Na última década, os jovens adultos têm-se dividido em termos políticos e ideológicos. Vários estudos conduziram à mesma conclusão: as mulheres da Geração Z estão cada vez mais progressistas, enquanto os homens não só não acompanham essa tendência, como, em alguns contextos, se tornaram mais conservadores.
Hoje, em muitos países ocidentais, são as mulheres entre os 18 e os 29 anos que tendem a assumir posições mais progressistas sobre políticas migratórias e racismo, que mais participam em movimentos sociais e protestos. A novidade não é que sejam elas a dar mais votos à esquerda, mas o quanto se estão a distanciar relativamente aos homens.
Olhando para o passado, em termos gerais, cada geração se movia na mesma direcção política e ideológica. A Geração Z parece estar a quebrar o padrão. Essa diferença nota-se um pouco por todo o mundo, entre jovens que partilham a mesma cultura, viveram nas mesmas cidades, estudaram nas mesmas escolas.
Até há poucos anos, “o ‘gender gap’ moderno — o voto feminino mais à esquerda do que o voto masculino — não tinha chegado ainda a Portugal”, apontou um estudo feito pelos investigadores de estudos políticos João Cancela e Pedro Magalhães sobre as eleições legislativas de 2022. “Portugal parecia mesmo uma das poucas — [talvez] a única — democracia europeia” em que homens e mulheres não votavam de forma sistematicamente diferente.
O ano de 2022 pode ter marcado o início da discórdia. Se só tivessem votado mulheres nas eleições legislativas de 30 de Janeiro desse ano em Portugal, teriam dado à esquerda mais lugares no Parlamento e ainda mais votos à maioria socialista. O Chega teria apenas seis assentos parlamentares, metade daqueles que conquistou.
Em sentido contrário, se apenas tivessem votado homens, o Partido Socialista não teria alcançado a maioria absoluta e o Chega teria agora 15 deputados.
Já este mês, o analista político Pedro Magalhães comparou os dados de quatro sondagens ICS/Iscte feitas ao longo de 2023, concluindo que o Chega é o partido que mais divisão provoca entre homens e mulheres. Foi o único em relação ao qual os homens manifestaram, de forma clara, maior probabilidade de intenção de voto do que as mulheres.
Nos Estados Unidos, mulheres entre os 18 e os 30 anos são agora 30% mais progressistas do que os homens com a mesma idade — uma distância que aumentou abruptamente na última década. Verifica-se a mesma diferença percentual na Alemanha, enquanto no Reino Unido as mulheres até aos 30 anos são 25% mais progressistas que os homens, indica o jornalista de dados do Financial Times John Burn-Murdoch.
Já em grupos mais velhos, mesmo que as mulheres se mantenham mais progressistas, a oscilação entre progressismo e conservadorismo pelos eleitores de ambos os géneros continua a acontecer em paralelo.
Nas eleições legislativas polacas do ano passado, quase metade dos homens entre os 18 e os 21 anos votaram no partido Confederação, de direita radical, que se ficou pelo quinto lugar. Quanto às mulheres da mesma faixa etária, por comparação, apenas um sexto votou no Confederação.
Na Coreia do Sul, ainda marcada pela desigualdade de género e misoginia, essa divergência é especialmente notória. Se em 2005 os jovens entre 18 e 29 anos — millennials — concordavam em termos ideológicos, independentemente do género, actualmente as mulheres dessa idade são 50 pontos percentuais mais progressistas do que os homens, que se tornaram mais conservadores.
Alice Evans, investigadora convidada da Universidade de Stanford, que está a escrever o livro The Great Gender Divergence vê nos jovens nascidos entre meados da década de 1990 e o início dos anos 2000 não uma, mas duas gerações. Avança algumas hipóteses para explicar a heterogeneidade que caracteriza a Geração Z: uma produção cultural mais feminista, em contraste com uma apologia ao sexismo que ganha popularidade entre os homens, por personalidades como Andrew Tate; ou um ressentimento face à economia e a sensação de ansiedade financeira.
Para este progressivo afastamento podem também ter contribuído o movimento #MeToo, que instou mulheres em todo o mundo a denunciar a violência de género, física e psicológica, de que são alvo, além do consumo de informação através das redes sociais, onde se torna mais fácil que cada um se feche na sua bolha, impermeável a experiências e opiniões divergentes.