erdogan foi eleito para um terceiro mandato.
A principal arena era Istambul, a cidade mais populosa e símbolo máximo do poder político e económico turco, onde o actual autarca, Ekrem Imamoglu, do CHP, pretendia ser reeleito contra Murat Kurum, um ex-ministro do AKP que recebeu um forte apoio pessoal de Erdogan ao longo da campanha. O Presidente turco tinha o objectivo declarado de recuperar o controlo da metrópole onde iniciou a sua ascensão política e não olhou a meios para garantir uma vitória do AKP.
O CHP conseguiu assegurar o controlo de várias áreas do oeste da Turquia e desbloqueou vitórias em zonas mais conservadoras junto ao Mar Negro. Os resultados são agora lidos como um claro indicador de insatisfação do povo turco com as políticas de Erdogan.
Num dos últimos comícios, Erdogan disse que era preciso “resgatar esta antiga cidade da opressão do CHP”, dramatizando ao máximo umas eleições vistas como cruciais por todos os envolvidos. Na véspera, o Presidente participou em orações na Hagia Sophia, a antiga catedral bizantina que o próprio Erdogan converteu em mesquita, em 2020, numa acção altamente simbólica.
Com 75% dos votos contados, Imamoglu tinha 50% face a 40,8% do seu adversário, parecendo ter caminho aberto para uma nova vitória. A reeleição de Imamoglu coloca-o de imediato na pole position para ser um dos mais fortes candidatos às próximas eleições presidenciais, em 2028.
“Consoante os dados de que dispomos, posso dizer que a confiança e fé dos nossos cidadãos em nós foi recompensada”, dizia Imamoglu ao início da noite, quando já era clara a sua reeleição.
A perda de Istambul em 2019 foi recebida como um choque por Erdogan, que forçou uma repetição por alegadas irregularidades que foi novamente ganha por Imamoglu por uma margem ainda mais expressiva.
A prestação do CHP nas autárquicas deste ano foi ainda mais impressionante por ter sido alcançada num contexto de desunião entre os principais partidos da oposição, que desfizeram a ampla coligação após a derrota nas presidenciais. Além de Istambul, os candidatos da oposição a Erdogan venceram na capital, Ancara, e Esmirna, e ainda acrescentaram uma vitória inesperada em Bursa, onde o actual autarca do AKP foi derrotado, tal como em Antalya.
Com a reeleição dos candidatos do CHP, as principais cidades turcas, com Istambul à cabeça, consolidam o seu estatuto de redutos da oposição a Erdogan, que está no último mandato após mais de duas décadas no poder.
Para o AKP e para Erdogan, as eleições municipais foram desastrosas. Para além de não ter logrado reconquistar nenhum dos grandes centros urbanos nas mãos da oposição, o AKP viu ainda o CHP tornar-se no partido mais votado a nível nacional, com um grande controlo territorial nas províncias mais ocidentais. O maior domínio do partido governamental resumiu-se ao centro e sul, sobretudo nas regiões mais afectadas pelos sismos de Fevereiro do ano passado que fizeram quase 60 mil mortos e destruíram grande parte das infra-estruturas.
Os analistas acreditam que a crise económica vivida há alguns anos na Turquia, marcada pela desvalorização profunda da lira turca, motiva o descontentamento de grande parte da população com as políticas do AKP, embora Erdogan mantenha níveis elevados de popularidade.
No Sudeste, de maioria curda, tal como esperado, as eleições foram dominadas pelo Partido da Democracia e Igualdade do Povo (DEM), depois de o Estado ter afastado os autarcas curdos por alegadamente apoiarem grupos terroristas.
Notícia actualizada às 8h39: confirmada vitória da oposição e acrescentadas declarações do Presidente turco sobre a derrota