Da emigração jovem ao abate religioso de animais: os factos da primeira noite de debates

Debate entre Pedro Nuno Santos e Rui Rocha ficou tendencialmente marcado, em regra, pelo rigor nos factos. O debate inflamado entre Inês Sousa Real e André Ventura, menos.

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Os dois primeiros debates para as eleições legislativas de Março decorreram ontem Ilustração PÚBLICO
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Os dois primeiros debates para as eleições legislativas de Março não podiam ter sido mais distintos. O primeiro, que colocou frente a frente o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, e Rui Rocha, presidente da Iniciativa Liberal, pautou-se pelo cuidado. Em geral, debateram-se factos e números (alguns umas décimas ao lado, mas nada de gritante).

No segundo, um incendiado confronto de ideias entre Inês de Sousa Real, porta-voz do PAN, e André Ventura, líder do Chega, houve mais ocasiões com menos preocupação com os factos e as afirmações foram menos ao encontro do que dizem os dados oficiais.

✔️ ​ “A taxa de desemprego dos jovens em Portugal é hoje em dia de 23,5%” - Rui Rocha

A emigração de jovens portugueses foi um dos temas centrais em cima da mesa que separava Rui Rocha de Pedro Nuno Santos. O líder da Iniciativa Liberal, além de sublinhar o grande êxodo da juventude para o estrangeiro, aproveitou para referir que o desemprego afecta quase um em cada quatro dos que cá ficam: “23,5%”, apontou Rui Rocha.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), o número não foi muito ao lado. No relatório sobre emprego de Janeiro de 2024, que inclui dados até ao último mês de 2023, as estimativas provisórias apontavam que 23,1% das pessoas entre os 16 e os 24 anos estarão no desemprego (Rui Rocha não se referiu, em concreto, a uma faixa etária). Em Novembro de 2023, a taxa de desemprego foi de 23%.

“Os nossos jovens estão a emigrar para países com cargas fiscais superiores à portuguesa” - Pedro Nuno Santos

Do outro lado, numa tentativa de desconstruir a tese dos liberais de que a recuperação da economia portuguesa pode passar pela redução dos impostos, Pedro Nuno Santos argumentou que os jovens portugueses que decidem trabalhar fora estão a dirigir-se para países “com cargas fiscais superiores à portuguesa”.

O Atlas da Emigração Portuguesa, do Observatório da Emigração, sublinha que os emigrantes jovens portugueses tendem a escolher como destino países como o Reino Unido, a Irlanda e os países escandinavos (Dinamarca, Suécia e Noruega).

Segundo o Eurostat, as cargas fiscais da Noruega (43,6%), Dinamarca (42,5%) e Suécia (42,4%) são superiores à de Portugal (38%).

Na Irlanda, no entanto, o valor é significativamente mais baixo: 21,7%. De acordo com o parlamento britânico, a carga fiscal do Reino Unido em 2022/2023 foi de 36%, dois pontos percentuais também mais baixa do que a portuguesa.

✔️ ​​“Portugal, no último trimestre, foi o país que cresceu mais em toda a UE. Foi o número 1” - Pedro Nuno Santos

Em defesa do trabalho levado a cabo pelo Partido Socialista nos últimos oito anos de governação, Pedro Nuno Santos afirmou que Portugal tinha sido, no último trimestre de 2023, o país que mais cresceu na União Europeia.

Os dados provisórios do Eurostat de 30 de Janeiro de 2024 sustentam a tese do líder socialista. No último trimestre do ano passado, o PIB português terá crescido 0,8%, mais do que qualquer outro país da UE. A Espanha teve o segundo maior crescimento (0,6%), seguida pela Letónia pela Bélgica (0,4% cada).

❌“Foi o Chega que mais votou ao lado do PS [no Orçamento de Estado para 2024]” - Inês de Sousa Real

Durante o aceso debate sobre as reivindicações das forças de segurança e o não-aumento do subsídio de risco dos elementos da PSP e GNR, André Ventura referiu que o problema estava relacionado com o Orçamento de Estado para 2024 que “o PAN aprovou” (na verdade. viabilizou-o, abstendo-se).

A porta-voz do PAN afirmou, então, que “foi o Chega que mais votou ao lado do PS” no Orçamento de Estado. Consultando o site da Assembleia da República, é possível verificar que das propostas de alteração feitas pelo PS, o partido de André Ventura votou favoravelmente 50 e absteve-se – mais do que qualquer outro partido – 62 vezes.

Foi, porém, o próprio PAN que aprovou mais propostas de alteração da autoria dos socialistas: 92 vezes.

Na votação para o OE2022, no entanto, foi o Chega o partido que mais votou ao lado do PS.

“O Chega trouxe ao Parlamento o debate sobre o abate religioso de animais. O PAN votou contra” - André Ventura

Na recta final do debate com Inês de Sousa Real, André Ventura, justificando a preocupação do Chega com o bem-estar animal, afirmou que o PAN tinha votado contra um projecto de lei do seu partido relacionado com o abate religioso de animais.

O projecto de lei 531/XIV, denominado "Pela protecção do bem-estar animal em contexto de abate religioso", data de Setembro de 2020. Segundo o site da Assembleia da República, a iniciativa caducou a 28 de Março de 2022, não tendo chegado a ser votada no Parlamento.

✔️ ​"30% dos nossos jovens já estão lá fora” - Inês de Sousa Real

Questionada sobre o que pode o PAN fazer para ajudar os jovens a enfrentar a crise habitacional em Portugal, a porta-voz do partido começou por afirmar que a percentagem de jovens portugueses no estrangeiro é já de 30%.

Ao Expresso, Rui Pena Pires, coordenador científico do Observatório da Emigração e um dos responsáveis pelo Atlas da Emigração Portuguesa, afirmou que “30% dos jovens que nasceram no país estão actualmente a viver fora”, confirmando o número referido por Inês de Sousa Real.

No Atlas da Emigração, porém, afirma-se que o número poderá ser maior: “Mais de um terço dos nascidos em Portugal com idades entre os 15 e os 39 anos vive hoje no exterior”, lê-se na obra.

Artigo editado a 8 de Fevereiro às 15h52 para correcção textual

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