Não, o marido de Von der Leyen não trabalha na Pfizer, como diz o líder do Chega
Líder do Chega afirmou que presidente da Comissão Europeia está a ser investigada porque o marido trabalha na Pfizer. É falso. Heiko trabalha noutra farmacêutica e não houve conflito de interesses.
A afirmação
"Eu vou dar um exemplo aqui, sem querer atiçar este tema até porque não é o tema em que sou mais especialista: na Comissão Europeia está em curso uma investigação porque o marido da presidente da Comissão Europeia é um dos CEO da Pfizer, a quem a Comissão Europeia adjudicou milhões em vacinas" — André Ventura em entrevista à RTP3.
O contexto
André Ventura, presidente do Chega, o terceiro partido com maior representação parlamentar na próxima legislatura, deu uma entrevista à RTP3 na última quarta-feira. Questionado no programa Grande Entrevista, conduzido pelo jornalista Vítor Gonçalves, sobre se o novo grupo parlamentar tencionava recuperar alguma das comissões de inquérito que não avançaram na legislatura passada, André Ventura disse que sim: a que se referia à gestão durante a pandemia.
"Acho que a gestão em vários países da Europa — e Portugal é um deles — da covid-19 merece um escrutínio porque foi dos momentos em que os poderes estiveram mais opacos", defendeu o líder partidário, dando como exemplos "a aquisição de ventiladores que nunca vieram" e "o dinheiro que se gastou em vacinas": "Ainda não percebemos bem o que foi gasto e o que foi desperdiçado", considerou.
Foi então que André Ventura falou sobre uma investigação que estaria em curso nas instituições europeias neste momento, referente ao facto de o marido de Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, alegadamente ser um dos dirigentes da farmacêutica Pfizer, à qual se adjudicaram milhões de euros em vacinas contra a covid-19. "Este é o tipo de coisas que mina a confiança dos cidadãos na política", disse o presidente do Chega.
Os factos
Só que o marido de Ursula von der Leyen não é "um dos CEO da Pfizer". Heiko von der Leyen, com quem a presidente da Comissão Europeia é casada desde 1986, é, isso sim, director científico da Orgenesis, uma empresa biotecnológica sediada nos Estados Unidos da América e com laboratórios na Alemanha. Durante a fase mais crítica da pandemia, a Orgenesis começou a desenvolver a sua própria vacina contra a covid-19 — um fármaco distinto da que a Pfizer e a BioNTech acabaram por produzir.
É verdade que a relação de Ursula e Heiko von der Leyen, e a ligação deste último a uma farmacêutica, esteve sob investigação após oito eurodeputados terem expressado "preocupações" com um eventual conflito de interesses entre a posição da presidente da Comissão Europeia e a actividade profissional do marido, mas isso não incluía a produção de vacinas contra a covid-19.
O caso surgiu porque duas subsidiárias da Orgenesis receberam, em momentos diferentes, em 2022, um financiamento europeu para o desenvolvimento de fármacos — nenhum deles relacionado com a covid-19. Heiko von der Leyen chegou a fazer parte do conselho de supervisão de um desses projectos, mas renunciou quando a imprensa noticiou o caso.
A denúncia dos eurodeputados foi então analisada pela Comissária da Transparência, Věra Jourová, que chegou à conclusão, em Março do ano passado, de que não havia conflito de interesses nos casos apontados pelos eurodeputados.
No caso do projecto em que Heiko von der Leyen chegou a estar no conselho de supervisão, a entidade europeia apurou que nem o cientista nem a Orgenesis estiveram envolvidos no pedido de financiamento ou no processo de recepção dos fundos. Por isso, "um conflito de interesses da presidente [da Comissão Europeia] também pode ser excluído por este motivo".
No segundo caso de financiamento, os fundos foram aprovados e entregues pelo Conselho Europeu de Inovação e pela Agência Executiva das PME, sem qualquer envolvimento da Comissão Europeia ou da sua liderança no processo. Por isso, entendeu Věra Jourová, também não houve conflito de interesses.
O veredicto
Não é verdade que o marido de Ursula von der Leyen seja um dirigente da farmacêutica Pfizer, produtora de milhões de vacinas contra a covid-19. Heiko von der Leyen é director científico de uma biofarmacêutica distinta, a Orgenesis.
As investigações sobre alegados conflitos de interesses que envolviam a presidente da Comissão Europeia e o marido em nada estão relacionadas com a vacina contra a covid-19, mas com o financiamento de duas subsidiárias da Orgenesis para projectos de terapia genética.
Mas um parecer da Comissária de Transparência concluiu que, afinal, esses conflitos não existiam: nem Ursula von der Leyen esteve envolvida no processo de decisão sobre esses financiamentos, nem Heiko von der Leyen esteve envolvido nos pedidos de fundos.