Agentes acusam Governo de “leviandade” e pedem “moderação” nas palavras
Em causa estão as declarações deste domingo de José Luís Carneiro, a quem acusam de “laivo persecutório” contra os polícias.
A Plataforma dos Sindicatos da PSP e Associações da GNR considerou, este domingo, que houve "precipitação e alguma leviandade" do Governo em qualificar como insubordinados os agentes que entregaram baixas médicas e falharam o policiamento de um jogo de futebol.
Em declarações à Lusa, o porta-voz da plataforma sindical e presidente do Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia, Bruno Pereira, considerou "um paradoxo as declarações do ministro [da Administração Interna]" na conferência de imprensa deste domingo.
O dirigente sindical afirmou que houve precipitação e desrespeito pelas regras do Estado de direito quando afirma que vai abrir inquéritos para averiguação de factos, "ao mesmo tempo que assume preliminarmente que há responsabilidade e que há culpa por parte dos polícias, nomeadamente relativamente às baixas médicas".
Bruno Pereira acusou o ministro José Luís Carneiro de "laivo persecutório" contra os polícias, que o Governo não demonstrou quando os médicos "se recusaram a fazer urgências para lá do razoável". "Apelo pelo menos a alguma cautela e moderação nas palavras para que não acicatemos ainda mais os ânimos, tendo em conta que eles já estão bastante acicatados e os polícias já estão num nível de intolerância máximo. (...) Não nos precipitemos também com alguma leviandade em qualificá-los como insubordinados. Não cai bem, não fica bem, e não é de modo algum respeitoso", disse.
Em comunicado, a plataforma deixou críticas veementes às declarações de José Luís Carneiro, de quem as forças policiais dizem ter recebido hoje "um claro sinal de ameaça", acusando o Governo de "irresponsabilidade gritante" ao longo deste processo: "Hoje mais do que nunca é notória a incapacidade política, a falta de preparação e, sobretudo, o esgotar da legitimidade e do reconhecimento enquanto tutela, desta que é das mais importantes pastas de um Governo."
O ministro da Administração Interna anunciou este domingo que vai participar ao Ministério Público todos os novos indícios de incitamento à insubordinação, a sua prática e eventual ligação a movimentos extremistas, praticados pelas forças policiais.
José Luís Carneiro falava aos jornalistas à saída de uma reunião, que durou mais de quatro horas, com o comandante-geral da GNR e com o director nacional da PSP, na sequência do adiamento no sábado do jogo Famalicão-Sporting, devido à falta de condições de segurança, causada pela falta de policiamento.
Para José Luís Carneiro, o direito à manifestação é legítimo e tem sido legitimamente exercido, mas não pode ser confundido com indisciplina e actos de insubordinação que coloquem em risco o Estado de direito.
"Regar com gasolina"
Bruno Pereira sublinhou que não viu nos incidentes de sábado em Famalicão qualquer extremismo por parte dos polícias, mas admite que o Governo possa ter razões para averiguar a existência desses movimentos dentro dos protestos policiais, afirmando que é o executivo, com a recusa em ceder às reivindicações das forças de segurança, nomeadamente o subsídio de missão equiparado à Polícia Judiciária, que está a "regar com gasolina" o crescimento de movimentos inorgânicos.
"Há uma questão de urgência que impera e impõe uma correcção de um problema que foi criado por este Governo, por muito que venham alegar que é uma impossibilidade político-legislativa. Não é verdade, a questão de urgência pode perfeitamente ser preenchida aqui sob pena de efectivamente andarmos a regar com gasolina a possibilidade de os movimentos inorgânicos poderem alastrar, poderem viralizar e poderem contaminar aquilo que tem sido um protesto extremamente sóbrio e feito com enorme elevação", disse.
Sobre as declarações de sábado do presidente do Sindicato Nacional da Polícia (Sinapol), Armando Pereira, que em entrevista à SIC Notícias admitiu eventuais impactos na realização das próximas eleições legislativas, Bruno Pereira disse não lhe caber "fazer a defesa da honra" do sindicalista, afirmando não ter visto qualquer ameaça nas declarações, mas sim um alerta, já reiterado em carta enviada ao primeiro-ministro, António Costa, com conhecimento de José Luís Carneiro, e que chama a atenção para o crescente descontentamento, que pode vir a afectar várias atribuições das polícias, como a entrega de exames nacionais nas escolas, o controlo de fronteiras ou o policiamento de grandes eventos.
"Ainda que possam não ter alguém a controlar a caixa de correio 24 horas, o que é certo é que temos vindo a apelar a alguma 'descontenção', porque os polícias estão há quatro semanas em protesto permanente feito com a maior elevação e sobriedade e a resposta do Governo é que não assume o problema que criou, não quer procurar uma solução e não quer assumir uma posição que junto de um futuro executivo possa assegurar que esta situação seja corrigida", disse. Em comunicado, a plataforma considerou "inadmissível o ataque pidesco ao sindicalismo na PSP, que procura coarctar a liberdade de expressão".
A plataforma que congrega sindicatos e associações das forças de segurança escreveu ao primeiro-ministro sobre a "situação-limite" dos profissionais que representam, alertando para um eventual "extremar de posições" perante a "ausência de resposta" do Governo.
Os elementos da PSP e da GNR exigem um suplemento idêntico ao atribuído à Polícia Judiciária, estando há mais de três semanas em protestos em frente à Assembleia da República, em Lisboa, num movimento que se alargou a todo o país.
A PSP indicou, na sexta-feira, que polícias de vários comandos do país tentaram entregar as armas de serviço como forma de protesto e avançou que existe "um número de baixas médicas superior ao habitual" entre os agentes.