Sindicato propõe alternativa a regras “proibicionistas” para artistas de rua do Porto
Autarquia aprovou submissão do regulamento para discussão pública. Depois suspendeu o processo. Sindicato dos artistas enviou proposta de alteração. Câmara já a recebeu e está a avaliar.
Fundamentalmente, a proposta do Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA- STE) para que sejam feitas alterações ao regulamento para os artistas de rua está assente em duas regras: o controlo do ruído e a promoção da rotatividade dos artistas. A estrutura sindical considera que fazer mais do que isso é redundante, “proibicionista” e põe em causa a “liberdade artística” e a “liberdade de expressão”. A submissão do conjunto de regras municipais para discussão pública tinha sido aprovada em Julho do ano passado. Mas o processo de elaboração do regulamento foi suspenso em final de Janeiro. E tudo indica que brevemente será alterado. A Câmara do Porto confirma já ter recebido o documento redigido pelo CENA-STE e diz que o está a avaliar.
O sindicato esmiuçou o regulamento logo depois de a submissão do mesmo para discussão pública ter sido aprovada pela câmara. E, entre vários pontos de um documento longo e pormenorizado, essas duas sugestões em particular são a chave da proposta enviada para a autarquia a 29 de Fevereiro.
Contactado pelo PÚBLICO, Fernando Pires de Lima, dirigente sindical do CENA-STE, explica que o processo de licenciamento deve ser “agilizado” e não deve ter custos. Os artistas e a câmara, sublinha, devem comprometer-se a respeitar um Manual de Boas Práticas a ser elaborado (outra proposta), no qual devem constar os limites sonoros “de acordo com padrões internacionais”, algo que o regulamento elaborado pela autarquia não previa. Para que se promova a rotatividade de artistas, deve ser estipulado, no mesmo conjunto de directrizes, uma “duração máxima” para as actuações.
Tudo isto, defende a proposta do CENA-STE, segundo Fernando Pires de Lima, deve ser acompanhado com a constituição de uma Comissão de Acompanhamento de Artes de Rua, composta por elementos que representem artistas, autarquia, a empresa municipal Ágora, responsável pela cultura, e outros interlocutores a definir. Em conjunto, defende o dirigente sindical, este grupo deverá acompanhar a actividade dos artistas de rua e, ao mesmo tempo, as necessidades de outros intervenientes - moradores ou comerciantes - de forma a que o regulamento possa ser afinado, à medida que outras necessidades sejam detectadas.
O documento elaborado pela câmara, aos olhos do sindicato, tem “excesso de regulamentação”. Fernando Pires de Lima acha que isso pode trazer “um problema de fiscalização”, o que por sua vez pode ser entrave para “a liberdade dos artistas”. “Pô-lo em prática seria algo completamente impraticável”, defende.
O documento da câmara previa a proibição da existência de actividades artísticas em determinadas zonas na cidade. Algo que para o CENA-STE não faz sentido. Fernando Pires de Lima entende que a localização não deve ser um critério. E, se em causa estiver o ruído – e há quem se queixe, entre moradores e comerciantes -, lembra que há outras artes de rua que não passam pela música. E, mesmo que seja esse o caso, sublinha que o que deve ser sempre usado como referência será o nível de decibéis.
Entre redundâncias com a lei, o sindicato refere a proibição do regulamento de actuações em “canal dedicado à circulação viária”. Considera essa nota “desnecessária”, por já existir “a proibição de circulação de peões nesses locais, pelo Código da Estrada”.
A suspensão do processo de elaboração do regulamento para os artistas de rua foi sugerida pelo presidente da câmara em reunião do executivo camarário de 29 de Janeiro, após intervenção pública de Fernando Pires de Lima na mesma sessão, que se inscreveu para falar na reunião como cidadão e pediu ao executivo para voltar a avaliar algumas propostas apresentadas pelo sindicato no âmbito da discussão do regulamento para os artistas de rua da cidade. Rui Moreira, nesse dia, admitiu ter “muitas dúvidas” sobre o documento que a câmara tinha aprovado em Julho 2023 seguir para discussão pública e desafiou o sindicato a propor alternativas.
O CENA-STE aceitou o desafio e já enviou as propostas à autarquia, a tempo de chegarem para serem discutidas na última de reunião camarária privada de segunda-feira, apesar de o assunto não fazer parte da agenda. E, por isso, não aconteceu. Nesse dia, a vereadora com o pelouro do Turismo, Catarina Santos Cunha, responsável por este dossier, não esteve presente.
O PÚBLICO perguntou à câmara se a proposta do sindicato já tinha chegado à autarquia. O gabinete de comunicação do município confirma que o documento já chegou ao pelouro responsável pelo assunto. Neste momento, adianta a mesma fonte, o conjunto de sugestões para alteração do regulamento está a ser avaliado.
Texto corrigido às 17h05 de 6 de Março de 2024
No texto original estava escrito que a proposta de regulamento tinha sido aprovada pelo executivo camarário. Mas o que foi aprovado foi a submissão da proposta de regulamento para discussão pública. Isso quer dizer que Rui Moreira não suspendeu o regulamento, mas sim o processo de elaboração do mesmo.