Estranha forma de vida: descoberto fóssil de árvore com 350 milhões de anos
Fóssil retirado de pedreira no Canadá revela planta com copa diferente de tudo o que se conhece. É “prova única de uma forma extrema de evolução que alguém poderia imaginar em sonhos”, diz cientista.
Os fósseis de árvores não são muito comuns. Por isso, quando se desenterra um novo exemplar, abre-se uma janela única para um tempo e um local. A Sanfordia densifolia, uma planta de porte arbóreo que viveu no início do período Carbonífero, há cerca de 350 milhões de anos, é um caso desses. O fóssil, descoberto numa pedreira no Canadá e ainda mais raro por manter a sua vasta copa, com um aspecto de coroa como uma palmeira, revela um lado da evolução das plantas desconhecido, segundo um estudo publicado na semana passada na Current Biology.
“A pequena árvore que descobrimos não é parecida com nenhuma outra que hoje cresça no planeta e o seu plano corporal é diferente de qualquer outra planta conhecida até agora. O nosso fóssil é uma prova única de uma forma extrema de evolução que alguém poderia imaginar em sonhos”, referiu ao PÚBLICO Robert Gastaldo, primeiro autor do artigo e investigador do Departamento de Geologia do Colby College, em Waterville, no estado do Maine, nos Estados Unidos.
O aparecimento de plantas com porte arbóreo é um acontecimento que marca o Devónico, entre há 393 e 383 milhões de anos. A Sanfordia densifolia apareceu algumas dezenas de milhões de anos mais tarde. “O Devónico tardio e o Carbonífero inicial são um tempo de inovação e de experimentação para as plantas terrestres, particularmente para aquelas que cresceram como árvores e colonizaram a Terra”, explica o paleontólogo.
Desde 2017, foram descobertos cinco fósseis de indivíduos diferentes desta espécie numa pedreira em New Brunswick, uma província do Canadá que fica na costa leste, junto ao Atlântico. Mas há 350 milhões de anos este pedaço de terra estava situado perto da linha do Equador. Aquelas árvores viviam num clima tropical ou subtropical, longe da linha costeira, mas junto de um lago criado por uma falha na crosta terrestre. Devido à separação de duas placas tectónicas, forma-se um vale que depois é preenchido por água, criando um lago.
Os fósseis formados longe das linhas costeiras são raros. Normalmente, estas regiões sofrem erosão, o que impede a conservação destes vestígios nos estratos. Estando numa região activa a nível tectónico, as árvores que estão na origem daqueles fósseis acabaram no fundo do lago devido a episódios sísmicos. Depois, os sedimentos que cobriram as árvores e um longo processo de centenas de milhões de anos provocaram uma compressão e impressão da planta na rocha sedimentar envolvente.
Um dos cinco fósseis, que tinha a estrutura da copa especialmente bem conservada, foi usado como holótipo, o espécime que serve para descrever a espécie. “A árvore carbonífera que descrevemos tem um tronco com o diâmetro de apenas 16 centímetros”, explica Robert Gastaldo. No caso do holótipo, o tronco do fóssil tinha 2,25 metros de altura. Na parte de cima do tronco estão agarradas as folhas. “Cada folha da coroa tem perto de três metros de comprimento e está arranjada em espiral à volta do tronco. Mostramos que esta pequena árvore tinha mais de 250 destas folhas juntas em 0,75 metros do tronco, dando a aparência de uma escova para garrafas muito grande”, descreve o investigador.
Ao contrário das árvores que actualmente povoam a Terra, esta antiga espécie não produzia madeira. “É difícil pensar como um pequeno tronco que não tinha madeira suportava uma coroa de folhas que preenchia 20 a 30 metros cúbicos de espaço”, adianta Robert Gastaldo.
Desconhecimento e perda
Segundo o investigador, não é possível saber a nível evolutivo se esta espécie está mais próxima do grupo dos fetos ou do grupo das plantas que produzem sementes, como os pinheiros. Robert Gastaldo recorda que há pouquíssimos fósseis de plantas com as folhas preservadas daquela altura.
“A nossa planta é apenas a terceira ocorrência para um período de 50 milhões de anos”, explica. Por isso, é muito difícil perceber tanto o ambiente ecológico onde ela estava inserida como a relação que tinha com os grandes ramos de evolução das plantas.
Ainda assim, a Sanfordia densifolia mostra a riqueza evolutiva de um momento da história das plantas na Terra: “Esta árvore estranha e exótica demonstra que os mecanismos de evolução que operaram durante os primeiros milhões de anos depois de as árvores terem aparecido na Terra estabeleceram formas ‘experimentais’ que tiveram sucesso durante algum tempo, mas, em última análise, foram [partes] perdidas da biodiversidade do planeta.”