Que vivas em tempos interessantes

Os assuntos internacionais ficaram de fora dos debates políticos. Acreditarão os candidatos que não vivemos tempos suficientemente importantes para falar do mundo em que Portugal se encontra?

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Megafone P3: Que vivas em tempos interessantes Pexels/ NastyaSensei
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Certa vez, numa aula universitária, aquando do início da invasão da Ucrânia pela Federação Russa, a minha professora de Teoria das Relações Internacionais partilhou um provérbio chinês muito conhecido e que se poderia aplicar sobre os tempos actuais: “Que vivas em tempos interessantes”. O que ela não nos contou foi que este provérbio trazia em si uma “maldição” dado que, teoricamente, quando alguém profere esta frase é sempre no sentido de que a pessoa que a recebe viva tempos tumultuosas. E a verdade é que os vivemos.

Quem lê e ouve as notícias que nos chegam dos quatro cantos do mundo, parece que estamos dentro de uma caixa bomba-relógio que pode explodir a qualquer momento, destruindo tudo o que se encontra ao seu redor.

Nos debates que antecipam as eleições legislativas em Portugal, marcadas para 10 de março, apesar de se falarem necessariamente sobre as políticas, maiorias parlamentares e possíveis governos que possam criar e aprovar medidas que consigam gerir da melhor forma possível a situação económica, política e social do nosso país, estava extremamente expectante sobre o que os candidatos diriam sobre a situação internacional em que nos encontramos.

Para minha surpresa, parece que os candidatos às eleições legislativas não acreditam que vivemos tempos suficientemente interessantes a nível internacional para que nos debates e nas suas campanhas eleitorais se possa discutir como Portugal se deve posicionar perante conflitos e situações internacionais de extrema importância.

E bem sei que os portugueses podem pensar que as guerras e crises no “estrangeiro” estão bastante longe da nossa realidade e que tal não carece da nossa atenção. Este pensamento assume-se de forma prática no modo como os nossos candidatos a deputados na Assembleia da República decidem quais os temas que preferem dar importância ou não, porque sabem perfeitamente quais os temas que os seus eleitores querem ouvir e aqueles sobre os quais não se interessam.

Com efeito, nós, os eleitores, temos uma importante palavra a dizer sobre isso. Se acreditarmos que os assuntos internacionais são importantes e merecedores de que falemos e reflitamos sobre eles no seio da sociedade civil, os políticos não terão escolha se não falarem e refletirem sobre eles, porque sabem que os seus eleitores se importam não só com aquilo que se passa no seu país, mas entendem que falar de Portugal é também falar sobre o mundo em que se insere.

E, aliás, é imperativo não fazer esta divisão clássica daquilo que é meramente nacional do internacional. Portugal faz parte de uma comunidade política, a União Europeia, na qual o governo português, designadamente no Conselho Europeu, pode tomar certas atitudes que podem moldar aquilo que se passa, em certas áreas no nosso país e do mundo. Por outro lado, Portugal, se tiver um governo que acredite que deve apoiar a Ucrânia, está não só a fortalecer o continente onde se encontra, a Europa, como comprova o seu prestígio internacional. E ainda no caso do conflito na Palestina, o governo português tem também um papel crucial no modo como pode abordar esta questão no seio da União Europeia, mas também na Organização das Nações Unidas (ONU) e noutras organizações internacionais, juntando-se já aos inúmeros países, tanto no Ocidente como no resto do mundo, que lutam por um cessar-fogo justo e duradouro e que a paz e a defesa são vida ocupem o lugar da guerra e da morte.

Com estes exemplos práticos do modo como as posições sobre os assuntos internacionais do governo português são extremamente decisivas, pretendo alertar para o modo como Portugal, e especificamente o governo português que sairá destas eleições, tem um papel crucial na cena internacional contemporânea e que é imperativo que os partidos que se apresentam a eleições esclareçam quais são as suas posições quanto aos mais variados temas que moldam o mundo de hoje e irão construir o mundo de amanhã.

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