Passos Coelho e os diabos
Em 2015, Passos brandia a ameaça de que o diabo vinha aí. Esse diabo não veio. Mas o ex-primeiro-ministro continua fiel à mesma estratégia: instigar o medo, e o medo mais básico como o medo do outro.
Longe vai o tempo em que havia um primeiro-ministro português da área da direita que dizia que a “Europa precisa de imigrantes e força de trabalho”, ainda que possa “não ter condições para dar asilo a muita gente”, que “precisa, no seu espaço, de acolher imigração porque precisa de contrariar os fenómenos de natalidade decrescente”.
Estávamos em 2013, Pedro Passos Coelho governava há poucos anos e quando a Suíça restringiu a entrada de imigrantes de todos os países da União Europeia, aplicando um tecto máximo às quotas de autorizações de residência, o então presidente do PSD foi um dos chefes de governo europeus que criticaram tal medida.
De então para cá, Passos Coelho tem mudado a sua posição e a associação que fez, no comício de Faro da AD, entre a imigração e o aumento da insegurança em Portugal (“Precisamos de ter um país aberto à imigração, mas, cuidado, que precisamos também de ter um país seguro”) não caiu do céu.
Nos últimos anos, já depois de deixar o Governo, Passos chegara a acusar o PS de ter uma política de imigração que põe “em risco a segurança dos portugueses”. “A Europa está a reforçar a sua segurança. Nós, cá, temos na ‘geringonça’ uns partidos radicais, que acham que pode entrar toda a gente”, dizia.
Perante as críticas vindas dos outros candidatos, Luís Montenegro tentou atenuar os efeitos do discurso de Faro de Passos Coelho sobre a imigração, dando-lhe mais contexto, defendendo a necessidade de uma política de integração dos imigrantes e salientando o contributo que trazem para a Segurança Social.
O próprio programa da AD, porém, não diz algo tão diferente daquilo que o ex-primeiro-ministro do PSD proclamou, ao defender “o princípio de que somos um país de portas abertas à imigração, mas não de portas escancaradas, materializado em objectivos quantitativos para a imigração, ponderando a dimensão da segurança”. A ligação da insegurança — onde muitos lêem facilmente criminalidade — à imigração é perigosa e, acima de tudo, é injusta.
Em 2015, quando o seu Governo foi derrubado no Parlamento pela união de todos os partidos de esquerda, Pedro Passos Coelho brandia a ameaça de que o diabo vinha aí, quando a “geringonça” dava os primeiros passos e o PSD garantia aos portugueses que ia ser o descalabro das contas públicas. Esse diabo não veio. Mas o ex-primeiro-ministro continua fiel à mesma estratégia: instigar o medo, e o medo mais básico como o medo do outro.