Portugueses criam sapato que previne pé diabético através do telemóvel
Aplicação criada por uma equipa liderada por cientistas portugueses permite monitorizar e previnir a doença através de uma aplicação de telemóvel. O protótipo está em fase de testes.
Investigadores do Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Engenharia Industrial (INEGI) desenvolveram um sistema que, incorporado num sapato e ligado a uma aplicação móvel, permite monitorizar o pé diabético e prevenir o desenvolvimento de complicações.
A tecnologia desenvolvida no instituto do Porto foi integrada na palmilha de um sapato específico para o pé diabético, uma das complicações mais graves da diabetes.
O sistema foi desenvolvido no âmbito do Smart-Health-4-All, um projecto europeu que terminou em Junho de 2023 e que culminou na criação de vários dispositivos médicos, entre os quais o “My Care Shoe”.
“O que fizemos foi uma integração inovadora”, afirma Nilza Ramião, investigadora que liderou o projecto e coordena as unidades de biomecânica e saúde do INEGI.
Segundo Nilza Ramião, o sistema desenvolvido integra sensores que permitem monitorizar a zona planetária e dorsal do pé, mas também as zonas de maior tensão, bem como “actuadores”, que, de forma preventiva, permitem aumentar a circulação sanguínea. “É um sapato para prevenir a úlcera do pé diabético”, destaca a investigadora.
Detectar e prevenir
O sistema recolhe informação “em tempo real” sobre as três zonas do pé (antepé, retropé e mediopé) e envia-a, via bluetooth, para uma aplicação móvel, que pode ser controlada pelo doente.
Na aplicação, pequenas bolas retratam os sensores integrados na palmilha e variam de cor consoante os níveis de pressão, alternando entre verde, amarelo e vermelho. O vermelho surge quando é detectada hiperpressão e nessa situação é enviado para a aplicação móvel um alerta, sugerindo ao doente que faça um exercício de compensação.
“Ao accionar, o sistema de activação vai abrir e fechar as válvulas de forma a redistribuir o ar para a zona das hipertensões”, esclarece a investigadora Arcelina Marques, acrescentando que o exercício, com uma duração de cerca de 40 segundos, requer que o doente esteja parado.
Outra funcionalidade da aplicação “extremamente útil para a prevenção” da doença passa pela estimulação sanguínea. O doente pode activar este exercício através da aplicação que acciona a vibração da palmilha, estimulando “internamente o fluxo sanguíneo”.
À semelhança de um telemóvel, a palmilha tem de ser carregada. Se o uso do sistema for intenso a palmilha tem uma duração de quatro horas, caso não o seja poderá durar todo o dia.
A par destes exercícios, o doente pode aceder ao histórico de alertas e dados sobre a sua condição. Segundo a investigadora, que é também docente no Instituto Superior de Engenharia do Porto, os dados registados na aplicação podem ainda ser monitorizados por um médico, uma vez que a aplicação está directamente ligada a um site.
“Em função das características do paciente, o médico prescreve uma série de exercícios e depois pode avaliar mediante os dados recolhidos pela aplicação de forma a acompanhar nas consultas”, acrescentou Acerlina Marques.
Nilza Ramião admitiu, no entanto, que a utilização deste sistema não substituiu as orientações médicas, pretendendo ser uma solução para “ajudar e prevenir” a doença.
O protótipo foi testado em seis pessoas sem a doença, estando neste momento os cientistas a optimizar algumas das funcionalidades da aplicação. Assim que concluída essa fase, tencionam testar a tecnologia em cerca de 200 doentes com diabetes. No futuro, a intenção é avançar com a certificação do sistema desenvolvido e, com isso, potenciar a sua prescrição médica, para que o sapato possa ser acessível a todos os doentes.
No desenvolvimento do sistema estiveram envolvidos a Ortomedical, o Centro de Nanotecnologia e Materiais Técnicos, Funcionais e Inteligentes, o Instituto Superior de Engenharia do Porto e o Centro Clínico Académico de Braga. Com um financiamento comunitário superior a quatro milhões de euros, o projecto Smart-Health-4-All arrancou em 2020 e reuniu mais de 20 parceiros entre empresas e instituições científicas.