A resolução da crise na habitação não cairá do céu, por isso voltamos às ruas

As políticas têm falhado porque não vão ao essencial: não têm a coragem política de confrontar os interesses imobiliários e turísticos, que transformam as casas em activos financeiros.

Ouça este artigo
00:00
03:16

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

Em 2018, o Governo cessante garantiu que em 2024, 50 anos depois da Revolução de Abril, teríamos o problema de habitação resolvido. Voltou a reforçar esse anúncio em 2021. Porém, chegados aqui, temos de voltar a lutar pela habitação e por muito mais.

O acesso à habitação está em retrocesso acelerado. As rendas superam os salários, as prestações bancárias aumentaram muito e pesam demasiado no orçamento familiar, a sobrelotação aumenta, há famílias que voltaram a construir barracas ou a viver em tendas, aumentou a população sem abrigo. Os jovens, com o avançar na idade, não conseguem resolver a sua vida e sair de casa dos pais, saindo, em vez disso, do país. Por outro lado, houve um aumento nunca visto dos despejos, vivemos na instabilidade residencial pela curta duração dos contratos, em más condições de habitação no arrendamento e com péssimas condições de habitação no parque de habitação social, abandonado por diversas câmaras municipais e pelo Instituto de Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU).

Desde o referido anúncio, vários pacotes de políticas para a habitação têm sido anunciados. Todos falharam, porque não vão ao essencial: não têm a coragem política de confrontar os interesses imobiliários e turísticos, que se alimentam da valorização das casas, transformadas em activos financeiros. Assim, as políticas que são sucessivamente anunciadas servem apenas para legitimar o poder e ganhar tempo, mas não servem para resolver o problema da habitação. A crise continua a agravar-se.

Perante os fortes interesses do complexo imobiliário-turístico-financeiro e uma economia política que promove o crescimento económico do país à custa do empobrecimento de quem aqui vive e trabalha, a única forma de resolver a crise na habitação será através da continuidade da organização, da pressão e da mobilização popular nas ruas.

A plataforma Casa para Viver, que desde 1 de Abril tem convocado manifestações amplas, junta uma centena de organizações com experiência e conhecimento, ancoradas na realidade concreta. Além da mobilização de milhares de pessoas em diferentes cidades do país, traz propostas que, se forem já implementadas, têm um rápido impacto na resolução da crise de habitação.

Foi graças a estas manifestações que se conseguiu, por exemplo, o fim dos "vistos gold" associados ao imobiliário (se não houver novos truques na lei que os perpetuem); que se conseguiu que o Governo subsidiasse parte das famílias inquilinas, aliviando o seu orçamento (ainda que de forma insuficiente e temporária, e lamentavelmente subsidiando desta forma o bolso dos proprietários); ou o anúncio, dois dias depois da manifestação de 30 de Setembro, do fim do regime fiscal dos residentes não habituais, com grande impacto na inflação do valor das casas (tendo-se depois prolongado este por mais um ano). Estas medidas, completamente insuficientes mostram-nos, ainda assim, que estamos a fazer pressão a sério, mas, sobretudo, que temos de continuar.

Se há algo que o 25 de Abril nos ensinou foi que é preciso organizarmo-nos, mobilizarmo-nos, lutarmos para conquistar os nossos direitos. A mudança não vai cair nem do céu, nem de nenhum programa de Governo, a mudança vai-se conquistar se continuarmos a pressionar nas ruas. Passados 50 anos do 25 de Abril, neste sábado, 27 de Janeiro, a luta por uma Casa para Viver continua nas ruas.

Sugerir correcção
Ler 13 comentários