De que “terroristas” falaram Mariana Mortágua e André Ventura?
Os líderes do BE e do Chega trocaram acusações sobre membros terroristas que integram os seus partidos. Há verdades e mentiras nas acusações de ambas as partes.
Meio século depois do 25 de Abril, o terrorismo voltou a aquecer um debate entre dois líderes partidários. No frente-a-frente televisivo da noite de terça-feira, André Ventura acusou o Bloco de Esquerda (BE) de ter elementos terroristas nas suas listas. Em resposta, a porta-voz do BE, Mariana Mortágua, acusou o Chega, liderado por André Ventura, de ter como número dois um dirigente “da principal organização terrorista que já houve em Portugal”. A que se referiam, afinal?
O tema foi puxado por André Ventura, que, quando se discutiam as propostas para a habitação, acusou o BE de ter “terroristas nas suas listas”. Mariana Mortágua negou e acusou o Chega de ter, "como número dois, um dirigente da principal organização terrorista em Portugal, o Movimento Democrático para a Libertação de Portugal [MDLP], que fez 600 atentados, matou o padre Max e matou uma jovem". Referia-se ao deputado Diogo Pacheco de Amorim, embora sem dizer o seu nome, e instou o presidente do partido a "assumir essa responsabilidade".
"Tenha vergonha do que está a dizer", respondeu o líder do Chega, sustentando que Diogo Pacheco de Amorim "nunca foi condenado por terrorismo", contra-atacando: "Os seus candidatos são condenados em tribunal por terrorismo. Pelo menos dois candidatos seus foram condenados, foram ex-membros das FP-25, [...] mataram bebés, foram assassinos", afirmou Ventura, perante a insistência de Mortágua de que tal era falso.
Na verdade, ambos têm razão, pelo menos em parte. No que respeita ao BE, nas eleições autárquicas de 2017, segundo foi noticiado e nunca desmentido pelos dirigentes do Bloco, integraram as listas do partido quatro candidatos que tinham pertencido às Forças Populares - 25 de Abril (FP-25), movimento de extrema-esquerda que operou entre 1980 e 1987 e cujos membros foram autores de vários atentados, que causaram a morte a 18 pessoas. Os condenados foram amnistiados em 1996.
José Ramos dos Santos, condenado a 12 anos de prisão por organização terrorista enquanto membro das FP-25, foi cabeça de lista do BE à Câmara Municipal de Évora, acabando por não ser eleito. Teodósio Alcobia foi condenado com a mesma acusação a 15 anos de prisão, e a sua companheira, Helena Carmo, condenada a 11 anos de prisão, tendo ambos feito parte das listas autárquicas do BE por Sintra. Alcobia foi eleito vogal da Junta de Freguesia de Agualva e Mira Sintra e Helena Carmo eleita deputada municipal da autarquia sintrense.
Luís Gobern Lopes, que admitiu em tribunal ter sido membro das FP-25 e foi condenado a 17 anos de prisão, foi eleito membro da Assembleia de Freguesia de Santo António da Charneca, no Barreiro, pelo BE, e recandidato na mesma lista, mas em sétimo lugar, em 2021. Enquanto candidato, admitiu sempre que tinha sido “um preso político das FP-25”.
Nenhum destes cidadãos é hoje candidato nas listas do BE e, como tal, é falsa a afirmação de que o BE tem elementos condenados por terrorismo candidatos às eleições para as legislativas de 10 de Março.
No que respeita ao Chega, Mortágua disse que o número dois do partido, Diogo Pacheco do Amorim - embora sem citar o seu nome -, foi membro do Movimento Democrático para a Libertação de Portugal (MDLP). Este movimento de extrema-direita foi criado pelo general Spínola e operou em Portugal entre 1975 e 1977, período durante o qual foram cometidos vários atentados, em particular o que matou o padre Max, membro da UDP, e a estudante Maria de Lurdes, em 1976.
Pacheco de Amorim, considerado ideólogo do Chega, foi militante do MDLP e é verdade que nunca foi condenado em tribunal por qualquer acto de terrorismo nem pela morte de ninguém. O MDLP foi considerado por um tribunal como um movimento terrorista, mas nenhum dos seus membros foi condenado em tribunal por não ter sido possível associá-los aos crimes cometidos.