A pílula causa depressão? E aumento de peso? Os mitos mais comuns sobre contracepção

As falsas narrativas sobre a pílula levam algumas mulheres a tomar decisões sobre contracepção com base no medo e não em factos. Eis o que tens de saber sobre os métodos contraceptivos

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Cada vez mais se encontra desinformação médica nas redes sociais e isso resulta na propagação de ideias erradas sobre a segurança e eficácia dos métodos contraceptivos hormonais.

A falta de transparência de alguns médicos sobre potenciais efeitos secundários graves – ainda que raros – levou alguns pacientes a procurar aconselhamento junto de comunidades online não qualificadas. O subfinanciamento da investigação para problemas de saúde específicos das mulheres também deixa muitas perguntas sem resposta devido à escassez de estudos científicos de qualidade, permitindo que a desinformação preencha as lacunas.

As falsas narrativas de que as pílulas contraceptivas e os dispositivos intra-uterinos (DIU) causam infertilidade e outros problemas de saúde levam algumas mulheres a tomar decisões sobre contraceptivos com base no medo e não em factos.

Como consequência, podem ter de lidar com gravidezes indesejadas ou outras complicações de saúde, mesmo em países com limitações às opções de saúde reprodutiva.

Eis o que tens de saber sobre os métodos contraceptivos.

Qual é o método contraceptivo mais eficaz?

O implante e o DIU são duas das formas mais eficazes de contracepção disponíveis. São chamados contraceptivos reversíveis de longa duração e ambos libertam hormonas para prevenir a gravidez. O implante é colocado na parte superior do braço da mulher e o DIU no útero (os DIU de cobre actuam sem hormonas e são igualmente eficazes).

"Chamo-lhes métodos de 'escolher e esquecer' porque não precisas de te lembrar de fazer nada (como tomar um comprimido, mudar um anel, tomar uma injecção, etc.), por isso não há erro do utilizador que, como sabemos, é a principal razão pela qual os outros métodos falham", disse Alexandra Hall, médica de família que ensina uma cadeira de Biologia Sexual Humana na Universidade de Wisconsin em Stout, numa resposta por e-mail.

Embora nenhuma forma de contracepção seja 100% eficaz, tanto o implante como o DIU são mais de 99% eficazes na prevenção da gravidez. Em contraste, a pílula contraceptiva é 91% eficaz com uma utilização normal.

Quais são os efeitos secundários dos métodos hormonais, como a pílula ou o DIU?

A pílula e o DIU são geralmente seguros e eficazes, mas, tal como muitos outros medicamentos, podem estar associados a alguns efeitos secundários. Os mais comuns incluem náuseas, dores de cabeça, sensibilidade mamária e hemorragias entre períodos.

Muitos destes efeitos secundários podem ser atenuados mudando para outro tipo de contraceptivo ou esperando alguns meses até que os sintomas desapareçam.

"Só porque estás a sentir efeitos secundários menores não significa que o método que estás a usar não seja seguro", afirma Kathryn Gray, médica ginecologista e directora de investigação de medicina materno-fetal na Escola de Medicina da Universidade de Washington. "Se continuarem a usar o mesmo método por vários meses, na maior parte dos casos os efeitos secundários desaparecerão."

Os efeitos secundários mais adversos, que são raros, são coágulos sanguíneos (ou trombos) e acidentes vasculares cerebrais — mas nem todas as formas de contracepção hormonal aumentam estes riscos. Tens de falar com o teu médico sobre o teu historial clínico antes de iniciar um método contraceptivo; ele pode recomendar-te outro método com base no teu historial de enxaquecas ou tabagismo.

Muitos métodos contraceptivos actualmente disponíveis têm menores quantidades de estrogénio, para reduzir o risco de coágulos sanguíneos.

O planeamento familiar “natural” é eficiente enquanto forma de contracepção?

O planeamento familiar natural, que faz parte do conjunto de "métodos baseados na sensibilização para a fertilidade", acompanha o ciclo menstrual de uma pessoa para identificar quando é mais provável conceber. Medir a temperatura corporal basal e o muco cervical para detectar sinais de ovulação pode ajudar a determinar quando uma pessoa se deve abster de relações sexuais se o seu objectivo for a prevenção da gravidez.

Este método pode ser até 98% eficaz com uma utilização perfeita, mas pode ter uma taxa de insucesso de até 23%. Franziska Haydanek, obstetra e ginecologista de Rochester, Nova Iorque, afirma que a eficácia deste método depende de muitos factores, incluindo ciclos menstruais regulares e um acompanhamento preciso da ovulação.

Este método de controlo da natalidade é menos eficaz para as pessoas que deram à luz recentemente ou que sofreram um aborto, que estão a amamentar, que pararam recentemente de utilizar contraceptivos hormonais, que sofrem de uma doença como a síndrome dos ovários poliquísticos ou que estão prestes a entrar na menopausa, porque essas alterações hormonais tornam mais difícil saber com precisão quando as pessoas estão a ovular.

Fazem engordar?

Os estudos que existem não mostram uma relação definitiva entre o uso de contraceptivos e o aumento de peso. Uma revisão da Cochrane de 2011, considerada a melhor revisão sistemática de provas científicas que existe sobre o assunto, analisou os dados de 49 ensaios clínicos relacionados com os efeitos das pílulas combinadas — feitas com uma combinação de duas hormonas, estrogénio e progestina — nas alterações de peso. Os especialistas não encontraram provas suficientes para demonstrar que a contracepção tem impacto no aumento de peso.

A única excepção apontada pelos médicos é a Depo-Provera, injecção que contém progestina. As mulheres que tomam a injecção — administrada de três em três meses para evitar a ovulação, engrossar o muco cervical e afinar o revestimento uterino — podem ganhar, em média, cinco quilos no primeiro ano de utilização.

Muitas mulheres ganham peso à medida que envelhecem, independentemente de usarem ou não contraceptivos.

Para os médicos, é importante dissipar a ideia errada de que as mulheres ganham peso com a pílula, uma razão que leva muitas pacientes a deixar de tomar a pílula. Michael Belmonte, obstetra e ginecologista em Washington, diz às pacientes que as provas científicas mostram que é improvável que o aumento de peso esteja relacionado com o seu método contraceptivo, mas oferece-lhes a opção de mudar de método.

Causam depressão?

Os médicos afirmam que os contraceptivos orais são seguros para as mulheres com perturbações do humor e que a maioria das mulheres que usam contraceptivos hormonais não sente um impacto negativo no humor. Embora o efeito secundário seja raro, as mulheres com um historial de depressão podem ter maior probabilidade de sofrer efeitos no humor. Se te sentes assim, deves falar com o teu médico.

"De acordo com as provas científicas", afirma Gray, "a maioria das pessoas que tomam contraceptivos hormonais não sente um impacto negativo no seu humor".

Os contraceptivos hormonais podem causar mudanças na personalidade? Ou mudar o perfil das pessoas que achamos atraentes?

Os investigadores afirmam que os estudos que os influenciadores citam quando discutem este fenómeno têm amostras de pequena dimensão ou apresentam outras falhas porque são análises retroactivas, ou seja, aquelas em que os investigadores analisam registos médicos existentes. Os influenciadores podem escolher selectivamente os dados dessas análises, que podem mostrar uma correlação, mas não necessariamente causalidade.

Haydanek, ginecologista de Rochester, disse que o padrão de excelência para estudos de investigação são os ensaios controlados aleatórios, em que um grupo de controlo e um grupo experimental são comparados para determinar quaisquer diferenças para um determinado tratamento.

"O trabalho dos influenciadores das redes sociais é conseguir seguidores, mas isso não significa que a informação que estão a apresentar seja baseada em provas", disse Gray, ginecologista da Universidade de Washington. "Não estou a dizer que para uma determinada pessoa não tenha qualquer efeito. O que é importante pensar é que, para a maioria dos indivíduos, os indícios sugerem que não há impacto."

"É importante que os pacientes obtenham informações de fontes credíveis, que não são o TikTok e o Instagram", concluiu.


Exclusivo PÚBLICO/ The Washington Post

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